domingo, 21 de julho de 2013

ENTRE O NADA E A DIVINDADE


M. C. Escher, Divisão Cúbica do Espaço, 1925.
Perguntar de que modo a minhoca sai da terra é tão legítimo quanto o querer saber de que modo na terra entra a minhoca. Uma vez que, em princípio, temos acesso aos dois elementos – minhoca e terra–, também faz sentido indagar as diversas relações estabelecidas entre ambos.
Já no tocante às questões «como pôde alguma coisa surgir do nada?» e «como pode no nada ingressar alguma coisa?», a abordagem esbarra com um problema estruturalmente capcioso, à semelhança aliás de todos os enigmas em que o nada intervém. De facto, a interrogação só é formulável no interior de uma das partes, ficando a outra vedada a exercícios interpelantes.
A hipótese de que resida em Deus – desde que entendido à maneira de um ser perfeito criador de um imperfeito mundo – a solução das duas últimas dificuldades representa uma curiosa estratégia de encobrimento de um equívoco, mediante o uso da incerteza: o equívoco de se tomar a ausência de realidade pela existência efectiva e a incerteza de se fornecer uma explicação tecida de elementos inconciliáveis.
Talvez Deus e o nada, quando concebidos em simultâneo das formas acima referidas, nos sirvam de barreiras contra as avalanches do absurdo. Mas, para isso, é necessário que finjamos olvidar – ou, no limite, que aceitemos sem reserva – a incongruência da noção de nada e os paradoxos que a de Deus implica.

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