sábado, 20 de julho de 2013

ALGURES



Héracles e a Hidra de Lerna.

É escusado. A idade não traz relevantes certezas: elege o hábito, consagra o meramente provável. Aquilo a que se chama sentido da existência, ainda que pontualmente elucidado por virtude de frases sedutoras, circunda-se de brumas que ressurgem à semelhança das loucas cabeças da Hidra de Lerna: ou o imaginamos à distância do que hoje somos, e assim só o temos em jeito de arremedo, ou já dispomos dele aqui e agora, e torna-se pouco sensata, a esse nível, a mínima interpelação.
Por vezes, apetece mesmo ser uma criatura acéfala e suprimir do íntimo as análises teóricas, ou uma entidade policéfala – de preferência menos perversa do que o monstro que Héracles combateu –, cuja inquietação transitasse de cabeça em cabeça, à maneira de um objecto indesejado ou proibido que se escondesse, todas as noites, numa casa diferente.E deste modo, algures entre o amor indisciplinado pelo destino e uma alergia extemporânea à vida, tentamos neutralizar a ameaça do absurdo, esperando que ela nunca decida transpor as fronteiras da reflexão nem os limites da poesia.

Sem comentários:

Enviar um comentário