quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

O crescimento segue dentro de momentos 17 Outubro 2014, por Cristina Casalinho


O Fundo Monetário Internacional (FMI) publicou na passada semana a atualização das projeções de crescimento para a economia mundial.

Face ao anúncio realizado em abril último, constata-se uma reapreciação em baixa das estimativas de expansão do PIB da área do euro de 1,2% para 0,8% e nos EUA de 2,8% para 2,2% para 2014, intensificando-se os receios de andamento medíocre e desequilibrado da economia global. Enquanto a presidente do FMI falou numa nova normalidade medíocre, o vice-presidente referiu a necessidade dos países procurarem aconselhamento e emularem experiências de países bem sucedidos, favorecendo a adoção de reformas estruturais e políticas económicas com cariz mais expansionista para redinamizar o crescimento económico. O produto expande-se a níveis anémicos, os preços encolhem, as taxas de juro tornam-se negativas. Qual é a principal questão do crescimento nos países desenvolvidos? Existe falta de procura?

Afigura-se consensual que o nível aquisitivo das economias desenvolvidas no último quartel de século ampliou-se - hoje, consomem-se mais telefones/telemóveis, casas, automóveis, casacos, sapatos, … Dificilmente, se conseguiria imaginar o consumidor europeu ou americano a comprar mais e sobretudo parece difícil continuar a aumentar o ritmo aquisitivo. Para as economias continuarem a expandir-se, não chega empresas ou famílias produzirem ou comprarem o mesmo que o ano passado, têm de produzir ou comprar mais numa espiral ascendente. Nos últimos anos, a espiral desandou por altura da Grande Depressão e, depois de alguma reanimação, estabilizou. Estamos, então, na fase de estabilização. As pessoas compram menos, porque a população envelhece, consumindo mais serviços que bens. Os rendimentos encontram-se estagnados pelo efeito da globalização e por via da necessidade de melhoria de competitividade, para assegurar a manutenção de postos de trabalho. As empresas investem menos (na Alemanha, o patamar de investimento encontra-se em mínimos), devido às fracas perspetivas de expansão da procura na Europa, sobretudo pelas razões acima apontadas. Quando aumentam capacidade produtiva, fazem-no nas economias emergentes.

As reformas estruturais poderão fazer muito bem a algumas economias europeias, expondo-as a maior concorrência externa e interna. A diminuição de barreiras à entrada e saída nos mercados de produtos e serviços cria um quadro competitivo tendencialmente mais saudável e inovador, promovendo eficiência e produtividade. Contudo, o sucesso e os ganhos das reformas estruturais dependem do ponto de partida. Nas economias desenvolvidas, os ganhos de eficiência promovidos pelas reformas serão incomensuravelmente inferiores que os observados, por exemplo, na Ásia ou na América Latina aquando das respetivas crises da dívida. Sobretudo na vertente relativa ao impulso produzido pela reforma das instituições e do seu papel charneira do crescimento harmonioso das sociedades.

Um mercado de capitais mais desenvolvido, em que o financiamento das empresas se processa preferencialmente num ambiente de desintermediação financeira, exigindo estruturas de capital mais equilibradas e que passa, espera-se, por uma formação de preços mais disseminada e eficiente, favorece o aparecimento de novas unidades produtivas. Sociedades como as escandinavas ou norte-americanas com proliferação de esquemas privados de pensões, cujos fundos investem em obrigações e ações, permitem às famílias complementar a remuneração do fator trabalho com remunerações associadas ao capital por via nas suas participações em fundos de investimento ou de pensões numa cultura de investimento fora de uma lógica estrita de depósitos bancários. A fragmentação do mercado monetário e as implicações no mecanismo de transmissão do crédito na Europa obrigam a um esforço mais significativo por parte do BCE que noutras latitudes, porque o trabalho é realizado quase em exclusivo mediante um canal - o crédito bancário. Ora, as alterações regulamentares, as carteiras de crédito em muitos bancos europeus ainda vivem dias de baixa rendibilidade, seja por causa do elevado risco de perda ou pela baixa remuneração, o risco associado à atividade económica na Europa, a procura anémica, elevam a fasquia do desafio para o BCE no seu esforço de reanimação do crédito.

Nalguns casos existe falta de procura, noutros as reformas são imprescindíveis, nuns a política monetária pode ser mais bem-sucedida, noutros os gastos públicos são recomendáveis. As manifestações de doença podem ser semelhantes, bem como alguns dos obstáculos estruturais ao crescimento; porém, o que se constata é que não existe uma solução pré-preparada para cada país ou economia e é, essencialmente, um processo de tentativa-erro.

Economista
Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico.

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