domingo, 21 de julho de 2013

O DEUS DE XENÓFANES


Paul Klee, Senecio, 1922.

Xenófanes de Cólofon critica Hesíodo e Homero por terem atribuído «aos deuses tudo quanto entre os homens é vergonhoso e censurável, roubos, adultérios e mentiras recíprocas» (1). Além de reprovar essa projecção da imoralidade, o filósofo ataca a leitura antropomórfica do divino, com argumentos baseados na relatividade cultural – «os Etíopes dizem que os seus deuses são de nariz achatado e negros, os Trácios, que os seus têm os olhos claros e o cabelo ruivo» (2) – e no capricho biológico – se os bois, os cavalos e os leões fossem capazes de desenhar e de produzir obras, fariam com certeza os deuses à sua imagem e semelhança.
Em alternativa, Xenófanes propõe um único deus, por completo distinto dos mortais, apesar de corpóreo, e indubitavelmente imóvel. Esta última característica levou alguns autores a identificá-lo com o Ser de Parménides. Por outro lado, «todo ele vê, todo ele pensa, e todo ele ouve» (3). De acordo com Aristóteles, Xenófanes «assegura que o Uno é Deus» (4).
Trata-se, portanto, de um número dotado de consciência e que aparenta equivaler ao Universo, dois aspectos que agudizam a tarefa de o definir sem ambiguidade. Mesmo excluindo a hipótese panteísta, como é possível a um Deus ser corpóreo, possuir consciência integral do mundo e da mudança e, em simultâneo, permanecer imóvel? A consciência, ao sê-lo sempre de qualquer coisa, é uma estrutura dinâmica. A menos que a consideremos a fonte suprema – e quieta – do movimento. Isso, no entanto, só ajuda a tornar o assunto ainda mais enigmático – para nós, para Xenófanes e talvez para a própria divindade.

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