quinta-feira, 31 de julho de 2014

O caso BES e as falhas do Estado



JOÃO CONFRARIA

31/07/2014

O caso BES vai ser muita coisa para muita gente. Aqui queria falar dele como uma amostra da nossa incapacidade de atingir um objetivo das privatizações que era reforçar a capacidade empresarial nacional. A falência do grupo é um caso particular, entre outros, embora de grande dimensão. O pior é que o Estado falhou pois não atingiu os objetivos que tinha.

Reforçar a capacidade empresarial nacional foi um objetivo estabelecido na Lei-quadro das privatizações (Lei nº 11/90). Não ia valer para todas as empresas a privatizar. Em muitas delas da gestão pública não tinham saído boas empresas e esperava-se que o investimento estrangeiro as viabilizasse. No entanto, entre as empresas a privatizar, e certamente entre as de maior valor, estavam algumas com capacidades técnicas e de gestão indiscutíveis.

No setor financeiro, nas comunicações e tecnologias de informação, nalgumas infraestruturas de transporte, nos cimentos, na energia ou na fileira florestal acreditava-se que a privatização, eliminando as inércias do Estado, daria origem a empresas nacionais sólidas com capacidade própria de internacionalização. Contribuiriam para que a economia portuguesa aumentasse a sua parte nos ganhos da globalização.

Este objetivo manteve-se até 2011, altura em que foi abandonado, com a Lei nº 5/2011. Olhando a realidade atual é claro que não foi atingido. Alguns conseguiram mais-valias na venda de ações obtidas nas fases iniciais de algumas privatizações. E até pode ser que essas mais-valias remunerassem alguma contribuição efetiva para a gestão das empresas. Mas não se pode dizer que na maior parte dos casos as empresas privatizadas sejam pilares de grupos empresariais nacionais, tenham processos de internacionalização bem sucedidos ou sejam parte de processos de internacionalização de grupos nacionais.

Atualmente, os seus dividendos remuneram sobretudo acionistas estrangeiros e não é evidente que a sua integração em grupos estrangeiros traga ganhos significativos através de prestação de serviços a empresas desses grupos, ou outras formas de retenção de valor para a economia portuguesa. Há casos pontuais que não são bem assim, por exemplo na energia, nas comunicações ou na fileira florestal. Mas em 1990 quando se estabeleceu o objetivo de promover a capacidade empresarial nacional não se imaginaria certamente como sucesso a situação que temos hoje.

Quer isto dizer que falhámos? Dizer o contrário, que não falhámos, significa dizer que não poderíamos ter feito melhor, ou que, em cada momento, o Estado e as empresas tomaram as melhores decisões que podiam ter tomado. O assunto não é pacífico e parece-me que a sua discussão é importante para percebermos o que andámos mesmo a fazer nestes últimos 25 anos. Arrisco que podíamos ter feito melhor. Mais precisamente, o Estado podia e devia ter feito melhor.

As privatizações começaram a partir de uma base capitalista nacional endividada, com alguma dimensão interna mas com uma expressão internacional reduzida ou nula. Muitos novos acionistas viam as privatizações como forma de obter recursos que permitissem o serviço das suas dívidas.

Não era evidente que considerassem as empresas privatizadas de que eram novos acionistas como negócios a desenvolver, muitas vezes com grande intensidade capitalística, pelo menos enquanto não reequilibrassem as suas estruturas financeiras. Isto quando esses excedentes não eram utilizados para financiar negócios noutras indústrias, com as quais os novos acionistas estariam eventualmente mais familiarizados. E havia que ter em conta com um problema antigo, a relutância do capital privado português em entrar em investimentos significativos sem algum envolvimento do setor público.

O Estado não podia ignorar estas condições básicas do início dos anos 90. E certamente não ignorava, até porque poderiam colidir com outro objetivo essencial do processo de privatizações, ainda nos termos da Lei nº 11/90: modernizar as unidades económicas e aumentar a sua competitividade. Para atingir estes objetivos o Estado deveria ter um papel nos processos de crescimento dos grupos empresariais nacionais e na gestão das empresas privatizadas.

Uma forma simples de o conseguir seria manter nas empresas privatizadas uma posição acionista minoritária mas significativa. Era um meio prático de moderar políticas de distribuição de dividendos, ou outras tendentes a retirar dos negócios privatizados os excedentes gerados, com prejuízo para o seu crescimento futuro, ou de condicionar alianças ou movimentos de concentração. Para isto não era necessário nem um Estado acionista, nem um Estado empreendedor e muito menos um Estado regulador. Bastava um Estado capaz. Que visse as vantagens das privatizações e por isso não interferisse politicamente nas decisões mas cuidasse da prosperidade das empresas.

No início parecia ser essa a ideia. Previa-se que o Estado mantivesse uma posição acionista de referência em muitas das empresas. No entanto, à medida que o processo de privatizações avançava a ideia parece ter mudado. Pelos vistos, com má consciência, bem simbolizada pelas golden shares através das quais se pretendia continuar a mandar no que se tinha vendido. Como se demonstrou em condições infelizes para nós e para a nossa credibilidade coletiva, de pouco serviam. Aliás, era fácil ver que nunca dariam ao Estado a mesma transparência e a mesma capacidade de intervenção em questões estratégicas que uma posição acionista de referência permitiria.

O problema é então saber por que motivo o nosso Estado não foi capaz de fazer meia dúzia de coisas sensatas? O seu abandono de alguma função, necessária mas transitória, na gestão de dinâmicas empresariais não tinha que acontecer assim. Não correspondeu a um movimento universal. Não foi seguido em Espanha e em França. Nem na Coreia do Sul. E isto para não falar do capitalismo de Estado que tem levado às expansões internacionais de empresas estatais ou apoiadas por capitais estatais de Singapura, da China ou do Brasil, e que acabaram por ter um papel relevante nas privatizações e nos movimentos de concentração em Portugal.

Realmente, estamos assim porque, por opção ou omissão, foram tomadas decisões nesse sentido. Julgo que podemos admitir, nem que seja como base de debate, que a nossa situação atual resulta da convergência entre um processo político que desvalorizou o Estado e uma dinâmica empresarial que preferia um Estado fraco.

A despesa pública foi aumentando ao sabor da circunstância política e do ciclo económico. O Estado estava mais interessado em obter dinheiro a curto prazo para pagar a despesa crescente do que em manter capital nas empresas, porque neste caso era somente a prazo que se podia obter mais dinheiro, como dividendos. As receitas das privatizações foram certamente utilizadas para reduzir dívida. Mas como os défices se mantinham no setor público isso de pouco adiantava. Chegados ao fim do ano, aumentava sempre a dívida. E ainda assim, houve pelo menos uma privatização famosa, a venda da rede básica de telecomunicações, cuja receita se destinava a colmatar uma parte de um défice excessivo.

Esta saída do Estado do capital das empresas foi racionalizada com a ideologia do Estado regulador. Dizia-se que bastava deixar os mercados funcionar e garantir que havia regulação para resolver falhas de mercado. Esta ideia era insuficiente por várias razões. Desde logo, apesar do esforço de constituição de algumas autoridades reguladoras, a ideologia esteve quase sempre além da realidade.

Nalguns casos só tardiamente foram atribuídos às autoridades reguladoras competências legais e poderes efetivos de intervenção. Noutros criaram-se autoridades no papel e não se cuidou de garantir que tinham os técnicos adequados. Ou preencheram-se os quadros dessas autoridades e de outros organismos do Estado com funções reguladoras de acordo com procedimentos tradicionais influenciados pela política partidária. Mas o mais importante era que o Estado regulador era insuficiente para resolver os problemas que a saída completa do Estado do capital das empresas abria por uma razão muito mais simples e básica: a regulação não está feita para isso, na União Europeia. Ou seja, não se teve em conta que o interesse público nos mercados, designadamente os objetivos estabelecidos pela Lei nº 11/90, não se esgotavam no interesse público a ser prosseguido pelo Estado na sua função reguladora tal como definida num quadro europeu.

Era necessário também um quadro técnico-institucional, que tinha que ser completamente independente do quadro regulador, que garantisse que a intervenção do Estado como acionista se pautasse por critérios empresariais e não por conveniências políticas. Não se fez isto. E assim houve objetivos de interesse público, e daqueles que no discurso político até apareciam como estratégicos, sem instrumentos adequados para os atingir.

No seu lado da vida portuguesa, cada empresa queria um Estado que protegesse os seus interesses mas que não interferisse com eles. Nem sempre acolhia bem o Estado como acionista de referência mas a ideologia do Estado regulador interessava-lhe. Da regulação formalmente não podia fugir, pois regra geral foi imposta a nível europeu. Mas percebeu que mesmo funcionando bem o Estado regulador tinha os limites da Lei. E quando não funcionava bem, o que acontecia muitas vezes por defeito no desenho das instituições, as desvantagens de informação e de capacidade técnica do Estado seriam tão grandes que os seus poderes efetivos de intervenção sempre seriam reduzidos.

As empresas não estavam interessadas num Estado forte e por isso não se preocuparam muito com o enfraquecimento progressivo da capacidade pública de intervenção na vida portuguesa.

No final ficámos com um Estado a mudar de acordo com a circunstância político económica, sem capacidade de definir um rumo para atingir os objetivos que tinha definido. Falhámos todos.

Economista, Universidade Católica Portuguesa

sexta-feira, 25 de julho de 2014

“O Banqueiro”, poema de Craig-James Moncur, dito por Mike Daviot.




The Carrot Clarinet

The Carrot Clarinet

BES - porquê só agora ?



I N T R O I T O

ACTIVOS DA FAMÍLIA ESPIRITO SANTO

Herdade da Comporta

(onde, candidamente, iam brincar aos pobrezinhos) com uma área de 12,5 mil hectares (área cultivada de arroz, 1 100 hectares e produz também: vinho, milho, batata-doce e curgetes). A parte florestal tem uma área de 7 100 hectares de pinheiros e carvalhos. Existe um projecto imobiliário e turístico.

Industria hoteleira

Possui 14 unidades hoteleiras (Tivoli, Hotels & Resorts), todos de 4 e 5 estrelas. No Brasil 2 unidades ( S.Paulo e Praia do Forte em S.Salvador da Baía). Em Portugal 12 unidades (6 no Algarve, 3 em Lisboa, 2 em Sintra e um em Coimbra). Tem uma oferta total de 3000 quartos.

Operador Turístico

Tem mais de 50 balcões espalhados pelo País. A actividade alarga-se até Angola, Itália e Espanha. Opera com as marcas Top Atlântico, Carlson Wagonlit e BCD Travel. Detém a operadora online Netviagens.

Portucale

Proprietários da herdade Vargem Fresca (Ribatejo) com cerca de 510 hectares, alberga dois campos de golfe, Ribagolfe I e II. A Portucale esteve envolvida num escândalo em conjunto com o governo Santana Lopes/Durão Barroso/Paulo Portas, acerca de um abate ilegal de sobreiros, autorizado às pressas e após terem perdido as eleições para o PS. Conta-se, que na altura o CDS teria recebido um milhão de euros e justificado ter sido oferecido por diversos donativos de militantes, entre eles, o muito glosado MANUEL LEITE DO REGO.

Esta Propriedade foi destacada da Companhia das Lezírias (do Estado), com o argumento/justificação de que iriam ali plantar novas espécies arbóreas!!! Éra bom, conveniente, que alguém fizesse uma investigação sobre a forma como esta propriedade foi transacionada. Como foi retirada ao Estado, a que preço!

Espirito Santo Saúde

O grupo tem cerca de 18 unidades clínicas, 1200 camas e cerca de 9000 funcionários. Os três principais hospitais são o da Luz, em Lisboa, o da Arrábida, em Vila Nova de Gaia e o Beatriz Ângelo, em Loures.

Fazendas no Brasil

O Grupo Espírito Santo tem duas grandes fazendas no interior do Brasil. Uma no Estado de S. Paulo com 12 mil hectares, mais propriamente em Botucatu, chamada Fazenda Morrinhos. Produz, laranjas, limões, eucalipto e cana de açúcar.

A outra, é a Fazenda Pantanal de Cima, no estado de Tocatins, com uma área de 20 000 hectares, 3 mil dos quais asseguram produção de arroz no verão e de soja no inverno.

Herdade no Paraguai

É a maior herdade do Grupo, Estende-se por cerca de 135 mil hectares, no Paraguai. Este terreno tem uma dimensão equivalente à do quinto maior concelho do País (Uma área onde caberiam 16 Lisboas) Alberga mais de 53 mil cabeças de gado e possui 75 mil hectares de pastagens, 12 mil hectares de floresta e 5 mil de cultivo agrícola, nomeadamente de soja e algodão.

Atlantic Meals - Agroalimetar

Produz arroz, milho e alimento para crianças, como as farinhas sem glúten. Tem três unidades industriais em Portugal (Coruche, Biscainho e Alcácer do Sal) e uma outra em Sevilha. Opera com as marcas Ceifeira, Sorraia, Atlantic e Atlantic Le Chef. A Atlantic Meals é fornecedora das indústrias cervejeira e agroalimentar. Tem uma capacidade de secagem de arroz e milho de 50 mil ton. ano.

Espirito Santo Property Brasil

É a empresa imobiliária do grupo no Brasil associada à OA (Oscar Americano), com vários projectos residenciais, de comércio, parques logísticos, escritórios e loteamento. As actividades principais são em S.Paulo, onde desenvolve projectos imobiliários emblemáticos, como o complexo Villa Lobos, com área comercial e residencial, ou a Alameda dos Pinheiros. Tem expandido a actividade a outros estados brasileiros, como é o caso da Santa Catarina, Paraná, Rio de Janeiro e Baía. Já concretizou empreendimentos fora do Brasil, como é o caso do edifício Plaza Miami, no centro desta cidade norte americana, um prédio com uma área total de 120 mil metros quadrados com área residencial, escritórios e hotel.

Espirito Santo Property (Portugal)

É um dos maiores promotores imobiliários de Portugal. Vocacionado para o segmento alto, a empresa foi criada com o nome Espart, designação que acabou por ser alterada em Novembro do ano transacto. Um dos primeiros grandes trabalhos foi o desenvolvimento da Quinta do Patiño, no Estoril (onde está o Dias Loureiro e o Rendeiro), transformando um antigo palácio e respectivos jardins numa das áreas mais exclusivas de Portugal. Conta além disso, no seu portfólio, com edifícios em Lisboa, com o nº. 15 da Rua Castilho e o 238 da Avª. da Liberdade, o Ivens 31, no Chiado e o Parque dos Príncipes, em Telheiras. E tem as residências do Palácio Estoril, a Quinta do Peru, em Azeitão, as Casas de São Francisco, em Santiago de Cacém, o Oeiras Golf & Residence, o Doro Atlantic Garden, em Gaia e as Quintas D'Al-Gariya, em Portimão, entre outros edifícios.

Companhia de Seguros Tranquilidade

Valor de activos sob gestão 800 (oitocentos) milhões de Euros.

Banco Espirito Santo

A GALINHA DOS OVOS DE OURO.

Não consta neste rol, as "poupanças estratégicas" eventualmente acantonadas em offshore´s (do BES/Angola, não se sabe onde param, cerca 5,7 mil milhões de $USA).

Sabe-se é que:

O BES/Portugal, emprestou 3 mil milhões de Euros. ao BES/Angola, os quais, dizem, estão perdidos.

O BES emprestou ao Grupo Espirito Santo 1 200 milhões de €. Com insolvência deste grupo, a liquidação desta verba é um sonho.

A Caixa Geral de Depósitos, desembolsou 300 milhões de €, recebendo como garantia as acções do grupo, nesta altura do campeonato valem um grandíssimo ZERO. A C.G.D. (empresa pública), empresta 300 milhões de €? E quem será o responsável? Logicamente a ministra das finanças. Estão todos calados que nem ratos...

No cômputo geral, a exposição de empresas portuguesas no Espírito Santos Financial Group (maior accionista do BES), é de cerca 5 000 milhões de € (cinco mil milhões de euros).

Ao ser aceite o pedido de protecção de credores e/ou em alternativa ser declarada a insolvência deste grupo, lá vem mais um "tsunami" financeiro (Quando o mar bate na rocha quem se lixa, quem é?, quem é?: Obviamente o mexilhão).

No meu mail de cinco do corrente, aconselhava a quem tivesse muita fé, a pôr uma velinha aos pés da N.S.de Fátima e que rezassem muito e com toda a veemência, a fim de não ser outra vez o "mexilhão" a pagar estes desmandos. Hoje, não peço que ponham uma velinha mas sim uma palete delas e não rezem, acampem na igreja e se possível, peçam acompanhamento pelo Duarte Lima.

A desgraça deste país é o sistema bancário e tudo o que rodeia. Não foi esta oligarquia, com o conforto do sr. governador do Banco de Portugal e do residente de Belém os incentivadores da chamada do FMI? com que objectivo? O objectivo era a salvação das suas casas bancárias, as maiores causadores da dívida soberana, hoje sobejamente sabido, ser ela mais privada do que pública em detrimento do povo português, vilmente sacrificado, para satisfação da ambição destes malandros.

Enoja, ver, ler e ouvir os mais diversos gurus do regime, tentar minimizar os desmandos desta "troupe". No entanto, o excremento é tanto, que a carpete da "sopeira", já não tem capacidade para acolher tanto lixo e este, já incontrolavelmente, é exposto à saciedade.

Onde estarão as críticas do Marcelo Rebelo de Sousa (cardeal Richelieu) e de Sousa Tavares? O primeiro tem como companheira, há longuíssimos anos, Rita Berta Cabral, administradora não executiva do BES e um dos três membros da Comissão de Vencimentos do BES, entre 2008/2012. Assíduo acompanhante de Ricardo Salgado nas férias no Mediterrâneo. Os netos do segundo (Sousa Tavares), são os mesmos netos do sr. Ricardo Salgado.

Em súmula, que tem o sr. Cavaco Silva e o Governo a comentar sobre estas turbulências? Terão o moral suficiente para tomar decisões adequadas e criticar o seu aliado mais forte no derrube do governo anterior? Já começa a ser trágico (para o povo português) o constante envolvimento destas entidades com esta pirataria bancária. E o que é constrange mais, desde o mais brilhante quadro até ao mais humilde servente? O saber-se que esta gente vai usufruir de chorudas pensões de reforma e passam incólumes perante esta (in)justiça portuguesa.

Por fim, descobriu-se um novo super-homem, Vítor Bento. Este sr. foi convidado para presidir à administração do BES (antes tinha sido convidado para ministro das finanças. Declinou (sempre é melhor banqueiro que ministro) e assim avançou outro super-homem Vítor Gaspar (...afinal havia outro..."vítoraf" ... como diz uma famosa canção), o que me leva a acreditar que o Vítor (Gaspar), não era tão super como os "gurus do regime" nos quiseram vender e este (Bento) será?

Desconfio e muito. Para já, o sr. Vítor Bento (protegido do Catroga)não tem qualquer experiência bancária. Teremos que acreditar na sua perspicácia e inteligência e apesar de lhe conceder o benefício da dúvida nestes requisitos, não acredito nele. E porquê? Quando este individuo afirma e reafirma que a actual situação económica/financeira tem por culpado primário o POVO PORTUGUÊS, por ter VIVIDO ACIMA DAS SUAS POSSIBILIDADES, vai agora presidir a uma entidade, testemunho vivo, contrário à sua pseudo-teoria.

Por fim, constata-se o aumento da dívida em 40%, desde a chegada da troika. A intervenção do Estado em 3 bancos (BCP, BANIF e BPI) BPN E BPP são casos de polícia e agora o estrondo do BES a somar às chorudas reformas dos ex-presidentes banqueiros, autores, no mínimo, de gestão danosa, com direito a prisão. E os "gurus do regime" não comentam nada? Ou será que comem todos na mesma gamela doirada?

O povo no alto da sua sabedoria: "ROUBAS UM PÃO ÉS UM LADRÃO, ROUBAS UM MILHÃO ÉS UM BARÃO"

Grupo Espírito Santo: "too big to fail" ou "too holy to jail?"

Por Ana Gomes

Eu proponho voltarmos a 6 de Abril de 2011 e revisitarmos o filme do Primeiro Ministro José Sócrates, qual animal feroz encostado as tábuas, forçado a pedir o resgate financeiro. Há um matador principal nesse filme da banca a tourear o poder político, a democracia, o Estado: Ricardo Salgado, CEO do BES e do Grupo que o detém e controla, o GES - Grupo Espírito Santo. O mesmo banqueiro que, em Maio de 2011, elogiava a vinda da Troika como oportunidade para reformar Portugal, mas recusava a necessidade de o seu Banco recorrer ao financiamento que a Troika destinava à salvação da banca portuguesa.

A maioria dos comentaristas que se arvoram em especialistas económicos passou o tempo, desde então, a ajudar a propalar a mentira de que a banca portuguesa - ao contrário da de outros países - não tinha problemas, estava saudável (BPN e BPP eram apenas casos de polícia ou quando muito falha da regulação, BCP era vítima de guerra intestina: enfim, excepções que confirmavam a regra!). Mas revelações recentes sobre o maior dos grupos bancários portugueses, o Grupo Espírito Santo, confirmam que fraude e criminalidade financeira não eram excepção: eram - e são - regra do sistema, da economia de casino em que continuamos a viver.

Essas revelações confirmam também o que toda a gente sabia - que o banqueiro Salgado não queria financiamento do resgate para não ter que abrir as contas do Banco e do Grupo que o controla à supervisão pelo Estado - esse Estado na mão de governantes tão atreitos a recorrer ao GES/BES para contratos ruinosos contra o próprio Estado, das PPPs aos swaps, das herdades sem sobreiros a submarinos e outros contratos de defesa corruptos, à subconcessao dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo. À conta de tudo isso e de mecenato eficiente para capturar políticos - por exemplo, a sabática em Washington paga ao Dr. Durão Barroso - Ricardo Salgado grangeou na banca o cognome do DDT, o Dono De Tudo isto, e conseguiu paralisar tentativas de investigação judicial - sobre os casos dos Submarinos, Furacão e Monte Branco, etc.. e até recorrer sistematicamente a amnistias fiscais oferecidas pelos governos para regularizar capitais que esquecera ter parqueado na Suíça, continuando tranquilamente CEO do BES, sem que Banco de Portugal e CMVM pestanejassem sequer...

Mas a mudança de regras dos rácios bancários e da respectiva supervisão - determinados por pressão e co-decisão do Parlamento Europeu - obrigaram o Banco de Portugal a ter mesmo de ir preventivamente analisar as contas do BES/GES. A contragosto, claro, e com muito jeitinho - basta ver que, para o efeito, o Banco de Portugal, apesar de enxameado de crânios pagos a peso de ouro, foi contratar (cabe saber quanto mais pagamos nós, contribuintes) uma consultora de auditoria, a KPMG - por acaso, uma empresa farta de ser condenada e multada nos EUA, no Reino Unido e noutros países por violações dos deveres de auditoria e outros crimes financeiros e, por acaso, uma empresa contratada pelo próprio BES desde 2004 para lhe fazer auditoria...

Mas a borrasca era tão grossa, que nem mesmo a KPMG podia dar-se ao luxo de encobrir: primeiro vieram notícias da fraude monstruosa do GES/BES/ESCOM no BESA de Angola, o "BPN tropical", que o Governo angolano cobre e encobre porque os mais de 6 mil milhões de dólares desaparecidos estão certamente a rechear contas offshore de altos figurões e o povo angolano, esse, está habituado a pagar, calar e a ...não comer... Aí, Ricardo Salgado accionou a narrativa de que "o BES está de boa saúde e recomenda-se", no GES é que houve um descontrolo: um buracão de mais de mil e duzentos milhões, mas a culpa é... não, não é do mordomo: é do contabilista!

Só que, como revelou o "Expresso" há dias, o contabilista explicou que as contas eram manipuladas pelo menos desde 2008, precisamente para evitar controles pela CMVM e pelo Banco de Portugal, com conhecimento e por ordens do banqueiro Salgado e de outros administradores do GES/BES. E a fraude, falsificação de documentos e outros crimes financeiros envolvidos já estão a ser investigados no Luxemburgo, onde a estrutura tipo boneca russa do GES sedia a "holding" e algumas das sociedades para melhor driblar o fisco em Portugal.

Eu compreendo o esforço de tantos, incluindo os comentadores sabichões em economia, em tentar isolar e salvar deste lamaçal o BES, o maior e um dos mais antigos bancos privados portugueses, que emprega muita gente e que obviamente ninguém quer ver falir, nem nacionalizar. Mas a verdade é que o GES está para o BES, como a SLN para o BPN: o banco foi - e é - instrumento da actividade criminosa do Grupo. E se o BES será, à nossa escala, "too big to fail" (demasiado grande para falir), ninguém, chame-se Salgado ou Espírito Santo, pode ser "too holy to jail" ( demasiado santo para ir preso).

Isto significa que nem os empregados do BES, nem as D. Inércias, nem os Cristianos Ronaldos se safam se o Banco de Portugal, a CMVM, a PGR e o Governo continuarem a meter a cabeça na areia, não agindo contra o banqueiro Ricardo Salgado e seus acólitos, continuando a garantir impunidade à grande criminalidade financeira - e não só - à solta no Grupo Espírito Santo.




quinta-feira, 24 de julho de 2014

QUAISQUER SEMELHANÇAS COM O GRUPO ESPÍRITO SANTO SÃO MERAS COINCIDÊNCIAS



Esta vale a pena ler. Qualquer semelhança com alguma instituição que conheçam é pura coincidência.

Vamos IMAGINAR coisas…

Vamos imaginar que o meu avô tinha criado um Banco num País retrógrado, a viver debaixo de um regime ditatorial.
Depois, ocorreu uma revolução.
Foi nomeado um Primeiro-Ministro que, apesar de ser comunista, era filho do dono de uma casa de câmbios. Por esta razão, o dito Primeiro-Ministro demorou muito tempo a decidir a nacionalização da Banca (e, como tal, do Banco do meu avô).

Durante esse período, que mediou entre a revolução e a nacionalização, a minha família, tal como outras semelhantes, conseguiu retirar uma grande fortuna para a América do Sul (e saímos todos livremente do País, apesar do envolvimento direto no regime ditatorial).

Continuemos a IMAGINAR coisas…

Após um período de normal conturbação revolucionária, o País entrou num regime democrático estável. Para acalmar os instintos revolucionários do povo, os políticos, em vez de tentarem explicar a realidade às pessoas, preferiram ser eleitoralistas e “torrar dinheiro”. Assim, endividaram o País até entrar em banca-rota, por duas vezes (na década de 80).

Nessa altura, perante uma enorme dívida pública, os políticos resolveram privatizar uma parte significativa do património que tinha sido nacionalizado. Entre este, estava o Banco do meu avô.

E, continuando a IMAGINAR coisas…

A minha família tinha investido o dinheiro que tinha tirado de Portugal em propriedades na América do Sul. Como não acreditávamos nada em Portugal, nenhum de nós quis vender qualquer das propriedades ou empatar qualquer das poupanças da família. Mas, queríamos recomprar o Banco do meu avô.

Então, viemos a Portugal e prometemos aos políticos que estavam no poder e na oposição, que os iríamos recompensar (dinheiro, ofertas, empregos, etc…) por muitos anos, se eles nos vendessem o Banco do meu avô muito barato. Assim, conseguimos que eles fizessem um preço de (vamos imaginar uma quantia fácil para fazer contas) 100 milhões, para um Banco que valia 150.

Como não queríamos empatar o “nosso” dinheiro, pedimos (vamos imaginar uma quantia) 100 milhões emprestados aos nossos amigos franceses que já tinham ganho muito dinheiro com o meu avô. Com os 100 milhões emprestados comprámos o Banco (o nosso dinheiro, que tínhamos retirado de Portugal, esse ficou sempre guardado).

E assim ficámos donos do Banco do meu avô. Mas tínhamos uma dívida enorme: os tais 100 milhões. Como os franceses sabiam que o Banco valia 150, compraram 25% do Banco por 30 milhões (que valiam 37,5 milhões) e nós ficámos só a dever 70 milhões (100-30=70). Mesmo assim era uma enorme dívida.

Continuemos a IMAGINAR coisas…

Tal como combinado, viemos para Portugal e começámos a cumprir o que tínhamos prometido aos políticos (dinheiro para as campanhas eleitorais, ofertas de vária espécie, convites para todo o tipo de eventos, empregos para os familiares e para os próprios nos momentos em que estavam na oposição, etc…).

Como ainda tínhamos uma grande dívida, resolvemos fazer crescer mais o Banco do meu avô.

Assim, fomos falar com uma nova geração de políticos e prometemos todo o tipo de apoios (dinheiro, ofertas, empregos, etc…) se nos dessem os grandes negócios do Estado.

E eles assim fizeram. E o Banco do meu avô, que tinha sido vendido por 100, quando valia 150, valia agora 200 (por passarem por ele os grandes negócios do Estado).

Mas, mesmo assim, nós ainda devíamos 70 milhões (e tínhamos de pagar, pelo menos uma parte dessa dívida, caso contrário, os franceses ficavam com o Banco do meu avô).

E, continuando a IMAGINAR coisas…

O meu tio, que era presidente do Banco do meu avô, reformou-se. Nessa altura a família estava preparada para nomear um dos meus primos para presidente. Eu queria ser presidente e prometi à família toda um futuro perpétuo de prosperidade se me nomeassem a mim como presidente.

E assim foi. Fui, finalmente, nomeado presidente do Banco do meu avô.

Mas era preciso pagar uma parte da dívida aos franceses. Podíamos vender uma parte do Banco em Bolsa, mas deixávamos de mandar (logo agora que eu era presidente – não podia ser assim).

Então desenhei um plano:

Criei uma empresa, chamada “Grupo do meu avô” (em que a minha família tinha 100% do capital) e passei os nossos 75% do Banco (25% eram dos franceses) para essa nova empresa.

Assim, a família era dona de 100% do “Grupo” que era dono de 75% do Banco.

Falei com os franceses e combinei mudarmos os estatutos do Banco: quem tivesse 25% mandava no Banco (e os franceses não se metiam, a não ser para decidir os dividendos que queriam receber).

Assim, como o Banco agora valia 200, vendemos 50% na Bolsa por 100 (metade dos 200). Com 50 capitalizámos o Banco. Os restantes 50 tirámos para nós (37,5 para a família e 12,5 para os franceses).

Demos também os nossos 37,5 aos franceses e assim ficámos só a dever 32,5 milhões (70-37,5). Ainda era uma grande dívida, mas continuávamos a mandar no Banco do meu avô (apesar da nossa empresa “Grupo do meu avô” só ser dona de 25% – os franceses tinham outros 25% e os restantes 50% estavam dispersos por muitos acionistas).

Ainda tínhamos uma enorme dívida de 32,5 milhões. Mas, a verdade é que continuávamos a mandar no Banco do meu avô e tínhamos transformado uma dívida inicial de 100 em outra de 32,5 (sem termos gasto um tostão da família – o nosso dinheiro continua, ainda hoje, guardado na América do Sul). Convenci-me, nessa altura, que era um génio da finança!

Continuemos a IMAGINAR coisas…

A certa altura, o crédito tornou-se uma coisa muito barata. Eu sabia que tínhamos um limite original de 100 milhões e já só devíamos 32,5 milhões. Assim, a empresa “Grupo do meu avô” voltou a endividar-se: pediu mais 67,5 milhões (voltámos a dever 100 milhões) e desatei a comprar tudo o que fosse possível comprar.
Tornei-me assim, o dono disto tudo (o Banco do meu avô, a Seguradora do meu avô, a Meu avô saúde, a Meu avô hotéis, a Meu avô viagens, a Construtora do meu avô, a Herdade do meu avô onde se brinca aos pobrezinhos, etc…).
Entretanto fui pagando as minhas promessas aos políticos (dinheiro para as campanhas eleitorais, ofertas de vária espécie, convites para todo o tipo de eventos, empregos para os momentos em que estavam na oposição, etc…).

E, continuando a IMAGINAR coisas…

Mas havia agora uma nova geração de políticos. Fui falar com eles e garanti que os apoiaria para o resto da vida (dinheiro, ofertas, empregos, etc…) se eles continuassem a fazer passar os grandes negócios do Estado pelo Banco do meu avô.

Mas, tive azar: houve uma crise financeira internacional.

Deixou de haver crédito. Os juros subiram. Os credores queriam que o Grupo do meu avô pagasse a dívida.

E, além disso tudo, deixou de haver os grandes negócios do Estado.

Mas eu, que me achava um génio da finança e que já estava habituado a ser o dono disto tudo, não queria perder a minha posição de presidente do Banco do meu avô.

Tinha de arranjar uma solução. Fui à procura, e encontrei em África, quem tinha dinheiro sujo e não se importava de investir e deixar-me continuar a mandar e a ser dono disto tudo.

Continuemos a IMAGINAR coisas…

Resolvi então criar uma nova empresa: a “Rio do meu Avô” que passou a ser dona de 100% do capital da “Grupo do meu avô”, que era dona de 25% do “Banco do meu avô”. E eu que era dono disto tudo passei a ser o presidente disto tudo.

Fiz uns estatutos para o “Grupo do meu avô” que diziam que quem tivesse 25% mandava na empresa. Vendi 20% aos Angolanos e 55% na Bolsa. A “Rio do meu avô” ficou assim dona de 25% do “Grupo do meu avô” (mas mandava como se tivesse 100%). A “Grupo do meu avô”, dona de 25% do “Banco do meu avô” (mandava como se tivesse 100%).

Assim, a minha família já só tinha 5% (25% de 25%) do “Banco do meu avô” (mas eu continuava a mandar como se tivéssemos 100%). Já não havia dúvidas: eu era mesmo um génio da finança.

Com os 75 milhões da venda do “Grupo do meu avô” (aos Angolanos e na Bolsa), paguei uma parte da dívida. Mas, na verdade, ainda tínhamos uma dívida de 25 milhões (e continuávamos a não querer mexer no nosso dinheiro – esse continua bem guardado na América do Sul).

E, continuando a IMAGINAR coisas…

Mas as coisas continuaram a correr mal. Se calhar eu não sou assim tão grande génio da finança. Todos os nossos negócios dão prejuízo (até mesmo o Banco do meu avô). Raio de azar. Ainda por cima, a crise não acaba.

Fiz então o meu último golpe de génio. Convenci todos os bons clientes a comprarem ações do Banco do meu avô, para aumentar o capital sem ter de endividar mais a “Rio do meu avô” (e sem ter de tocar no dinheirinho da família, que continua bem guardado na América do Sul).

Mas os franceses queriam o dinheiro deles. Então, como presidente do Banco do meu avô, emprestei dinheiro deste ao Grupo do meu avô e à Rio do meu avô. Assim pagámos aos franceses. Mas ficámos com um problema: o Banco do meu avô está completamente arruinado.

Tinha de arranjar uma solução!

Fui falar com os novos políticos com uma proposta: reformo-me, dou lugares de Administração a uma série de políticos do partido do Governo e eles que resolvam o problema do Banco do meu avô.

Continuemos a IMAGINAR coisas…

Os políticos aceitaram a minha proposta (aceitam sempre que se fala de lugares de Administração).

Finalmente reformei-me. Ainda somos donos de 5% do Banco do meu avô e de uma série de outros negócios (sustentados pelas dívidas ao Banco do meu avô).

Tudo isto sem termos gasto um tostão (o dinheiro da família continua todo guardado na América do Sul).

E, tomei a última medida antes de me reformar: atribuí a mim próprio uma reforma de um milhão de euros por ano (para as despesas correntes).

E, assim, acabou a história IMAGINADA do Banco do meu avô.
**************
Se alguém teve a paciência de ler este texto até ao fim, deixo uma pergunta: Se esta história em vez de ser IMAGINADA, fosse verdadeira, que fariam ao neto?

Eu garantia-lhe um lugar no céu entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo

Portugal por António Lobo Antunes



Portugal
por António Lobo Antunes

Agora sol na rua a fim de me melhorar a disposição, me reconciliar com a vida.

Passa uma senhora de saco de compras: não estamos assim tão mal, ainda compramos coisas, que injusto tanta queixa, tanto lamento....

Isto é internacional, meu caro, internacional e nós, estúpidos, culpamos logo os governos.

Quem nos dá este solzinho, quem é? E de graça. Eles a trabalharem para nós, a trabalharem, a trabalharem e a gente, mal agradecidos, protestamos.

Deixam de ser ministros e a sua vida um horror, suportado em estoico silêncio. Veja-se, por exemplo, o senhor Mexia, o senhor Dias Loureiro, o senhor Jorge Coelho, coitados. Não há um único que não esteja na franja da miséria. Um único. Mais aqueles rapazes generosos, que, não sendo ministros, deram o litro pelo País e só por orgulho não estendem a mão à caridade.

O senhor Rui Pedro Soares, os senhores Penedos pai e filho, que isto da bondade as vezes é hereditário, dúzias deles.

Tenham o sentido da realidade, portugueses, sejam gratos, sejam honestos, reconheçam o que eles sofreram, o que sofrem. Uns sacrificados, uns Cristos, que pecado feio, a ingratidão.

O senhor Vale e Azevedo, outro santo, bem o exprimiu em Londres. O senhor Carlos Cruz, outro santo, bem o explicou em livros. E nós, por pura maldade, teimamos em não entender. Claro que há povos ainda piores do que o nosso: os islandeses, por exemplo, que se atrevem a meter os beneméritos em tribunal.
Pelo menos nesse ponto, vá lá, sobra-nos um resto de humanidade, de respeito.

Um pozinho de consideração por almas eleitas, que Deus acolherá decerto, com especial ternura, na amplidão imensa do Seu seio. Já o estou a ver:
- Senta-te aqui ao meu lado ó Loureiro
- Senta-te aqui ao meu lado ó Duarte Lima
- Senta-te aqui ao meu lado ó Azevedo
que é o mínimo que se pode fazer por esses Padres Américos, pela nossa interminável lista de bem-aventurados, banqueiros, coitadinhos, gestores, que o céu lhes dê saúde e boa sorte e demais penitentes de coração puro, espíritos de eleição, seguidores escrupulosos do Evangelho. E com a bandeirinha nacional na lapela, os patriotas, e com a arraia miúda no coração. E melhoram-nos obrigando-nos a sacrifícios purificadores, aproximando-nos dos banquetes de bem-aventuranças da Eternidade.

As empresas fecham, os desempregados aumentam, os impostos crescem, penhoram casas, automóveis, o ar que respiramos e a maltosa incapaz de enxergar a capacidade purificadora destas medidas. Reformas ridículas, ordenados mínimos irrisórios, subsídios de cacaracá? Talvez. Mas passaremos semdificuldade o buraco da agulha enquanto os Loureiros todos abdicam, por amor ao próximo, de uma Eternidade feliz. A transcendência deste acto dá-me vontade de ajoelhar à sua frente. Dá-me vontade? Ajoelho à sua frente indigno de lhes desapertar as correias dos sapatos.

Vale e Azevedo para os Jerónimos, já!
Loureiro para o Panteão já!
Jorge Coelho para o Mosteiro de Alcobaça, já!
Sócrates para a Torre de Belém, já! A Torre de Belém não, que é tão feia. Para a Batalha.

Fora com o Soldado Desconhecido, o Gama, o Herculano, as criaturas de pacotilha com que os livros de História nos enganaram. Que o Dia de Camões passe a chamar-se Dia de Armando Vara. Haja sentido das proporções, haja espírito de medida, haja respeito.


Estátuas equestres para todos, veneração nacional. Esta mania tacanha de perseguir o senhor Oliveira e Costa: libertem-no. Esta pouca vergonha contra os poucos que estão presos, os quase nenhuns que estão presos como provou o senhor Vale e Azevedo, como provou o senhor Carlos Cruz, hedionda perseguição pessoal com fins inconfessáveis.

Admitam-no. E voltem a pôr o senhor Dias Loureiro no Conselho de Estado, de onde o obrigaram, por maldade e inveja, a sair.

Quero o senhor Mexia no Terreiro do Paço, no lugar D. José que, aliás, era um pateta. Quero outro mártir qualquer, tanto faz, no lugar do Marquês de Pombal, esse tirano. Acabem com a pouca vergonha dos Sindicatos. Acabem com as manifestações, as greves, os protestos, por favor deixem de pecar.

Como pedia o doutor João das Regras, olhai, olhai bem, mas vêde. E tereis mais fominha e, em consequência, mais Paraíso. Agradeçam este solzinho.

Agradeçam a Linha Branca.

Agradeçam a sopa e a peçazita de fruta do jantar.

Abaixo o Bem-Estar.

Vocês falam em crise mas as actrizes das telenovelas continuam a aumentar o peito: onde é que está a crise, então? Não gostam de olhar aquelas generosas abundâncias que uns violadores de sepulturas, com a alcunha de cirurgiões plásticos, vos oferecem ao olhinho guloso? Não comem carne mas podem comer lábios da grossura de bifes do lombo e transformar as caras das mulheres em tenebrosas máscaras de Carnaval.

Para isso já há dinheiro, não é? E vocês a queixarem-se sem vergonha, e vocês cartazes, cortejos, berros. Proíbam-se os lamentos injustos.

Não se vendem livros? Mentira. O senhor Rodrigo dos Santos vende e, enquanto vender o nível da nossa cultura ultrapassa, sem dificuldade, a Academia Francesa.

Que queremos? Temos peitos, lábios, literatura e os ministros e os ex-ministros a tomarem conta disto.

Sinceramente, sejamos justos, a que mais se pode aspirar?

O resto são coisas insignificantes: desemprego, preços a dispararem, não haver com que pagar ao médico e à farmácia, ninharias. Como é que ainda sobram criaturas com a desfaçatez de protestarem? Da mesma forma que os processos importantes em tribunal a indignação há-de, fatalmente, de prescrever. E, magrinhos, magrinhos mas com peitos de litro e beijando-nos uns aos outros com os bifes das bocas seremos, como é nossa obrigação, felizes.

António Lobo Antunes

Portugal ganhava em quê?




E se o Mundial de Futebol fosse decidido não pelos golos mas sim por indicadores económicos e sociais? O Wall Street Journal respondeu ao desafio e listou os campeões demográficos, os geográficos e os demais.
Mais populoso: EUA (318 milhões de habitantes)
Mais Starbucks per capita: EUA (3,65 cafés por cada 100.000 habitantes)
Mais McDonalds per capita: EUA (4,48 restaurantes por cada 100.000 habitantes)
Mais florestas: Japão (67% do território nacional)
Mais chuva: Costa Rica (2,926 milímetros por ano)
Mais rural: Nigéria (83,7 do território)
Mais urbano: Bélgica (98 da população vive em zonas urbanas)
Mais elevado: Argentina (6,960 metros – a altura do Monte Aconcágua)
Mais mortes no trânsito: Irão (34,1 mortes por cada 100.000 habitantes)
Mais homicídios: Honduras (90,4 por cada 100.000 habitantes)
Menos homicídios: Japão (0,3 por cada 100.000 habitantes)
Mais desemprego: Bósnia (44,3%)
Menos desemprego: Suíça (2,9%)
Maior riqueza per capita: EUA (53.101 dólares)
Menor riqueza per capita: Costa do Marfim (1.818 dólares)
Maior investimento na educação: Gana (8,1% do PIB)
Mais prémios Nobel per capita: Suíça (3,1 por milhão de habitantes)
Mais obeso: EUA (33% da população)
Mais alcoólico: Rússia (15,1 litros por pessoa por ano)
Mais fumador: Grécia (2795 cigarros por adulto por ano)
Mais católico: Portugal (92% da população)

A Suiça seria a grande e merecida vencedora do mundial!
Nós somos um país de crentes, estamos à espera do Messias que nos vai salvar do FMI, da Troika, do BPN, etc etc por isso não mexemos uma palha. E como estamos também à espera do castigo divino, não sentimos remorsos por eleger os mesmos corruptos há 40 anos, porque um dia o Messias aparecerá a meio de um qualquer mandato, e os castigará. E nós, continuaremos como bons cristãos, a dar a outra face e a oferecer os nossos filhos em sacrifício.
Mas não ficamos por aqui, graças também à nossa capacidade de acreditar em contos do vigário, também acreditamos em partidos corruptos. Queremos mais BPN´s, mais BES, mais pedidos de resgate, mais dividas...

Porque será que os países mais fanáticos por futebol e religiões são os mais corrompidos e pobres? Será coincidência?
Brasil, Argentina, Portugal, Espanha, etc... já para nem falar nos países cegos e fanáticos por religiões tipo os muçulmanos, que esses vivem atolados na corrupção e entretidos em conflitos armados.
Será que as pessoas que acreditam em tudo, incluindo em religiões, também acreditam em políticos, nas suas promessas e nas suas juras de inocência e boas intenções?
Será que é porque as pessoas sentem necessidade de pertencer e acreditar em grupos, para não terem que pensar, decidir ou agir por si? Porque assim alguém agirá por eles? Todos precisam de pertencer a um clube, a uma religião, a um partido, a seitas, a rebanhos?
Será porque preferem seguir as ideias as tendências e os ideais de alguém, do que ter o trabalho de pensar por elas e criar o seu próprio caminho?
Sem um povo atento, interessado, cívico, informado, capaz de julgar, criticar e procurar a verdade... os políticos e corruptos fazem o que querem do país e dos impostos, na maior da tranquilidade confiantes que o povo continua incapaz de fazer um julgamento critico e ajustado.
A impunidade promove o crime.

Curioso que.... A este propósito encontrei estudos que podem explicar o estado caótico, de Portugal
-"Ateus são mais inteligentes do que religiosos?" fonte
-"Neurocientista afirma que a religiosidade poderia ser tratada como doença mental" fonte
Noticia em inglês.
Os países menos corruptos do mundo são os menos crentes e mais informados?
Deixo-os, para terminar, com estes dados sobre a educação em Portugal, que ajuda a perceber mais alguns fenómenos, aparentemente sem explicação.
A justiça social na Suiça
A verdadeira democracia na Suécia
Um SNS eficaz na Inglaterra

domingo, 20 de julho de 2014

Este, o país que temos - Avaliação da FCT definia à partida que metade dos centros de investigação ficaria pelo caminho

Quase 170 centros de investigação foram eliminados na primeira fase da avaliação


TERESA FIRMINO e SAMUEL SILVA
18/07/2014

Quase 40% dos laboratórios avaliados contestaram as suas classificações junto da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT). Metade ficou sem ou quase sem dinheiro para os próximos cinco anos. Esta sexta-feira também se soube o teor dos contratos com entidades estrangeiras responsáveis pelo processo.

A avaliação em curso pela FCT definia mesmo antes de arrancar que cerca de metade dos 322 centros de investigação portugueses seria afastada da fase seguinte do processo, onde vão estar em jogo a maior parte dos 50 milhões de euros anuais que os laboratórios vão ter para despesas correntes entre 2015 e 2020. É o que está escrito no contrato que a Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) estabeleceu com a European Science Foundation (ESF), à qual delegou a organização da avaliação dos laboratórios, e que foi tornado público esta sexta-feira à tarde pela fundação portuguesa que financia a ciência.

“Um montante fixo de 109.592 euros é acordado para a segunda fase, com base nos seguintes pressupostos: número de unidades de investigação seleccionadas para a fase 2: 163”, lê-se no acordo assinado entre a FCT e a ESF no início de Abril deste ano. Mais à frente, lê-se ainda: "A primeira fase da avaliação irá resultar numa shortlist de metade das unidades de investigação que serão selecionadas para seguir para a fase 2."

De facto, transitaram para a segunda fase 168 unidades de investigação e ficaram de fora 154, que vão ficar à míngua de dinheiro para despesas correntes nos próximos cinco anos. Estes resultados desencadearam uma onda de protestos públicos e que também se traduziu na contestação formal das classificações pelos próprios centros de investigação junto da FCT: até 11 de Julho, quando terminou o prazo legal para apresentar reclamações, 128 das 322 unidades avaliadas tinham contestado os resultados. Ou seja, quase 40%.

Nas últimas semanas, tinham-se multiplicado os pedidos de divulgação dos acordos entre a FCT e a Elsevier – responsável pela recolha de dados bibliométricos utilizada na avaliação –e a ESF, que coordenou o processo. Depois de dias de resistência, a fundação que atribui fundos públicos ao sistema científico acedeu finalmente. Os contratos que mostram que a avaliação custa aos seus cofres portugueses quase 400 mil euros. Segundo a FCT, a avaliação anterior, em 2007, que tinha envolvido as 378 unidades de investigação existentes na altura, custou cerca de 1,6 milhões de euros.

A fatia mais pequena destes 400 mil euros destina-se à Elsevier (70 mil euros). Já a ESF vai receber mais de 312 mil euros, aos quais acrescem ainda os custos das viagens dos avaliadores a Portugal durante a segunda fase do processo, que vai decorrer nos próximos tempos e que, de acordo com o contrato, são assumidos directamente pela FCT.

A suspeita de que existia uma quota pré-definida para os centros que passariam à segunda fase da avaliação já corria entre a comunidade científica, depois de terem sido divulgados os resultados na primeira do processo, no final de Junho. Esta cláusula do contrato agora conhecida sugere que a FCT tinha definido um limiar de centros de investigação cuja passagem à segunda fase era, pelo menos, esperada.

Alguns avaliadores externos anónimos tinham deixado transparecer nos seus relatórios de avaliação, e que foram entregues aos centros, que receberam indicações para baixar certas notas por causa da existência de quotas. Esta acusação foi refutada pelo presidente da FCT, Miguel Seabra, na entrevista que deu ao PÚBLICO na quarta-feira (publicada agora nestas páginas), considerando-o “totalmente descabida”.

Esta sexta-feira, após a divulgação dos contratos, o PÚBLICO questionou novamente a FCT sobre a definição prévia de uma quota de sucesso. A fundação, através da sua porta-voz Ana Godinho, justifica que aquele valor dos 163 centros era apenas “uma estimativa” feita com base na avaliação de 2007: “[Nessa altura] cerca de 50% das unidades teve Mau, Razoável ou Bom.”

Em 2007, as notas eram Mau (Insuficiente), Razoável, Bom, Muito Bom e Excelente. Neste momento, a classificação passou a inclui como nível superior, o Excepcional, pelo que o Bom implica agora quase não ter direito a financiamento para despesas de base. Portanto, o Bom já não é bom.

Voltando ao contrato, o mesmo estabelece também que ESF recebe 202.602 euros pela primeira fase de avaliação, terminada no mês passado. Aquela entidade também esteve debaixo de fogo, sendo criticada pela sua falta de experiência neste tipo de avaliações. Contactada pelo PÚBLICO, fonte do organismo europeu respondeu a essa questão com o envio de uma brochura sobre a sua actividade recente, onde informa que está neste momento a avaliar o funcionamento da homóloga da FCT na Hungria, depois de nos últimos anos ter feito o mesmo para organismos semelhantes da Lituânia, Eslovénia e Bulgária. Mas nas informações oficiais enviadas, em nenhum momento consta a elaboração de um processo semelhante ao português, com a avaliação de laboratórios de investigação e do sistema científico nacional, com o intuito de estabelecer as bases do financiamento estatal numa base plurianual.

Carlos Fiolhais, um cientista bem conhecido, que tem sido um dos rostos principais protestos da comunidade científica nos últimos tempos, no blogue de que é um dos fundadores, o De Rerum Natura, comenta assim o número pré-definido no contrato de unidades que passariam à segunda fase: “Muito grave será se se confirmar que a FCT deu indicações aos painéis de avaliação para eliminar 50% dos centros em todas as áreas. Por que razão para lá dos 50% os centros passam subitamente a deixar de ter qualidade necessária para serem financiados por dinheiros públicos?”

O físico defende também que estes resultados “significam, de facto, a morte de quase metade das unidades de investigação do país”. Fiolhais refere-se às 71 unidades de investigação classificadas com Insuficiente ou Razoável e que, por isso, não vão ter qualquer dinheiro para funcionamento de base. E ainda às 83 unidades que tiveram Bom e que também não passam à segunda.

“Isto significa encerrar centros de investigação produtivos, apenas porque não cabem nas quotas arbitrariamente definidas. Significa uma ciência mais pequena, mais provinciana, com o poder mais concentrado, mais semelhante à ciência do Estado Novo. A investigação em Portugal ficará restrita a um clube mais reduzido”, critica.

Outro nome forte da ciência em Portugal, Manuel Sobrinho Simões, presidente do Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto (Ipatimup), também criticou ao PÚBLICO a avaliação, ainda antes da divulgação dos contratos. Entende que o processo está “minado” pela “desconfiança e falta de transparência” e pela falta de confiança dos cientistas na actual direcção da FCT”.

Para Sobrinho Simões, a avaliação teve “o propósito de destruir o tecido institucional criado nos últimos 20 anos, na convicção de que do deserto brotarão génios”.

A ideia de excelência
Uma opinião em contracorrente vem de António Coutinho, imunologista de renome e ex-director do Instituto Gulbenkian de Ciência de Oeiras, também falou com o PÚBLICO horas antes da divulgação dos contratos. “É a primeira vez em Portugal que se faz uma avaliação totalmente isenta e transparente: todas as unidades foram avaliadas no mesmo processo, sem distinção”, sustentou.

Coutinho, que também é coordenador do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia – mas que falou a título individual –, elogia ainda facto de a FCT não ter escolhido os avaliadores e ter confiado o processo a uma “entidade externa respeitável”. Na área que melhor conhece, a das ciências da vida e saúde, garante não ter visto nenhuma avaliação mal feita. Mas os erros, defende, são “naturais” num processo como este. “Por isso há os recursos”.

A onda de contestação pública dos últimos dias preocupa António Coutinho, que diz temer que a FCT “acabe por não levar a sério esta avaliação”. Até porque, entende, o sistema científico português precisa de alterações: “A mudança tem de ser feita com jeito, com cuidado. Mas alguma coisa tem de ser feita”.

Mas até que ponto a ciência do país já está pronta para apostar quase só na excelência? “A excelência costuma gerar excelência”, responde António Coutinho. “Por outro lado, a mediocridade gera sempre mediocridade. Nunca sai excelência. Usar dinheiro público para apoiar a mediocridade é sempre uma má política.”

Arsélio Pato de Carvalho, fundador no final dos anos 1980 da instituição que hoje é o Centro de Neurociências e Biologia Celular de Coimbra, actual Provedor do Bolseiro, discorda desta visão: “O que se está atentar fazer é apoiar exclusivamente unidades de excelência. Sempre fui pela excelência, mas não podemos ter só excelência. “Imagine um cientista excelente, mas tudo à sua volta está seco. Tem um oásis num deserto”, ilustra.

Universidades querem ser ouvidas
A contestação das últimas semanas saltou fronteiras e chegou à revistaNature, à agência de notícias de ciência europeia Alpha Galileo e à revsitaPhysics World, publicação do Instituto de Física britânico. E teve também reflexos políticos, com a Fenprof a exigir que o Governo recue no processo, o partido Livre a defender que as unidades anteriormente classificadas com Excelente ou Muito Bom “apenas possam ser excluídas da segunda fase do processo de avaliação mediante a demonstração de falta grave”, e o PCP a requerer uma audição parlamentar à secretária de Estado da Ciência, Leonor Parreira.

A organização do sistema científico nacional está intimamente ligada às instituições de ensino superior, às quais está por sua vez ligadas a esmagadora maioria dos centros de investigação. Ana Costa Freitas, reitora da Universidade de Évora, defende que a avaliação da FCT devia ter tido o cuidado de perceber “o impacto que tem na estratégia das instituições de ensino superior”. A universidade – que viu mais de 40% dos seus laboratórios serem chumbados – perdeu “centros fundamentais para o desenvolvimento da sua investigação”.

“Há um divórcio profundo entre a FCT e as universidades”, concorda o vice-reitor da Universidade de Coimbra, Amílcar Falcão. Este responsável considera que seria “inaceitável” se se concluísse que este processo foi condicionado pelas disponibilidades de financiamento da FCT. “A avaliação científica deve ser séria. Os que são excelentes não podem ser carimbados com um rótulo de suficiente só porque não há dinheiro suficiente para lhes dar”, aponta.

Esta semana, o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos também expressou a sua “apreensão e grande preocupação” com este processo, que “coloca em causa o futuro” dos centros de investigação. Nos próximos dias, o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas também deverá pronunciar-se. A avaliação vai continuar a dar que falar e os olhares irão certamente escrutinar o contrato agora divulgado.

terça-feira, 15 de julho de 2014

Livro sobre Salgado relata influência do "Dono Disto Tudo" na política e nos negócios




O livro O Último Banqueiro relata a liderança de Ricardo Salgado no Banco Espírito Santo (BES) e o modo como o banqueiro conhecido como "Dono Disto Tudo" esteve envolvido nalgumas das mais importantes decisões tomadas no país, como a entrada da troika.

O último banqueiro -- ascensão e queda de Ricardo Salgado, das jornalistas Maria João Babo e Maria João Gago, do Jornal de Negócios, lançado esta terça-feira, não é um retrato pessoal, mas permite conhecer o homem que esteve à frente do BES mais de 20 anos.

Sobrinho-neto do fundador do banco, Salgado foi escolhido para liderar a área financeira do Grupo Espírito Santo (GES) em 1991, chegando a essa posição pouco antes da primeira fase de privatização do BES, em que a família queria recuperar o banco depois de ter perdido quase tudo com as nacionalizações de 1975. Em Abril de 1992, já com a família com uma posição de relevo no banco, Ricardo Salgado sobe a presidente executivo do BES.

Ao longo de duas décadas, foi "sob a liderança de Ricardo Salgado que o banco da família Espírito Santo se tornou o terceiro maior de Portugal", com o banqueiro a centrar em si cada vez mais poder, decidindo os negócios da família – apesar dos cinco ramos que constituem o clã –, mas também influenciando decisivamente a vida nacional.

Depois de meses a dizer que não acreditava numa intervenção do FMI em Portugal, em Abril de 2011, a declaração de Ricardo Salgado ao então ministro das Finanças Teixeira dos Santos – "É imperioso pedir ajuda, estamos numa situação limite" – terá levado o governante a "perceber naquele momento que tinha de agir", lê-se no livro.

O presidente de um dos grandes bancos nacionais também disse às autoras que, a propósito da intervenção externa, "com o primeiro-ministro só Ricardo Salgado terá falado", acrescentando que "José Sócrates ouvia-o mais do que aos outros banqueiros".

Episódios que mostram como Ricardo Salgado sempre soube gerir as relações com o poder político. Perante a acusação de que o BES é o banco do regime, o banqueiro responde: "É o banco de todos os regimes".

Apesar da relação exímia com todos os governos, "com nenhum outro primeiro-ministro [Salgado] teve uma relação tão próxima como com José Sócrates", lê-se no livro, que constata as posições próximas em vários temas, como o fomento da economia pelas grandes obras públicas.

Salgado também elogiou por várias vezes o executivo de Passos Coelho, mas a relação teve percalços, caso do recado enviado pelo ex-ministro das Finanças Vítor Gaspar, em Junho de 2013. "Vítor Gaspar entrou na reunião com a Associação Portuguesa de Bancos a pés juntos: 'Se eu fizesse declarações sobre a dívida do BES tinha muito a dizer', avisou, num tom claro, duro e incisivo, perante os 15 responsáveis convocados para o encontro no Ministério das Finanças", contam as autoras.

O governante tinha ficado incomodado com as declarações de Salgado sobre a sustentabilidade da dívida de Portugal. Apesar de Salgado não estar na reunião, sendo representado pelo seu braço direito, Amílcar Morais Pires, a mensagem de censura chegou-lhe rapidamente e levou-o a ligar ao então ministro a explicar-se.

Quanto ao mundo empresarial, o livro conta como o BES esteve envolvido na internacionalização da Portugal Telecom (PT) para o Brasil, na Oferta Pública de Aquisição (OPA) da Sonaecom sobre a PT (que levou o presidente da Sonae a dizer que o insucesso da operação foi a vitória dos "bloqueadores do progresso, de uma instituição que tem uma longa história de relações especiais com quase todos os governos") e contribuiu para a emergência da Ongoing, o grupo de Nuno Vasconcellos.

Casado, pai de três filhos e avô de seis netos, Salgado é tido como workaholic(dependente do trabalho): "Vive para um banco, quase não pensa em mais nada", confidenciou um ex-administrador.

O livro recorda ainda amigos e aliados de Salgado, como Mário Soares, que se empenhou no regresso de famílias como a Espírito Santo a Portugal, ou Francisco Balsemão, que nos anos 1990 chegou a levar o banqueiro a reuniões do grupo de Bilderberg, que junta a elite política e empresarial mundial, antes de se zangarem e esfriarem a relação.

Questionado em 2012 por um jornalista sobre a continuação da liderança do BES, Salgado respondeu que estava sempre à disposição dos accionistas, mas acrescentou: "Sinto-me óptimo, faço ginástica três vezes por semana e emagreci depois das férias".

Então o banqueiro podia gabar-se de o BES ser o único dos grandes bancos portugueses a não ter recorrido ao dinheiro público, apesar das exigências colocadas à banca pela troika e do prejuízo de 2011.

Mas o poder inabalável estava a chegar ao fim. Os casos judiciais em que a família se via envolvida, como as operações Furacão e Monte Branco e os casos dos submarinos e Portucale, fragilizaram a reputação, assim como as rectificações de IRS feitas por Salgado, que se terá "esquecido" de declarar 8,5 milhões de euros recebidos pelo construtor José Guilherme por consultoria para negócios em Angola, em 2011. O banqueiro desmentiu sempre que viessem de comissões e, segundo relatam as autoras, justificou no Banco de Portugal e na justiça ter recebido, afinal, 14 milhões de euros num acto de carácter espontâneo.

Em paralelo, começaram a vir a público os problemas no BES Angola e as más relações com Álvaro Sobrinho, que em tempos foi seu delfim, o azedar das relações com o aliado Pedro Queiroz Pereira (dono da Semapa), a luta pela liderança do grupo com o primo José Maria Ricciardi e os problemas de endividamento e irregularidades detetados em empresas do GES.

Aos 70 anos, Ricardo Salgado deixa a liderança do BES, para, como dizem as autoras, "salvar a família de si própria". A presidência do banco será assumida pelo economista Vitor Bento.

terça-feira, 8 de julho de 2014

Quem é agora o encornado?




07 Julho 2014, 20:30 
por Alexandra Machado

Quando em Fevereiro de 2010, a "Visão" questionou Henrique Granadeiro sobre o que o presidente da PT sentiu ao descobrir que dois dos seus administradores (Rui Pedro Soares e Soares Carneiro) estavam a ser ligados a um alegado plano do Governo para controlar a comunicação social, a resposta estoirou: "Encornado!".

É essa mesma palavra que vou, por estes dias, recordando.

A PT subscreveu 900 milhões de euros em papel comercial da Rioforte, uma empresa ligada à família Espírito Santo. E ainda que não seja ilegal, é, no mínimo, questionável. Quantas vezes a PT investiu 900 milhões numa única aplicação? E quantas vezes o fez numa empresa não financeira não cotada e ligada a um dos accionistas? E porque o fez? Muitas perguntas. Nenhuma resposta satisfatória.

A Portugal Telecom opta por dizer que confia nos conselhos que o BES, enquanto seu banco privilegiado, faz. Também opta por atribuir um racional financeiro à aplicação, falando dos juros fantásticos para uma aplicação destas.

Nada disto parece fazer sentido, sabendo-se, ainda para mais, que a Rioforte tem risco. Um risco que a PT não pode estar disposta a correr. Nem pelo seu accionista histórico. A PT era das principais empresas cotadas. O que acontecerá se a Rioforte não pagar? O que acontecerá mesmo que a Rioforte pague? Prestou a PT todas as informações aos seus accionistas? Não devia este investimento ter sido tratado de outra forma?

Quando a PT fez um investimento de 75 milhões em fundos da Ongoing houve demissões e alteraram-se as regras relacionadas com as partes relacionadas. Regras que agora foram contornadas. Tudo isto é normal? Quem é que se deve sentir agora encornado?

Jornalista

segunda-feira, 7 de julho de 2014

Marcelo, Miguel, o BES e nós



JOÃO MIGUEL TAVARES

01/07/2014


É destes pequenos segredos que vive o regime que nos trouxe até aqui.

Pergunta do milhão de euros: como é possível que um caso com a dimensão do BES só se conheça agora? Como é possível que nós, gente dos jornais e da comunicação social, tenhamos tido ao longo dos anos notícia de tantas pontas soltas – basta ver o número de casos em que o banco esteve envolvido –, mas ninguém tenha sido capaz de unir as várias pontas e perceber aquilo que realmente se estava a passar?

A resposta é óbvia: porque a família Espírito Santo é demasiado grande e o país demasiado pequeno. Enquanto a família esteve unida, formou um bloco inexpugnável, pela simples razão de que o seu longo braço chegava a todo o lado, incluindo partidos (alguém já ouviu António José Seguro, sempre tão lesto a dar palpites sobre tudo, comentar o caso BES?), comunicação social (quem não se recorda do corte de relações com o grupo Impresa em 2005, na sequência de notícias sobre o envolvimento do BES no caso Mensalão?) e até aos próprios comentadores, por via das relações pessoais que Ricardo Salgado mantém com gente tão influente quanto Marcelo Rebelo de Sousa ou Miguel Sousa Tavares.

Ora, ninguém à face da terra possui uma independência inexpugnável. Isso não significa que todos tenhamos um preço – significa apenas que somos condicionados por relações de amizade ou de sangue e que nesse campo uma família de 300 membros, que há décadas se move na alta sociedade portuguesa como peixe na água, acaba por chegar a quase toda a gente que interessa. O próprio Sousa Tavares referiu essas ligações há um ano, numa entrevista à Sábado: “O Ricardo Salgado é sogro da minha filha e avô de netos meus. Além disso, somos amigos há muitos anos, porque eu fui casado com uma prima direita dele. Nunca o critiquei e nunca o elogiei, porque acho que não se fala da família em público.” Pode apontar-se a Miguel Sousa Tavares muita coisa – eu já o fiz –, mas não falta de independência ou coragem. Simplesmente, quando o caso BES atinge esta dimensão, o silêncio de alguém com a sua importância torna-se efectivamente um favor a Salgado. Não há como fugir a isso.

Mas se Sousa Tavares não fala sobre o tema e já justificou porquê, o mais influente comentador português – Marcelo Rebelo de Sousa – necessita urgentemente de aproveitar algum do seu tempo dominical para fazer a sua declaração de interesses em relação aos Espírito Santo. E essa declaração é tanto mais premente quanto nas últimas semanas tem vindo a defender a solução Morais Pires, considerando até que a impressionante queda das acções do BES na passada semana era coisa “inevitável”, visto estarmos perante “um novo ciclo”. Que essa queda tenha acontecido exactamente por não estarmos perante um novo ciclo parece não ter passado pela sua cabeça, habitualmente tão veloz e atenta.

Não admira, pois, que Nicolau Santos tenha chamado a atenção no Expressopara o facto de Marcelo e Ricardo Salgado já terem passado juntos “várias vezes férias no Mediterrâneo”. E já agora – acrescento eu – que Rita Amaral Cabral, há longuíssimos anos companheira de Marcelo, como é público, seja actualmente administradora não executiva do BES, e, entre 2008 e 2012, um dos três membros da comissão de vencimentos do banco. Marcelo, como todos sabemos, nunca teve quaisquer problemas em criticar aqueles que lhe são próximos. Mas há factos que devem ser verbalizados – porque é precisamente destes pequenos segredos que vive o regime que nos trouxe até aqui.