quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

A estranha intrusa..

UMA ESTRANHA VERDADE:

Alguns anos depois que nasci, o meu pai conheceu uma estranha, recém-chegada à nossa pequena cidade.

Desde o princípio,o meu pai ficou fascinado com esta encantadora personagem e, em seguida, convidou-a a viver connosco.

A estranha aceitou e, desde então, tem-se mantido na nossa casa.

Enquanto eu crescia, nunca perguntei sobre o seu lugar na minha família; na minha mente jovem já tinha um lugar muito especial...
Os meus pais passara a ser instrutores complementares...a minha mãe ensinou-me o que era bom e o que era mau, e o meu pai me regras para viver em sociedade.

Mas a estranha era nossa narradora...

Mantinha-nos enfeitiçados por horas com aventuras, mistérios e comédias.
Ela tinha respostas para qualquer coisa que quiséssemos saber de política, história ou ciência.
Conhecia tudo do passado, do presente e até podia predizer o futuro!
Levou a minha família ao primeiro jogo de futebol.
Fazia-me rir, fazia-me chorar...
A estranha nunca parava de falar, mas o meu pai não se importava e mantinha-se colado á estranha.
Às vezes, a minha mãe levantava-se muito cedo e calada, enquanto o resto de nós ficava escutando o que tinha que dizer, mas só ela ia à cozinha para ter paz e tranquilidade. (Agora pergunto-me se ela teria rezado alguma vez para que a estranha fosse embora).
O meu pai dirigia o nosso lar com certas convicções morais, mas a estranha nunca se sentia obrigada a honrá-las...
As blasfémias, os palavrões, por exemplo, não eram permitidos em nossa casa… nem por parte nossa, nem dos nossos amigos ou de qualquer um que nos visitasse.

Entretanto, a nossa visitante de longo prazo usava sem nenhum entrave a sua linguagem inapropriada que às vezes queimava os meus ouvidos e que fazia o meu pai se retorcer e a minha mãe se ruborizar.

O meu pai nunca nos deu permissão para beber álcool. Mas a estranha incentivou-nos permanentemente a experimentar pois iriamos desfrutar das alegrias do Mundo.

Fez com que o cigarro parecesse fresco e inofensivo, e que os charutos e os cachimbos fossem distinguidos.

Falava livremente (talvez demasiado) sobre sexo e violencia. Os seus comentários eram às vezes evidentes, outras sugestivos, e geralmente reprováveis.
Agora sei que os meus conceitos sobre relações humanas foram influenciados fortemente durante a minha adolescência pela estranha.
Repetidas vezes a criticaram, mas ela nunca fez caso aos valores de ninguem, mesmo assim, permaneceu em nosso lar.
Passaram-se mais de cinquenta anos desde que a estranha veio para dentro da nossa família. Desde então mudou muito; já não é tão fascinante como era no princípio.

Não obstante, se hoje você pudesse entrar na guarida dos meus pais, ainda a encontraria sentada no seu canto, esperando que alguém quisesse escutar as suas conversas ou dedicar o seu precioso tempo livre a fazer-lhe companhia...
O seu nome? Ah. o seu nome…

Chamamos-lhe TELEVISÃO!

Agora ela tem um marido que se chama Computador, um filho que se chama Telemóvel e um neto de nomeTablet,mas pior do que todos estes tem um parente chamado telemovel...!

A estranha agora tem uma família....reproduziu-se!

A nossa será que ainda existe?!

O trauma da morada

Por Miguel Esteves Cardoso

"Um dos grandes problemas da nossa sociedade é o trauma da morada. Por exemplo, há uns anos, um grande amigo meu, que morava em Sete Rios, comprou um andar em Carnaxide.
Fica pertíssimo de Lisboa, é agradável, tem árvores e cafés. Só tinha um problema. 


Era em Carnaxide.
Nunca mais ninguém o viu.
Para quem vive em Lisboa, tinha emigrado para a Mauritânia!
Acontece o mesmo com todos os sítios acabados em -ide, como Carnide e Moscavide. Rimam com Tide e com Pide e as pessoas não lhes ligam pevide.
Um palácio com sessenta quartos em Carnide é sempre mais traumático do que umas águas-furtadas em Cascais. É a injustiça do endereço.
Está-se numa festa e as pessoas perguntam, por boa educação ou por curiosidade, onde é que vivemos. O tamanho e a arquitectura da casa não interessam. Mas morre imediatamente quem disser que mora em Massamá, Brandoa, Cumeada, Agualva-Cacém, Abuxarda, Alfornelos, Murtosa, Angeja… ou em qualquer outro sítio que soe à toponímia de Angola.
Para não falar na Cova da Piedade, na Coina, no Fogueteiro e na Cruz de Pau. (...)
Ao ler os nomes de alguns sítios – Penedo, Magoito, Porrais, Venda das Raparigas, compreende-se porque é que Portugal não está preparado para estar na Europa.
De facto, com sítios chamados Finca Joelhos (concelho de Avis) e Deixa o Resto (Santiago do Cacém), como é que a Europa nos vai considerar?
Compreende-se logo que o trauma de viver na Damaia ou na Reboleira não é nada comparado com certos nomes portugueses.
Imagine-se o impacte de dizer "Eu sou da Margalha" (Gavião) no meio de um jantar.
Veja-se a cena num chá dançante em que um rapaz pergunta delicadamente "E a menina de onde é?", e a menina diz: "Eu sou da Fonte da Rata" (Espinho).
Já para não falar em “Picha”, no concelho de Pedrógão Grande e de “Rata”, em Arruda dos Vinhos, Beja, Castelo de Paiva, Espinho, Maia, Melgaço, Montemor-o-Novo, Santarém, Santiago do Cacém e Tondela.
Temos, assim, em Portugal, uma “Picha” para 11 “Ratas”. O que vale é que mesmo ao lado da “Picha”, temos a “Venda da Gaita”...
E ainda existe “Colhões”, perto de Coimbra,
E suponhamos que, para aliviar, o senhor prossiga, perguntando "E onde mora, presentemente?", Só para ouvir dizer que a senhora habita na Herdade da Chouriça (Estremoz).
É terrível. O que não será o choque psicológico da criança que acorda, logo depois do parto, para verificar que acaba de nascer na localidade de Vergão Fundeiro?
Vergão Fundeiro, que fica no concelho de Proença-a-Nova, parece o nome de uma versão transmontana do “Garganta Funda”.
Aliás, que se pode dizer de um país que conta não com uma Vergadela (em Braga), mas com duas, contando com a Vergadela de Santo Tirso?
Será ou não exagerado relatar a existência, no concelho de Arouca, de uma Vergadelas?
É evidente, na nossa cultura, que existe o trauma da "terra".
Ninguém é do Porto ou de Lisboa.
Toda a gente é de outra terra qualquer. Geralmente, como veremos, a nossa terra tem um nome profundamente embaraçante, daqueles que fazem apetecer mentir.
Qualquer bilhete de identidade fica comprometido pela indicação de naturalidade que reze Fonte do Bebe e Vai-te (Oliveira do Bairro).
É absolutamente impossível explicar este acidente da natureza a amigos estrangeiros ("I am from the Fountain of Drink and Go Away...").
Apresente-se no aeroporto com o cartão de desembarque a denunciá-lo como sendo originário de Filha Boa.
Verá que não é bem atendido. Não há limites. Há até um lugar chamado Cabrão, no concelho de Ponte de Lima !!!
Urge proceder à renomeação de todos estes apeadeiros.
Há que dar-lhes nomes civilizados e europeus, ou então parecidos com os nomes dos restaurantes giraços, tipo : Não Sei, A Mousse é Caseira, Vai Mais um Rissol. (...)
Também deve ser difícil arranjar outro país onde se possa fazer um Percurso que vá da Fome Aguda à Carne Assada (Sintra) passando pelo Corte Pão e Água (Mértola), sem passar por Poriço (Vila Verde), e acabando a comprar rebuçados em Bombom do Bogadouro (Amarante), depois de ter parado para fazer um chichi em Alçaperna (Lousã).

terça-feira, 24 de janeiro de 2017

A culpa não é da Rússia

Viriato Soromenho Marques
04 DE JANEIRO DE 2017


Ao suspender a retaliação diplomática contra os EUA, anunciada pelo seu ministro Sergei Lavrov, Putin revela que as leis da cinemática, aplicadas nas artes marciais, também servem na política internacional. Obama decidiu expulsar 35 diplomatas russos por alegada interferência nas eleições presidenciais norte-americanas. Ao não aplicar o clássico princípio da reciprocidade, que levaria à expulsão de 35 diplomatas norte-americanos, Putin agiu como se estivesse num combate de karaté, fazendo que o ainda presidente americano se estatelasse no chão, desequilibrado pelo facto de o seu próprio impulso não ter encontrado resistência.

Se é verdade que Trump é o mais atípico presidente-eleito da história norte-americana, Obama parece destinado a uma das mais desastradas saídas de cena. A sua russofobia é um sinal de profunda fraqueza. Primeiro, um estadista não confunde a política eleitoral e partidária com a política externa. Admitir que os russos podem ter mudado a trajetória eleitoral em novembro de 2016, é uma confissão pública de fragilidade da democracia americana, inadmissível em alguém que já ensinou direito constitucional. Segundo, se é verdade que os russos, ou quaisquer outros serviços estrangeiros, têm acesso a informações domésticas delicadas, um verdadeiro estadista faz rolar cabeças nos serviços de segurança, como já deveria ter sido o caso quando a chanceler Merkel descobriu que os aliados de Washington gostavam tanto de si que não se cansavam de lhe escutar todas as conversas telefónicas. Terceiro, a inação de Putin, acentuou a situação de lame duck (pato manco) em que Obama se encontra. Putin mostrou não querer perder tempo com quem vai sair de jogo no dia 20 de janeiro.

Mas o modo como a Rússia está a ser objeto daquilo que em psicologia se denomina "atribuição causal externa" não se limita aos EUA. A próxima vaga de eleições decisivas para o futuro europeu (Holanda, França e Alemanha) arrisca-se a ser marcada pela sombra da "interferência russa". Mais uma vez trata-se de um claro sintoma de fraqueza. Não foi a Rússia que conduziu a UE para a agonia lenta de uma união monetária onde uma parte significativa dos Estados integrantes se sente como num avião capturado por piratas do ar. Um sítio muito desagradável, mas do qual não se pode sair sob pena de morte certa. Não foi a Rússia que armou fundamentalistas islâmicos no Afeganistão e na Bósnia, as escolas dos terroristas que hoje flagelam o Ocidente. Não foi a Rússia que iniciou esta vaga ingovernável de sofrimento humano, traduzida nas multidões rompendo as fronteiras da Europa em 2015, forçando a UE a acordos com Ancara que nos envergonham. Foram G.W. Bush e Blair com a ignóbil invasão do Iraque, em 2003. Foram Sarkozy e Cameron, com a cumplicidade de uma NATO que há muito entrou em roda livre, derrubando e assassinando Kadafi (com quem a UE tinha assinado em 2010 um positivo acordo sobre refugiados). Foi o próprio Obama, deixando Hillary Clinton ensarilhar-se, ao lado de Hollande e Cameron, no caos da Líbia e no inferno da Síria.

Putin, olhando no espelho dos czares, representa os interesses permanentes de uma Rússia determinada a quebrar um longo ciclo de declínio. Mas a Rússia, além do seu arsenal nuclear, só vale 10% do PIB da UE e tem pouco mais de um quarto da população dos 28! A Rússia só mete medo a uma Europa à deriva, governada por líderes imaturos, que não sabem quem são, quem representam, nem para onde devem ir

Precisamos de rugas

João Adelino Faria 03.10.2014 /

Só há bem pouco tempo percebi que estou a envelhecer. Acontece a todos, eu sei, mas um olhar mais atento ao espelho revelou-me inesperadamente a inevitabilidade. Pela primeira vez vi a verdadeira cor dos meus cabelos brancos. Algo que já lá está há algum tempo mas que os meus amigos têm disfarçado dizendo-me que são apenas sinais de charme. Não são! São sinais de envelhecimento. E porque é que isso tem que ser mau?

A notícia foi dada como uma tragédia nacional esta semana. Portugal é dos países com maior percentagem de idosos na Europa. A manchete foi copiada e reproduzida como mais uma desgraça deste país desgraçado. Quase ninguém a questionou ou contrariou, porque há muito que se criou a ideia errada de que ser velho, é mau. Aceitamos estupidamente este preconceito e são, por essa razão, cada vez mais os que tudo fazem para camuflar os sinais da idade. Compreendo que seja assustador perceber que não se renovam as gerações, mas ter um país com muitos velhos não é mau. Vergonhoso sim é a forma como eles são ignorados, tratados e retratados. Cresce em Portugal a ideia de que ser velho é perder a utilidade para tudo. Alguém a quem o prazo de validade já expirou e que não pode ser utilizado para mais nada. Deixam de pertencer às categorias que a sociedade de consumo considera relevantes e quase desaparecem. Deixam de interessar como trabalhadores, como consumidores, como leitores, como espectadores. Na procura apenas da frescura da juventude, não percebemos que desta forma estamos a perder o que de mais valioso temos. Os mais velhos. 

Ao contrário de Portugal, em muitas outras partes do planeta pensa-se exatamente o contrário. Os jornais, as televisões, a publicidade e até o mercado de trabalho começam a valorizar os que têm mais idade. Numa sociedade com menos filhos, os mais velhos passaram a ser necessários. São eles que ainda têm algum poder de compra, descobriram e utilizam a internet de forma mais eficaz e intensiva, consomem mais jornais e televisão e os que ainda podem viajam e gastam muito em lazer. A publicidade e a televisão foram as primeiras a perceber isso. Nos Estados Unidos há cada vez mais marketing dirigido aos maiores de 60 anos. Nas televisão as personagens principais passaram a ter mais idade, e até a Jane Fonda, com uns magníficos 77 anos, é a vedeta de uma das principais séries e fechou um contrato milionário com uma marca de produtos de beleza. Em Portugal é exatamente o oposto. Aqui vergonhosamente os mais velhos são rotulados, esquecidos e apenas servem para pagar a pesada dívida pública. Em vez de estigmatizarmos os mais idosos deveríamos pedir a ajuda deles, ajudando-os. Têm muito para nos ensinar e alguns são quadros experientes num país de onde quase todos fogem. Podem não ser os mais rápidos e ágeis, mas a sua sabedoria e experiência ajudam-nos a evitar erros e a ultrapassar dificuldades. Em vez de os abandonarmos à sua sorte e solidão devíamos contratar avós e avôs. Pessoas que o mercado de trabalho estupidamente rejeitou, não por falta de competência mas simplesmente pela idade. É urgente! Portugal tem de deixar de esconder as rugas e de pintar os cabelos. Precisamos e muito dos mais idosos. E já agora não se esqueçam que os próximos velhos… somos todos nós.

domingo, 22 de janeiro de 2017

Antes, muito antes de sonharmos com a Índia, um mestre yoga chegou a Beja. A pé

A descoberta de um esqueleto numa estranha posição em Beja intrigou os investigadores. Agora, sabe-se que a posição era de yoga e o corpo em causa de um mestre. Que chegou a Portugal há 1700 anos. A pé.

CARLOS DIAS 22 de Janeiro de 2017

Em 2007 e no decorrer de uma obra na rede de abastecimento de água à cidade de Beja surgiu, no meio de ossadas do período islâmico, um esqueleto em posição de lótus. Nove anos depois, e pela primeira vez no mundo fora da Índia, foi confirmada a descoberta de um mestre yoga, que aqui chegou vindo do oriente a pé



São mais as certezas que as dúvidas relativas à identificação do que resta de um indivíduo do sexo masculino, enterrado há cerca de 1700 anos, com a coluna erecta, as pernas cruzadas, os dedos do pé direito apoiados no calcanhar do pé esquerdo, em posição de lótus. Pequenas pedras talhadas com pequenos círculos estavam colocadas na cabeça, cotovelos e pernas. Era patente a intenção de acondicionar o corpo naquela posição, dentro de uma estrutura construída para esse propósito, e próximo do que poderá ter sido uma das principais vias de acesso à então cidade Pax Yulia. Foi enterrado próximo dos outros túmulos, “nas traseiras do que seria uma necrópole, salvaguardando o respeito ao espaço romano”, presume o arqueólogo Miguel Serra, que fez a descoberta classificada como “bizarra” dada a forma como o corpo fora inumado. Não tinha qualquer adereço, pormenor que patenteava despojamento.

A disposição do esqueleto era diferente das inumações dos islâmicos que encontrou depositados, a poucos metros, em contacto com a terra e com a face virada para Meca. Este tinha a cabeça virada para oeste.

Apesar de nunca ter visto as ossadas, que se encontram depositadas em Coimbra para a realização de estudos de ADN e do tipo de alimentação que consumia, o presidente da Confederação Portuguesa de Yoga, o grande mestre Jorge Veiga e Castro, depois de ter visionado as fotografias, o espaço de enterramento e interpretado a documentação científica produzida, não tem dúvidas: “Não se conhece em nenhuma parte do mundo, a não ser na Índia, um fenómeno de um esqueleto em posição de lótus como o de Beja”.

“A pose de enterramento era muito estranha e remetía-nos para o mundo oriental, mas sem definição”, referiu Miguel Serra, acrescentando que, no século III d.C, havia cultos orientais em Beja e identificou-se “o indivíduo como estando associado a esse movimento.”

Nesse contexto histórico, e apesar de Pax Yulia se localizar no interior do sudoeste peninsular, sabe-se, desde que o arqueólogo Cláudio Torres reescreveu a história da região, que havia uma intensa ligação ao mundo mediterrânico através do rio Guadiana e pelo porto fluvial de Mértola, por onde chegavam diversas influências culturais e religiosas.

Foi através dessa porta de entrada que veio até à cidade romana um mestre yoga que se lançou ao caminho, percorrendo, a pé, não se sabe por onde nem como, cerca de 8000 quilómetros “para transmitir a boa nova fora da Índia”, afirmou ao PÚBLICO Veiga e Castro. A convicção do mestre sobre esta aventura assenta não só na estrutura óssea do esqueleto, que indicia grandes caminhadas, como no hábito que existia na altura de encetar grandes peregrinações.


O certo é que este estranho indivíduo, descreve o relatório antropológico elaborado na sequência da descoberta, apresentava patologias que revelaram “que caminhava muito e de pé e era um indivíduo robusto e saudável.” Os ossos na zona de intercepção com os músculos apresentavam umas cristas, reveladoras do esforço a que foram sujeitos depois de intensas caminhadas. "Morreu aos 50 anos, tinha 1,62 metros de estatura e terá sido velado ao ar livre durante uns dias, mas não morreu em meditação”, continua o relatório.

A simetria da posição e a forma como estava colocado “só era possível de alcançar pelos grandes mestres”, sublinha o arqueólogo, que interpretou o modo como foi inumado como “um manual como fazer correctamente aquela posição.”

As dúvidas que suscitou, a forma de enterramento e o desconhecimento de situações paralelas para interpretar este indivíduo impeliram Miguel Serra a colocar a foto do inédito achado arqueológico nos blogues. “E foi então que tivemos uma surpresa, quando, em 2012 se realizou, em Beja, o Dia Internacional do Yoga”. Vários indianos que se deslocaram à cidade alentejana ficaram perplexos com o achado que não lhes deixava dúvidas: “Era um mestre de yoga”, conta Miguel Serra, realçando a insistência em se fotografar no espaço onde foi descoberto o enterramento na Rua Gomes Palma, junto ao chamado Jardim do Bacalhau.

Jorge Veiga e Castro confirmou que os "mestres da Índia ligados ao Yoga e ao Induísmo (entre eles vários professores universitários) ficaram felizes e surpreendidos com o achado de Beja”. E , através das informações que foram recolhendo, ficou reforçada "a ideia de que se trata de um mestre do yoga.” A dimensão e o significado da descoberta arqueológica não lhe deixam dúvidas. “Todos os indícios apontam nesse sentido. É inegável, as provas estão lá. Ninguém o pode esconder. É um achado histórico de grande significado”, sintetiza o presidente da Confederação Portuguesa do Yoga, realçando um pormenor histórico: "Não foi só há 500 anos que houve contactos com o extremo oriente. Muito anos antes já os haveria como este personagem parece documentar.”

A partir de agora, o objectivo da Confederação Portuguesa do Yoga passa por transformar Beja “num pólo de atracção que projecte esta corrente religiosa para a Europa e o mundo inteiro”. Para alcançar esse desiderato, diz que o próximo objectivo é “expor as ossadas” na capital do Baixo Alentejo, se for possível até ao Congresso Ibérico de Yoga, que se realiza Abril, na cidade espanhola de Ávila.


Achado arqueológico descoberto “por uma unha negra”


A legislação em vigor que limita a área de protecção legal dos centros históricos revela lacunas que foram realçadas em escavações arqueológicas realizadas em 2007 e que conduziram à descoberta do esqueleto de um mestre de yoga.

Se a vala que foi aberta para a instalação da rede de águas tivesse sido deslocada cerca de três metros para além do limite dos 50 metros a contar da cintura de muralhas que delimita o Centro Histórico de Beja não se estaria a falar deste achado que foi descoberto “por uma unha negra”, refere o arqueólogo Miguel Serra.

O levantamento arqueológico apenas incidiu no espaço da vala aberta para instalar a tubagem da rede de abastecimento de água. “Ficámos sem poder saber o que está para os lados”, acrescenta. Por exemplo, concluir se o mestre yoga tinha ou não junto dele sepulturas de seguidores, observa o arqueólogo.

A área já está identificada há décadas como rica do ponto de vista arqueológico dada a profusão de ossos humanos que surgem durante as intervenções feitas numa extensão com cerca de dois hectares de área e onde têm sido descobertos diversos vestígios da época romana, islâmica, medieval e moderna.

Miguel Serra chama a atenção para a necessidade de tornar a legislação que estabelece as áreas de protecção do património mais dinâmica em função das características históricas de cada local, lembrando que a “cidade de Beja não morria nas muralhas” no século III d.C. A ocupação estendia-se para o exterior. Exemplo disso é a enorme necrópole que já existia na época romana, prosseguiu na época islâmica e continuou na época moderna, como tem ficado provado no decorrer de intervenções que têm sido efectuadas fora do centro histórico.

Durante as obras realizadas no âmbito do programa Beja Polis, entre 2003 e 2004, foi descoberta uma rede com 137 silos escavados na rocha, que terão servido para o armazenamento de cereais e também como lixeira entre os séculos XIV e XVII. Foram sacrificados à instalação de um parque de automóveis. Tem sido descoberto outro tipo de património fora da área de protecção, onde não é necessário o acompanhamento arqueológico.

A boa nova nos dias de hoje

No século III d.C, a mensagem do movimento yoga estava praticamente circunscrita a uma área do planeta. Daí a surpresa por terem sido encontrados vestígios da presença de um mestre yoga em Beja.

Hoje, a importância desta corrente religiosa baseada no princípio “o verdadeiro fundamentalismo é o respeito pela vida” tem dimensão universal. E, neste contexto, destaca-se a elevação do Yoga da Índia a Património Cultural e Imaterial da Humanidade pela UNESCO, objectivo que foi concretizado a 1 de Dezembro de 2016 e também o papel desempenhado pelo português Jorge Veiga e Castro por ter sido o proponente do Dia Internacional do Yoga.

Outra das iniciativas de Veiga e Castro, o “Dia da Luz e da Sabedoria” e da “Não Agressão”, defende que, “por 24 horas, não se derrame sangue, sob nenhuma forma" e respeite-se "a sagrada Vida que nos foi dada”, evento que ocorre no Solstício de Junho.

O também presidente das Confederações Portuguesa, Ibérica e Europeia do Yoga concentra a sua atenção na formação das crianças e jovens de todos os países do mundo, com a inclusão de o Yoga nos currículos de ensino. Nesta área, ministra cursos de formação de professores do Yoga.

terça-feira, 10 de janeiro de 2017

Mário Soares, o último adeus



Lutou como poucos contra a ditadura, foi preso, casou na prisão, teve de deixar o país. Regressou depois do 25 de Abril para ser um pouco de tudo na política (deputado, ministro, primeiro-ministro, Presidente da República e eurodeputado). Mário Soares, o rosto maior da democracia portuguesa, morreu neste sábado aos 92 anos, avançou a Lusa.

Estava internado desde terça-feira, 13 de Dezembro, no Hospital da Cruz Vermelha, onde entrou em situação crítica, depois de uma indisposição. Passou dez dias nos cuidados intensivos, para onde regressou na véspera de Natal, depois de um súbito agravamento do estado de saúde e onde esteve até este sábado.

Quem olhar para os últimos 50 anos da história de Portugal vai encontrar sempre Mário Soares: no ataque à ditadura, na libertação democrática, na resistência ao comunismo, na opção europeia, na solidez democrática. Foi, nos momentos decisivos, o líder de que Portugal precisava – e é por isso que hoje o país lhe deve muito.

As suas exéquias fúnebres decorrem segunda e terça-feira. Na segunda-feira, o corpo estará em câmara-ardente na Sala dos Azulejos do Mosteiro dos Jerónimos, para onde será levado de sua casa, no Campo Grande, com passagem e paragem na Câmara Municipal de Lisboa. Mário Soares era agnóstico e por isso não será velado em nenhuma capela nem haverá missa de corpo presente.

Na terça-feira, será levado para o centro do claustro daquele monumento, onde às 13 horas se realiza uma cerimónia com intervenções dos filhos, do Presidente da República e do presidente da Assembleia da República, e com a actuação do coro e orquestra do Teatro Nacional de São Carlos. Dali, o cortejo fúnebre segue para o Cemitério dos Prazeres, passando pelo Palácio de Belém, Fundação Mário Soares, Assembleia da República e Largo do Rato, onde se encontra a sede do PS, partido de que é fundador. Nos Prazeres, as cerimónias fúnebres com honras militares decorrem a partir das 17 horas, em que apenas a primeira parte é aberta ao público.

Nascido a 7 de Dezembro de 1924, em Lisboa, Mário Alberto Nobre Lopes Soares era filho de João Lopes Soares, um antigo padre e professor que fundou o Colégio Moderno, e de Elisa Nobre Soares, professora.

Mário Soares destacou-se desde cedo na política. Ainda como estudante universitário (licenciou-se em Ciências Histórico-Filosóficas em 1951 e em Direito em 1957), foi secretário da Comissão Central da Candidatura do General Norton de Matos à Presidência da República, em 1949, e estaria 11 anos depois na Comissão da Candidatura do General Humberto Delgado à Presidência da República.

Fez parte de vários movimentos de oposição à ditadura do Estado Novo, o que lhe valeu ser preso 12 vezes pela PIDE, a polícia política do regime. Cumpriu quase três anos de prisão e foi na cadeia, em 1949, que casou com Maria de Jesus Barroso. Foi deportado para São Tomé em 1968 e dois anos depois obrigado a exilar-se em França.

Foi no exílio que se tornou um dos fundadores do Partido Socialista, em 1973, e assumiu o cargo de secretário-geral dos socialistas durante praticamente 13 anos.

Regressou a Portugal três dias depois da revolução de 25 de Abril de 1974 para uma intensa actividade política, que o levou a ser uma espécie de farol da democracia portuguesa.

“Mário Soares sempre teve visão. Visão ainda no tempo da ditadura, quando conseguiu afirmar a autonomia dos socialistas no quadro da oposição. Teve visão quando, em pleno PREC [Processo Revolucionário em Curso, Verão de 1975], percebeu que a missão fundamental do PS era defender a liberdade e a democracia. Teve visão quando afirmou o desígnio europeu”, disse António Costa, então secretário-geral do PS, num depoimento ao PÚBLICO em 2014, a propósito dos 90 anos de Mário Soares.

Soares foi ministro dos Negócios Estrangeiros no I, II e III Governos provisórios, ficando com o polémico dossier da descolonização, e ministro sem pasta no IV Governo, do qual se demitiu na sequência do caso República. Graças à vitória do PS nas eleições de 1976, torna-se primeiro-ministro, liderando o I Governo Constitucional (entre 1976 e 1977) e o II (1978). Voltaria a chefiar o Governo, pela terceira vez entre 1983 e 1985, no chamado Bloco Central com o PSD – nestas passagens pelo Governo, conduziu Portugal à adesão à então Comunidade Económica Europeia.


Depois de Cavaco Silva ter assumido a liderança do PSD e vencido as eleições de 1985 frente ao socialista Almeida Santos, Mário Soares lançou-se na corrida às eleições presidenciais de 1986. Zangou-se com o amigo Salgado Zenha, mas chegou à segunda volta, em que a esquerda (PCP incluído) se uniu para ajudar Soares a derrotar Freitas do Amaral.

Foi Presidente entre 1986 e 1996, depois de em 1991 ter sido reeleito com 70% dos votos. Destacou-se como um Presidente interventivo, especialmente no seu segundo mandato, em que criou as famosas presidências abertas, percorrendo o país.

Depois de deixar Belém ainda foi eurodeputado (entre 1999 e 2004) e tentou o regresso à Presidência em 2006, para tentar travar Cavaco Silva. Só que com a esquerda dividida (Manuel Alegre também se candidatou), Cavaco ganhou à primeira volta e Soares ficou em terceiro, atrás de Alegre, com quem se zangou e só faria as pazes anos mais tarde.

Mesmo afastado dos cargos políticos activos, Soares manteve a sua influência no PS e uma voz activa na sociedade portuguesa, tendo sido particularmente contundente no período do Governo de Passos Coelho, em que Portugal esteve sob um programa de assistência financeira.
Um guia para saber quem foi Mário Soares?

A morte de Mário Soares é aproveitada para recordar os anos democráticos de Portugal, e por isso é que se justifica esta imensa biografia histórica que dedicamos ao ex-Presidente da República, juntamente com uma cronologia digital do percurso de uma vida única, uma fotogaleria que recupera imagens que são de todos nós, outra galeria com cartazesque fizeram história e uma mapa com alguns dos lugares marcantes da vida de Soares.Acima de tudo, não deixe de ver os vídeos da colecção Soares e Eu, em que 27 personalidades recordam a relação que viveram com esta carismática figura da vida política portuguesa.

O homem que gostava de ser amado mas nunca se preocupou em ser consensual deixa um legado histórico à sua medida. Mário Soares cruzou a segunda metade do século XX e com ela todas as grandes derivas históricas: o fim do colonialismo, a construção europeia, a queda do muro de Berlim, o fim da guerra fria e a primeira guerra do Iraque. Em todas, Soares esteve do lado certo da história, tendo sido personagem importante em alguns desses momentos. Carlos Gaspar conta aqui como foi o mundo que Soares conheceu.



Vídeos


Com Júlio Pomar e outros



Com Álvaro Cunhal

E com nove pequenas histórias começamos a olhar para o outro lado da vida do homem que ajudou a fazer Portugal o que o país é hoje. Teresa de Sousa recorda como Mário Soares amava a liberdade: “É essa a sua herança nestes tempos conturbados que vivemos”. E com ele, há uma geração de políticos que se despede, como aqui recorda São José Almeida.

Soares não era imune a polémicas e por isso nunca as temeu. Foi a face de uma descolonização atabalhoada que o país absorveu de forma notável, envolveu-se em histórias sujas em Macau e ganhou inimigos e perdeu amigos em eleições disputadas até ao tutano. Luciano Alvarez recorda aqui as principais polémicas de uma vida cheia


Na Assembleia da República durante a tomada de posse de Cavaco Silva como Presidente da República a 9 de Março de 2006
DANIEL ROCHA

Várias personalidades (Miguel Esteves Cardoso, Vicente Jorge Silva, Rui Tavares, Joaquim Vieira, Francisco Louçã, António Valdemar) deixaram aqui a opinião sobre Mário Soares, o líder político que ganhou dez milhões de votos ao longo de uma vida política com onze corridas eleitorais. Temos ainda um editorial de David Dinis a dizer “Dr. Soares, obrigado”. E como queremos também saber o que pensa desta personagem incontornável da história portuguesa moderna, abrimos as nossas páginas à sua opinião: aproveite para deixar aqui algumas palavras sobre Mário Soares.

Com a mulher, Maria Barroso e D. José Policarpo na cerimónia da tomada de posse de Cavaco silva como Presidente da República no dia 9 de Março de 2006

No congresso do Partido Socialista a 30 de Novembro de 2014

Comemorações do 5 de Outubro em 2015
DANIEL ROCHA

Com António Guterres


Bagão fala do político português que melhor soube encarar o profundo resultado da política

O antigo ministro António Bagão Félix disse que Mário Soares foi o "político português que melhor soube encarar o mais profundo resultado da política" ao ter perdido com "a mesma naturalidade com que muitas vezes venceu".

"Mário Soares foi o político português que melhor soube encarar o mais profundo resultado da política, que é: saber perder é igual a saber ganhar. Ele perdeu com mesma naturalidade com que muitas vezes venceu", recordou Bagão Félix, aos jornalistas.

O centrista Bagão Félix falava aos jornalistas à saída do Mosteiro dos Jerónimos, onde o corpo de Mário Soares está em câmara ardente.
"O principal sentimento com que aqui vim foi um sentimento de gratidão enquanto português", sustentou ao considerar o antigo chefe de Estado Mário Soares como um homem a quem muito se deve do ponto de vista da liberdade e da democracia liberal.

Para o antigo ministro das Finanças, Mário Soares foi "uma pessoa que exerceu política com gosto e com sentido de serviço, mas também com aquilo que é importante num político", nomeadamente um ser humano, que "tem falhas" e "que erra".

"Foi um português da história contemporânea a quem muito devemos, independentemente das diferenças. Eu estava em campos ideológicos diferentes, mas sempre encontrei em Mário soares um exemplo", disse ainda.Lusa

Em 1998

A 20 de Dezembro de 2005 num debate para as eleições presidenciais com Cavaco Silva na RTP

Dia 30 de Novembro de 2014 durante o congresso do Partido Socialista com António Arnaut, Edmundo Pedro e Jorge Sampaio

Mário Soares com Cavaco Silva em Leiria no dia 29 de Abril de 2003

Eanes presta homenagem a "co-autor relevante" de acontecimentos políticos

O antigo Presidente da República Ramalho Eanes prestou homenagem a Mário Soares, um "co-autor relevante" de diferentes acontecimentos políticos de Portugal, recordando que nas questões de interesse comum estiveram juntos ou muito próximos.

"A minha presença aqui é uma presença de homenagem. Homenagem a um homem que na luta política se empenhou e que é um coautor relevante dos mais vastos acontecimentos políticos do Portugal contemporâneo", disse aos jornalistas o antigo chefe de Estado, que acompanhado da mulher, Manuela Eanes, esteve hoje à tarde no Mosteiro dos Jerónimos para participar nas cerimónias fúnebres de Mário Soares.

Apesar de não procurar "apagar os confrontos" que teve com o histórico socialista, Ramalho Eanes considera que este não é o "momento para o referir e nem isso importa agora porque nas grandes questões que tinham a ver com o interesse comum" estiveram "se não juntos, pelo menos muito próximos".

Entre os momentos marcados pela acção de Mário Soares, o antigo chefe de Estado referiu "a transição, a institucionalização e a consolidação da democracia, uma democracia aberta, moderna, pluralista".

"Poderia e deveria referir também a entrada na então Comunidade Económica Europeia. Foi um momento alto, em que optamos por uma via de futuro que trouxe ao país parte da modernidade que o país ostenta e usufrui", recordou.

Ramalho Eanes considerou ainda que Mário Soares "foi um coautor relevante no estabelecimento do Estado Providência, que deu aos portugueses não há igualdade - porque a igualdade infelizmente não existe - mas a igualdade que tornam todos os homens dignos e que lhes garante segurança".



Com a mulher, Maria Barroso, e Cavaco Silva no dia 29 de Abril de 2003 em Leiria

Durante a apresentação da candidatura de António Costa à presidência da Câmara Municipal de Lisboa no Pavilhão de Portugal em 2013

Com a mulher, Maria Barroso, durante a apresentação da candidatura de António Costa à Câmara Municipal de Lisboa em 2013

Nos escritórios da Fundação Mário Soares dias antes de completar 90 anos, a 3 de Dezembro de 2014

Os historiadores Manuel Loff e Rui Tavares consideram que o antigo presidente da República deixa uma grande ajuda aos que se entregarem ao estudo da sua vida e obra.

No escritório da Fundação Mário Soares a 3 de Dezembro de 2014

No escritório da Fundação Mário Soares a 3 de Dezembro de 2014

No escritório da Fundação Mário Soares a 3 de Dezembro de 2014
A 1 de Dezembro de 2005

Antes do debate com Cavaco Silva para as eleições presidenciais na RTP no dia 20 de Dezembro de 2005

No dia 14 de Janeiro de 1996 à espera para votar nas presidenciais do mesmo ano

Nos 40 anos do 25 de Abril em 2014

Rui Machete lembra o "político excepcional"

O antigo vice-primeiro-ministro do Governo do Bloco Central, Rui Machete, caracterizou Mário Soares como "um político excepcional", destacando a coragem e lucidez com que interpretava as situações políticas.

"Mário Soares foi um político excepcional, pela sua maneira de ser, pela sua coragem, pela capacidade de lucidez com que interpretava as situações políticas", disse Rui Machete, em declarações aos jornalistas à saída do Mosteiro dos Jerónimos, onde o corpo de Mário Soares está desde o início da tarde em câmara ardente.

Rui Machete, que exerceu o cargo de vice-primeiro-ministro no Governo de coligação pós eleitoral PS-PSD liderado por Mário Soares em 1985, recordou ainda o antigo Presidente da República como um chefe do executivo "imparcial".

"Procurou que a coligação funcionasse e funcionou, não se sentia que houvesse divisões entre PS e PSD", lembrou, sublinhando que "as coisas funcionaram tão bem" que grande parte dos ministros que compunham o Governo e eram do PS ficaram seus amigos.

"Mário Soares foi um dos grande políticos portugueses e a sua morte representa um ciclo que termina", acrescentou, reconhecendo que divergiram em algumas coisas, mas do ponto de vista pessoal existiu sempre admiração.

O deputado do partido ecologista Os Verdes José Luís Ferreira caracterizou também Mário Soares como "uma figura que ficará indiscutivelmente ligada à história" de Portugal. José Luís Ferreira recordou também "o papel de lutador antifascista" do antigo Presidente da República, que exerceu não só como cidadão, mas também como advogado de presos políticos.Lusa


Dia 31 de Maio de 1991 com o Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, e o líder da Unita, Jonas Savimbi, na assinatura do acordo de paz da guerra civil de Angola, ou Acordos de Bicesse

Apresentação do livro "Portugal 2020 Entre o Sucesso e a Irrelevância" no dia 6 de Março de 2012

No dia 30 de Maio de 2013 numa conferência contra a austeridade

No dia 30 de Maio de 2013 numa conferência contra a austeridade

Com Maria Barroso,Príncipe Carlos e a Princesa Diana de Inglaterra no Palácio de Queluz em 1987

A 30 Maio de 1991 Mário Soares recebe o presidente de angola José Eduardo dos Santos

No escritório da Fundação Mário Soares, quatro dias antes de completar 90 anos, a 3 de Dezembro de 2014

Durante uma entrevista no dia 14 de Junho de 2003

Guterres recorda “protagonista maior” do valor da liberdade
António Guterres, secretário-geral da ONU, deixou uma mensagem de agradecimento ao antigo Presidente da República, Mário Soares, por “tanta entrega ao país e ao Partido Socialista”.

Numa nota escrita, a seu pedido, no livro de condolências do PS, o antigo primeiro-ministro socialista diz assistir à distância “comovido” às homenagens feitas a Mário Soares, que mostram “o quão importante e quão marcante” era para o povo português. E sublinha o significado mais profundo da perda para os socialistas. “Mas é, para nós socialistas, que a saudade é mais funda porque morreu o nosso fundador, o amigo, o eterno militante número um do nosso partido, companheiro de tantas batalhas e protagonista maior do valor que nos guia – a liberdade”, escreveu, segundo fonte oficial do PS.

António Guterres agradece a Mário Soares e recorda que o seu legado é um património dos socialistas. É a “garantia de que permanecemos sempre um partido de homens e mulheres livres que saberão honrar e defender os valores da democracia aos quais, com coragem, dedicaste toda uma vida”, lê-se na nota em que o antigo líder do PS se dirige a “camaradas e amigos”. S.R.



Debate sobre o 25 de Abril moderado por Francisco Pinto Balsemão e com Jorge Sampaio e Ramalho Eanes a 14 de Abril de 2014

No dia 25 Abril de 2014 na conferência "O 25 de Abril Visto de Fora" pela Fundação Mário Soares com Lula da Silva e Dominique Pouchin no Museu Oriente

Durante as comemorações do 25 de Abril na Assembleia da República em 2010

Numa entrevista em Junho de 2013

Com Jorge Sampaio, Manuel Alegre e António Guterres

Marcelo diz que homenagem dos portugueses é "muito impressionante"

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, considerou "muito impressionante" a homenagem que os portugueses estão a prestar a Mário Soares, que mostra "a gratidão do país" em relação ao antigo chefe de Estado.

Marcelo Rebelo de Sousa e o presidente da Assembleia da República regressaram hoje, cerca das 19h30, ao Mosteiro dos Jerónimos para prestar uma homenagem a Mário Soares, depois de terem recebido, ao início da tarde, o cortejo fúnebre do antigo chefe de Estado.

À saída, cerca de 50 minutos depois, o Presidente da República foi questionado sobre a homenagem que os portugueses estão a prestar a Mário Soares, tendo sido curto nas palavras para dizer que é "muito impressionante" e mostra "realmente a gratidão do país em relação a Mário Soares".

Interrogado sobre se os portugueses estavam a responder ao pedido que o Presidente da República tinha feito, Marcelo respondeu apenas que "responderam ao apelo da história".

O chefe de Estado saiu dos Jerónimos acompanhado pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, Santos Silva, tendo o Governo estado igualmente representado ao início da noite nos Jerónimos pelo ministro da Agricultura, Capoulas Santos, da Presidência e da Modernização Administrativa, Maria Manuel Leitão Marques, e do Planeamento e Infraestruturas, Pedro Marques.

A secretária de Estado da Inclusão das Pessoas com Deficiência, Ana Sofia Antunes, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Rocha Andrade, e a secretária de Estado Adjunta e da Educação, Alexandra Leitão.

Também presentes estiveram os ex-ministros António Vitorino, Alberto Costa e Nuno Severiano Teixeira, bem como o ex-secretário de Estado José Magalhães e o ex-deputado Paulo Mota Pinto.Lusa



Na festa do seu 80º aniversário no dia 7 de Dezembro de 2004

Com António Guterres e António de Almeida Santos na Assembleia da República durante as comemorações do 25 de Abril em 1997

Na Assembleia da República durante a tomada de posse de Jorge Sampaio em 1996

Com o antigo primeiro-ministro espanhol Felipe Gonzalez durante a cerimónia do 25º aniversário da adesão de Portugal e Espanha à Comunidade Europeia no dia 12 de Junho de 2010

No funeral da mulher, Maria Barroso, com a filha Isabel e netos no cemitério dos Prazeres no dia 8 de Julho de 2015 

No cemitério dos Prazeres, durante o funeral da sua mulher, Maria Barroso, com o filho João e Isabel no dia 8 de Julho de 2015

No dia 23 de Dezembro de 2005, na Figueira da Foz, em pré-campanha para as eleições presidenciais

O Bochechas, a descolonização e nós

Aquilo que mais oiço contra Mário Soares é a acusação das suas responsabilidades na descolonização. Considero esse juízo incorrecto e injusto.

JOSÉ RIBEIRO E CASTRO

1. O falecimento de Mário Soares era notícia esperada. Sabia-se da fragilidade da sua saúde, desde que, há um ano, desaparecera da televisão — Mário Soares foi figura pública, activa e opiniosa, até ao último dia que lhe apeteceu. Após o recente internamento, esperava-se a qualquer momento. Foi sem surpresa que soubemos e até com algum alívio: o alívio que reservamos aos que estimamos — por se abreviar o sofrimento próprio, dos familiares e amigos mais próximos.

Na voz popular, “morreu o Bochechas”. Peço licença, com a mesma irreverência com que ele sempre lidou com os poderes e os mitos, para usar o cognome por que a generalidade dos portugueses o conheceu. Expressão de bom humor, era sinal de carinho e não de sarcasmo. Também se riu disso. Esse cognome e o sorriso cúmplice abraçam o essencial da razão por que o rodeia na hora da morte uma quase unanimidade. É um eco, novo e refrescado, da quase unanimidade que marcou a reeleição presidencial em 1991. Explica que ele tenha inaugurado, como mais ninguém poderia ter feito, aquela expressão e ideia que, desde então, nunca mais se apagou: “o Presidente de todos os Portugueses”. E é o eco popular da excepcionalidade de estatuto que, progressivamente, lhe foi sendo reconhecida.

Mais do que um “homem de consensos” (coisa insonsa, sensaborona, que todos os governantes e chefes algumas vezes têm de ser), Soares foi um líder de guinadas e de sapatadas. O que marca a sua vida são as rupturas que foi capaz de fazer, o tempo em que as fez, o modo como as fez e a determinação com que as interpretou e conduziu. Guiou-o muito a ideia de Liberdade e de Democracia, além de outras do seu campo ideológico e partidário. Mas, nesses tempos fundadores da democracia em Portugal, antes e depois do 25 de Abril, não deve haver um só português que, ao menos nalgum momento, nalgum dia, nalguma época, não se sentisse identificado com ele e não estivesse atrás dele nalgumas dessas várias guinadas corajosas e determinantes das lutas pela Liberdade.

2. Aquilo que mais oiço contra ele é a acusação das suas responsabilidades na descolonização. Considero esse juízo contra Mário Soares incorrecto e injusto. Do que conheci e vivi do processo de descolonização, bem como do que tenho lido, o mais certo é “a culpa morrer solteira” — e, aqui, de modo compreensível.

Se há um momento em que um país necessita, crucialmente, de poder e de ordem, esse momento é aquele em que entende descolonizar parcelas do seu território. A transferência de poderes de uma autoridade para outra exige que a autoridade exista. Sem isso… nada! É como na passagem do testemunho em corrida de estafetas: mão firme a passar, mão firme a receber.

Ora, a seguir ao 25 de Abril em Portugal, o que havia era tudo menos mão firme: não havia autoridade, nem poder, nem ordem. E tudo se foi tornando pior, à medida que mergulhámos na loucura desenfreada do PREC. Realizar uma descolonização neste contexto só podia dar o que deu. E, todavia, tão-pouco se podia impedi-la ou adiá-la, porque o que determinara a revolução tinha sido a revolta dos militares contra a continuação da guerra. Só se podia adiá-la, mantendo a guerra nalguma medida; e a guerra não podia continuar.

Mário Soares, como a generalidade dos políticos civis da época, pouco podiam influenciar os acontecimentos. Maior será a responsabilidade dos político-militares de então, que detinham poder efectivo e o comando das tropas. Mas mesmo estes têm a responsabilidade limitada, pelas contradições entre todos eles, pela relatividade do “comando” ou pela rendição espontânea de unidades no terreno, tornando impossível qualquer condução política propriamente dita. Em suma: o país vivia em completa desordem, a descolonização desenvolveu-se em completa desordem. Um desastre na verdade, de que muitos povos pagaram preço caríssimo.

Olhando a antes do 25 de Abril, diz-se que Marcello Caetano não democratizou mais e mais depressa, por causa da guerra e do Ultramar. Recearia um desastre, a incapacidade de conduzir os acontecimentos mal abrisse uma porta. Se esses eram os receios a partir de um poder estabelecido, não surpreende a dinâmica ocorrida quando ruíram os diques e o poder estava na rua.

Creio que Mário Soares aspirava diferente — e não é segredo que tinha alguma proximidade com Spínola, cuja visão era moderada e também não teve a menor oportunidade. Soares era favorável à independência dos territórios ultramarinos — no que divergia do federalismo de Spínola — e queria essa independência com democracia, algo bem diferente do que a circunstância histórica impôs. Por aquilo que foi a sua vida, não podemos pôr em dúvida que fosse esse o seu sonho, ambição e propósito: que cada país do que viria a ser a CPLP seja uma democracia livre para felicidade do seu próprio povo e exemplo nas suas regiões e no mundo. É por isso que Soares, além da amizade com o Brasil, se alegrava com os progressos democráticos de Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste e seguiu sempre com atenção e solicitude os desenvolvimentos políticos em Angola, em Moçambique e na Guiné-Bissau. Até se respirar Liberdade e Paz em todo o lado.

3. Nos últimos anos de vida, Mário Soares nunca virou a cara a qualquer combate a que se sentisse desafiado. Sofreu derrotas, algumas amargas. Mas nunca quebrou, nem baixou os braços, nem desistiu. Honrou a irreverência de sempre.

Bastas vezes, idoso, mas vibrante, esteve à frente dos mais novos do seu campo. Interpretou várias guinadas e outras tantas sapatadas sobre novos problemas e desafios do nosso tempo português, europeu e mundial. Foi um espírito vivo e desperto, enquanto figura pública.

A maior parte das vezes, devo dizer, eu não estava de acordo. E, por vezes, à minha volta, ouvia isto: “Já devia calar-se.” Não, nada disso. Usou até à última gota o bem que mais distribuiu: a liberdade. O Bochechas merecia. Em verdade, merecemos todos. Mário Soares em especial.


Com Nelson Mandela na Cidade do Cabo, África do Sul, em 1997

Presidente da República Jorge Sampaio recebe Mário Soares no Palácio de Belém a 2 de Agosto de 2005





Soares, após a morte de Delgado, recusou outra pessoa para a liderança da oposição democrática que não fosse ele. E ganhou essa guerra. É a primeira de cinco histórias sobre a vida de Mário Soares

Um dos aspetos interessantes da vida de Mário Soares é o modo como ele se torna o líder da oposição não comunista em Portugal. Com pouco mais de 40 anos e com seguidores muito mais velhos e que poderiam invocar maior experiência, torna-se a referência incontestada daqueles que combatem o fascismo e ao mesmo tempo rejeitam o totalitarismo soviético.

Mário Soares já era uma figura conhecida da oposição a Salazar. A Pide prendeu-o por 12 vezes, o regime exilou-o por duas. No fim da II Guerra (1945) é dos mais aguerridos membros do MUD Juvenil, e em 1949, nas eleições presidenciais, torna-se secretário de Norton de Matos. O facto de fazer parte do PCP e de o ter omitido ao velho general e ministro da I República é algo de que ele se dirá arrependido, mais tarde. Sendo o seu pai, João Lopes Soares, também ex-ministro da I República, um conhecido e ativo reviralhista, o jovem Mário participa ativamente nas tentativas de derrube da ditadura. É assim que, depois de sair do PCP, funda a Resistência Republicana e Socialista (1955) e, mais tarde (1956), entra para o Diretório Democrato-Social, onde estavam António Sérgio, Jaime Cortesão e Mário Azevedo Gomes.

São estas últimas as figuras cimeiras da Oposição democrática. Mas o surgimento do autêntico furacão que foi Humberto Delgado em 1958 traz para a ribalta mais um nome que se torna indiscutível nessa ala política. O PCP começa, aliás, por não apoiar Delgado, chamando-lhe ‘general Coca-Cola’, devido à permanência de cinco anos nos EUA, onde aliás aderiria à ideia de estabelecer uma democracia de tipo ocidental em Portugal.

A última vez que Delgado e Soares se encontram é em casa de Emídio Guerreiro (que depois do 25 de Abril viria a ser episodicamente líder do PSD) em Paris. Despedem-se até Portugal, convicto o general de que um golpe no país poria fim ao salazarismo

Jaime Cortesão e Mário Azevedo Gomes, menos operacionais e mais programáticos, levam para diante uma ideia que acaba por ser executada apenas pelo segundo, uma vez que Cortesão morre em 1960. Era o Programa para a Democratização da República, um extenso documento que estabelece as bases da oposição democrática ao salazarismo. Azevedo Gomes, o seu primeiro subscritor, era então visto como o líder moral dessa corrente, que aliás fazia constantes referências a Cortesão. Para a redação do Programa é constituída uma comissão de que fazem parte o próprio Mário de Azevedo Gomes, Francisco Ramos da Costa, Fernando Piteira Santos, José Ribeiro dos Santos e Mário Soares.

Delgado, que pedira asilo político na embaixada do Brasil em 1959, convence-se de que o regime só pode ser derrubado pela força. É assim que começa a organizar um golpe de estado militar (o golpe de Beja, de 1962), que é dominado pelo regime. Mais tarde, em fevereiro de 1965, através de um ardiloso plano da Pide, é atraído a Portugal. Porém, em Espanha, junto da fronteira portuguesa (Los Almerines, Olivença), é morto pela polícia política portuguesa.

A última vez que Delgado e Soares se encontram é em casa de Emídio Guerreiro (que depois do 25 de Abril viria a ser episodicamente líder do PSD) em Paris. Despedem-se até Portugal, convicto o general de que um golpe no país poria fim ao salazarismo.

Porém, Delgado desaparece. E Soares sabe-o por Emídio Guerreiro, que lhe telefona a dar conta de que tanto o general como a sua secretária não davam sinal e que poderiam estar presos em Lisboa. Mais tarde, quando se sabe do assassínio, Soares, juntamente com o advogado oposicionista Abranches Ferrão, oferecem-se para representar a família, processando a Pide e o Estado português.

A oposição ficara sem o seu nome mais sonante. Azevedo Gomes faleceria em dezembro de 1965 e só António Sérgio, já com idade avançada (82 anos) representava os históricos oposicionistas. É neste contexto que, uns tempos mais tarde, Emídio Guerreiro pretende encontrar-se com Soares.

Emídio Guerreiro, que estivera muito próximo de Delgado, avança com um papel já assinado por Ramos da Costa (que em 1973 viria a ser um dos fundadores do PS), António Macedo e Carlos Cal Brandão (idem) em que o reconheciam como líder da Oposição Democrática. A ideia era que Soares o assinasse também

Por razões que não conheço o encontro dá-se em Roma onde estava exilado, mas indocumentado, Victor da Cunha Rêgo, jornalista e oposicionista que seria o chefe de gabinete de Soares em diversos Governos e secretário de Estado adjunto do Primeiro-Ministro (Mário Soares) do I Governo Constitucional.

O encontro é num restaurante (e ouvi a história de ambos os protagonistas, com versões bastante próximas nos factos, mas absolutamente diversas nas intenções). Guerreiro, que estivera muito próximo de Delgado, tendo mesmo o general ficado em sua casa em Paris várias vezes, avança com um papel já assinado por Ramos da Costa (que em 1973 viria a ser um dos fundadores do PS), António Macedo e Carlos Cal Brandão (idem) em que o reconheciam como líder da Oposição Democrática. A ideia era que Soares o assinasse também.

Mas o futuro Presidente da República tem outras ideias. Recusa-se a assinar tal documento e diz que não reconhece idoneidade a Guerreiro. A discussão sobe de tom, de tal modo que Cunha Rego sai do restaurante com medo que chegue a polícia e o detenha por falta de documentos. Guerreiro insiste, Soares obstina-se. Os dois homens separam-se sem acordo (o que ajuda a explicar a adesão de Emídio Guerreiro ao PPD após o 25 de Abril).

Soares, pelo seu lado, vai refazer as pontas. Contacta Ramos da Costa, Macedo, Cal Brandão, Tito de Morais. Depois do exílio de São Tomé, no breve tempo que está em Portugal antes de partir de novo para o exílio em França, organiza a CEUD, a primeira vez que a oposição não comunista vai a votos separada dos comunistas, que se juntam com outros antifascistas na CDE. Os resultados não são brilhantes, mas Soares persiste. Em 1973 funda o PS. Em 1974, o 25 de Abril permite-lhe voltar a Portugal e, apesar dos seus amigos e camaradas acharam que o PCP é um partido maior e mais forte, em 25 de Abril de 1975, nas Constituintes, têm a surpresa de saber que são o maior partido de Portugal.

Soares ganhara. E aquela refeição explosiva fora uma das molas dessa vitória.













Com Maria Barroso na Tunísia

Com Yasser Arafat

Numa entrevista em Junho de 2013

Passeio na praia

No Palácio de Belém

Estas são algumas das frases que marcaram os 92 anos de Mário Soares e muitas décadas de vida política.


O PS não se aliará ao PCP.



Tempo, Abril de 1976




Eu não pretendo ser, nem nunca serei, um monarca.

Diário Popular, Março de 1981


A especialidade do dr. Cunhal é o sentido de humor negro.

Expresso, Maio de 1981


Procurarei imitar Carlos Lopes. Só sprintarei no momento oportuno.

Diário de Lisboa em Dezembro de 1985


O povo português pode saber hoje, aqui na Marinha Grande, o que é a violência e o que é o espírito antidemocrático dos partidários de Salgado Zenha, Álvaro Cunhal e Ramalho Eanes. Fui agredido, mas isso não me impediu de circular em Portugal porque Portugal é uma terra de liberdade, não é Moscovo.

Marinha Grande em Janeiro de 1986

Vou ajudar Cavaco na missão de governar.

Tempo, Fevereiro de 1986

Sou favorável a um governo europeu.

PÚBLICO, Março de 1990

Não temo pressões. Venham de onde vierem.

PÚBLICO, Março de 1995

Sou socialista, republicano e laico.

Mário Soares: uma fotobiografia de Maria Fernanda Rollo, José Maria Brandão de Brito, Maria Inácia Rezola (Bertrand Editora), Novembro de 1995

Não acredito na eternidade. O que fica de mim é um rodapé nos livros de História.

Diário de Notícias, Dezembro de 2004

Verão que segui sempre a mesma linha: a da esquerda.

Expresso, Junho de 2007

As qualidades técnicas de Cavaco são um mito.

Correio da Manhã, Novembro de 2005

A intenção de Salazar era eliminar-me.

Visão, Julho de 2008

Sócrates é o anti-Guterres.

Correio da Manhã, Setembro de 2008

A Europa tem de ajudar Obama. É um suicídio se não o faz.

PÚBLICO, Março de 2010

A internet? Não leio. Não quero saber. Nunca me preocupei com o que dizem sobre mim e não vou agora começar.

Expresso, Novembro de 2014

Não acho que eu tenha sido especial. Não sou nada de especial. Ser Presidente da República é igual a ser outra coisa qualquer.





A bordo do navio de instrução da Marinha Creoula

Durante uma presidência aberta, em 16 de Abril de 1994


A votar

Os três momentos mais polémicos na vida de Soares

A vida de Soares foi rica em batalhas políticas e também em decisões e actos polémicos. O PÚBLICO elegeu três dos mais controversos do pós 25 de Abril de 1974 e que marcaram a vida fundador do PS.

A vida de Mário Soares marcou a vida de Portugal. Uma vida rica em batalhas políticas e também em decisões e actos polémicos. O PÚBLICO elegeu três dos mais controversos do pós 25 de Abril de 1974 e que marcaram a vida fundador do PS. Decisões que lhe valeram inimigos para sempre; que quase “mataram” o soarismo e que terminou com o então secretário-geral António José Seguro os dois socialistas voltaram a dar as mãos.1. Da descolonização “pura e simples” ao ódio dos retornados
A 13 de Maio de 1974, Mário Soares, numa entrevista à revista norte-americana Newsweek deixa clara a sua posição sobre o caminho a seguir nas ainda colónias portuguesas no ultramar: “Devemos começar a trabalhar imediatamente para um acordo de cessar-fogo com os guerrilheiros. O general Spínola [então líder da Junta de Salvação Nacional e que dois dias depois se tornaria Presidente da República] conhece a nossa posição: é a independência pura e simples.”
A 16 de Maio é nomeado pela Junta de Salvação Nacional o I Governo provisório do pós 25 de Abril, chefiado por Adelino da Palma Carlos. Soares é ministro dos Negócios Estrangeiros e começa de imediato a ter encontros com os movimentos de guerrilheiros com vista a um cessar-fogo e ao início do processo de descolonização e independência.
A pressa de Mário Soares para conseguir a “independência pura e simples” valem-lhe várias críticas: que não cabia a um governo provisório, mas sim ao que viesse a ser eleito pelo voto, tratar de algo tão importante; que se deveriam realizar referendos nos diversos países para os cidadãos decidirem o seu futuro; que havia outros processos de descolonização para além da independência “pura e simples”.

A 8 de Junho de 1974 os oficiais do MFA decidiram o cessar-fogo imediato no ultramar. Estava definitivamente aberta a porta para a independência das antigas colónias portuguesas. Cerca de três meses depois (10 de Setembro de 1974) Portugal e o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) ratificam o acordo para a independência da Guiné-Bissau. Este país é primeira colónia portuguesa a conquistar a independência.

No Alvor, Algarve, entre 10 e 15 de Janeiro de 1975, realiza-se uma cimeira para debater a independência de Angola. O Governo português (III Governo provisório, com Vasco Gonçalves primeiro-ministro e Mário Soares ministro dos Negócios Estrangeiros) e os três principais movimentos de libertação angolanos – Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) e Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA) – chegam a um acordo para independência do país e ficam estabelecidos os parâmetros para a partilha do poder. Fica acordado o dia 11 de Novembro desse ano como a data da independência. Porém, pouco depois da assinatura do documento, os movimentos iniciam um conflito armado pelo controlo do país. Começava a guerra civil em Angola. O mesmo aconteceu sucessivamente nas restantes colónias. As críticas a Soares subiram de tom.
Desde meados de 1974 que alguns colonos estavam a regressar à chamada "metrópole", mas é na Primavera/Verão de 1975 que, com as guerras civis cada vez mais violentas nas ex-colónias, fogem para Portugal milhares de colonos. Cerca de 600 mil pessoas, a maior parte de Angola e Moçambique. São os chamados "retornados". Muitos trouxeram apenas a roupa que tinham no corpo. Outros tiveram tempo para encaixotar e despachar alguns dos seus bens, que se acumularam junto ao Padrão dos Descobrimentos, em Lisboa. Uma imagem que se tornou icónica no processo da descolonização.
Muitos destes retornados apontam o dedo a Mário Soares, que, desde 25 de Abril de 1975, é primeiro-ministro do I Governo constitucional. Acusam-no de ser o “pai” de uma “descolonização selvagem”, o culpado de tudo o que perderam, de ter “vendido as colónias a Moscovo”, de fazer a descolonização por “interesses pessoais”. Ainda hoje se escrevem em blogues e sites na Internet textos de puro ódio a Mário Soares devido à descolonização de 1974/75.
Soares sempre assumiu o seu papel no processo e embora tenha afirmado várias vezes que foi “a descolonização possível”, nunca mostrou algum arrependimento pelo seu desempenho político. “Enquanto estive [no exílio] em Paris, tinha tido muitos contactos com os africanos que lá iam, que me iam cumprimentar e diziam: ‘O que é que se vai passar, como é que se vai passar?’ A minha primeira ideia era descolonizar. (…) Sem descolonização não se passaria a nada, porque a guerra continuaria. E eu fui, de facto, a primeira pessoa que chegou a Angola e disse: ‘Vocês vão ser independentes!’ Já era ministro dos Negócios Estrangeiros, diga-se”, afirma num entrevista ao Deutsche Welle, canal público de informação da Alemanha, em 2014.
Na mesma entrevista, questionado sobre as críticas dos retornados, Soares, polémico como sempre, diz: “Os retornados nunca perceberam que foi a sorte grande que lhes saiu. Nunca perceberam isso. Vieram para Portugal em condições difíceis, é verdade. Porque se assustaram e fugiram. Chegaram a trazer automóveis; outros nem isso, não trouxeram nada. E nós arranjámos uma solução para lhes dar tudo. Demos-lhe dinheiro, casas… Fomos nós! Porque logo a seguir fui presidente do Governo e, por isso, dirigia essa questão.”
O principal fundador do PS diz-se ainda “muito orgulhoso do que se fez com a descolonização”. “Tenho muita honra em ter participado nisso activamente.”
2. Macau, o maior abalo político do soarismo
Ficou conhecido como o “caso do fax de Macau” ou “caso Emaudio” e foi o episódio que mais beliscou a carreira política de Mário Soares.
O caso remonta a factos ocorridos entre 1988 e 1989, cumpria Soares o seu primeiro mandato de Presidente da República. Contado de uma forma muito resumida: Em Abril de 1988, menos de um ano depois de Carlos Melancia ser empossado governador de Macau por Mário Soares, a empresa alemã Weidleplan manifestou interesse em ser consultora na construção do aeroporto local. No entanto, em Fevereiro do ano seguinte, Luís Vasconcelos, membro do Governo macaense, concessionou o contrato à Aeroportos de Paris.
Menos de um mês depois, a Weidleplan enviou ao governador de Macau um fax pedindo-lhe que devolvesse o dinheiro (50 mil contos, hoje cerca de 250 mil euros) alegadamente pago para garantir a vitória no concurso. Este fax acabaria por ser divulgado pelo semanário O Independente e a polémica que se seguiu acabaria por levar à demissão do governador e seguir para os tribunais.
Esses 50 mil contos serviriam para financiar a actividade da Emaudio, uma empresa pensada por Soares e gerida por socialistas da sua total confiança, que tinha como objectivo criar um grande grupo de comunicação social que serviria de base de apoio ao PS.
O fax foi entregue a O Independente por Rui Mateus, amigo e conselheiro de Mario Soares e um dos administradores da Emaudio, que nessa altura já andava de candeias às avessas com Soares devido às contas da empresa. Mateus sempre afirmou que Soares sabia de tudo desde o primeiro minuto. O ex-presidente da República sempre negou ter conhecimento do alegado suborno, garantindo que só soube do caso e do fax quando ele foi publicado pelo O Independente.
Soares e Mateus cortaram relações e mais tarde (1996, já nos últimos meses do segundo mandato de Soares em Belém) o homem da Emaudio escreve o livro “Contos proibidos, memória de um PS desconhecido”, em que conta a sua história dos financiamentos do PS de Soares, com detalhe para o caso de Macau, em que mais uma envolve directamente o principal fundador do PS.
O assunto foi muito incómodo para Soares e para os socialistas que sempre fugiram a falar dele. Mas 20 anos depois da ocorrência dos factos, Almeida Santos, antigo presidente do PS que também esteve na Emaudio, acaba por desmentir Soares numa entrevista ao Expresso. “Mário Soares teve conhecimento prévio do Fax de Macau. Era uma situação complicada, punha problemas ao PS – ele tinha de ter conhecimento. Mas não tem culpas nisso. Eu sabia que o PS não tinha responsabilidades nisso, e Mário Soares muito menos”, afirmou.
Na sequência de um inquérito realizado em 1991, o Ministério Público acusou Melancia de ter recebido 50 mil contos de uma empresa alemã para influenciar um concurso relacionado com a construção do aeroporto de Macau, o que lhe valeu a acusação por corrupção passiva.
O processo Melancia andou pelos tribunais, com recursos atrás de recursos, e só em Outubro de 2002 foi dado por encerrado pela Justiça. Melancia saiu absolvido, não ficando nunca provado que tenha sido subornado ou objecto de qualquer promessa de suborno.
3. Soares/Alegre: a maior derrota na última batalha
As batalhas políticas de Soares, dentro e fora do PS, são infindáveis. São a sua vida e custaram-lhe mesmo alguns amigos e muitos inimigos. Foi marcante para o PS o seu desentendimento com o amigo Salgado Zenha, outro fundador do partido, que, em 1980, convenceu o PS a apoiar a recandidatura de Ramalho Eanes à Presidência da República contra a vontade de Soares e que levou à sua demissão como secretário-geral socialista. Eanes ganhou, Soares voltou a liderar o partido e Zenha acabou expulso do PS por vontade do então líder do PS.
Inesperadamente, 26 anos depois, Soares teria outra batalha ainda mais dura com outro camarada de partido e amigo de longa data: Manuel Alegre. Ambos se candidataram à Presidência da República e apesar de Soares ter o apoio do PS, Alegre conseguiu ter mais 350 mil votos. Cavaco Silva foi eleito Presidente com 50,54% dos votos. Foi a última batalha política de Soares e a mais pesadas derrota.
A candidatura terá começado a nascer a 7 de Novembro de 2004. Mais de 2000 amigos de Soares reuniram-se com ele na FIL para festejarem o seu 80.º aniversário. Soares tinha uma surpresa reserva para esse dia: com uma só palavra (“basta”) anunciava o fim da sua carreira política activa. Porém, apesar do “basta”, muitos dos presentes alimentavam já a ideia de voltar a ver Soares em Belém.
Soares admitiu mais tarde saber que muitos dos presentes na FIL tinham essa ideia na cabeça, garantindo, no entanto, que naquele momento essa não era a sua vontade.
Soares começa a ser pressionado para avançar por várias figuras do PS e outras personalidades de esquerda que viam no velho “leão” o homem ideal para derrotar Cavaco. E quando José Sócrates, então primeiro-ministro secretário-geral do PS, lhe garante total apoio (financeiro, político, máquina de campanha socialista e total liberdade), Soares avança para a sua terceira candidatura a Presidente da República. Só que Manuel Alegre também já estava praticamente na corrida, até porque Sócrates, ainda que indirectamente, lhe tinha deixado a ideia de que poderia contar com o apoio do PS.
Foi o próprio Alegre que revelou mais tarde que Sócrates lhe tinha pedido que reflectisse sobre sua eventual candidatura a Belém, mas depois acabou por o trair e dar o apoio Soares. O peso do PS e de Soares não demoveram Alegre. Pediu um empréstimo bancário e fez-se ao caminho com uma candidatura independente. O PS estava dividido como nunca. E a esquerda também, já que Jerónimo de Sousa (PCP), Francisco Louçã (BE) e Garcia Pereira (PCTP/MRPP) também foram a jogo.

Soares e Alegre e restantes candidatos de esquerda acabaram todos por perder para Cavaco. Os dois socialistas perderam também a velha amizade, mas Alegre ganhou a “guerra” entre camaradas, conseguindo quase mais 8% de votos que Soares.

A amizade foi retomada sete anos depois, quando Soares foi internado de emergência em estado muito grave. Com o patrocínio do então secretário-geral António José Seguro os dois socialistas voltaram a dar as mãos.







Com Cavaco Silva

Campanha para as eleições presidenciais de 1991, com os apoiantes Valentim Loureiro e Sousa Cintra

Com António Costa, no doutoramento honoris causa da Universidade de Lisboa atribuído aos ex-Presidentes da República Ramalho Eanes, Mário Soares e Jorge Sampaio, a 11 de Outubro de 2010

Em campanha para as presidenciais de 1991

Em campanha para as presidenciais de 1991, com Jorge Sampaio

Antes de um debate na televisão com Freitas do Amaral, em 5 de Fevereiro de 1986

Com François Mitterrand, em 23 de Outubro de 1986

Com Václav Havel, ex-Presidente da antiga Checoslováquia

Com José Eduardo dos Santos, em 30 de Maio de 1991

Num comício de António Costa na Aula Magna para as primárias do PS. 25 de Setembro de 2014

No Palácio de Belém

Com o antigo líder da UNITA, Jonas Savimbi

Com Fraçois Mitterrand, no Palácio do Eliseu, França

Com Maria Barroso e Fidel Castro

Durante as negociações para os Acordos de Paz de Bicesse, com o Presidente de Angola e líder do MPLA, José Eduardo dos Santos, e o antigo líder da UNITA, Jonas Savimbi

Com a rainha de Inglaterra, Isabel II

Com Vicente Jorge Silva e Jorge Wemans, antigos director e director-adjunto do Público, em Fevereiro de 1990

Com Ronald Reagan, na Casa Branca, EUA

Com o diplomata Henry Kissinger

Com o antigo Presidente da República Costa Gomes (à esquerda na imagem) e o antigo Presidente da República da Áustria, Kurt Waldheim

Discurso na cerimónia de adesão de Portugal à CEE, no Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa, em 12 de Junho de 1985

Com Cavaco Silva, em Fevereiro de 1994
Com Otelo Saraiva de Carvalho e Vasco Lourenço, em 1990


Com o antigo rei de Espanha, Juan Carlos, em 13 de Julho de 1991

Com António Guterres, em Dezembro de 1998

Campanha do PS para as Europeias de 1999

Campanha do PS para as Europeias de 1999

Assinatura para a adesão de Portugal à CEE, no Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa, em 12 de Junho de 1985

Com Pelé

Doutoramento honoris causa pela Universidade de Coimbra, em Janeiro de 1997


O último resistente que fundou a democracia

Soares e Zenha de um lado. Cunhal e Pato do outro. Os quatro marcaram a construção do Portugal pós-25 de Abril. Mas a relação entre eles nasce antes e passa pelas ligações pessoais.
SÃO JOSÉ ALMEIDA 7 de Janeiro de 2017

Mário Soares foi o último sobrevivente de uma escola de resistentes políticos ao Estado Novo que participaram na primeira linha da construção da democracia no pós-25 de Abril.

Fê-lo ao lado do seu camarada no PS, Francisco Salgado Zenha (22/05/1923 – 01/11/1993), e em confronto com o líder histórico do PCP, Álvaro Cunhal (10/11/1913– 13/06/2005), e o com o seu braço-direito e figura decisiva na direcção dos comunistas portugueses, Octávio Pato (01/04/1925 – 19/02/1999).

Por estas quatro figuras passou muito do que foi a construção da democracia em Portugal, quer nos Governos Provisórios, quer nos Governos Constitucionais, quer na Assembleia Constituinte, eleita a 25 de Abril de 1975, quer um ano depois na primeira Assembleia da República, quer na luta político partidária e na liderança das manifestações de rua. Em lados opostos das barricadas. Soares e Zenha defendendo a democracia liberal. Cunhal e Pato projectando o seu objectivo de fazer de Portugal um país comunista.

Mas se os quatro dirigentes de primeira água na democracia portuguesa têm os seus caminhos cruzados a partir do 25 de Abril, a sua relação nasce antes de 1974 durante a resistência ao Estado Novo, onde os quatro passaram cada um a seu modo pelas cadeiras da PIDE, pela clandestinidade ou pelo exílio. E se Cunhal e Pato permaneceram leais à sua militância comunista até ao fim, o PCP foi apenas o partido onde se iniciaram politicamente Mário Soares e Salgado Zenha.

Entre Soares e Zenha, Cunhal e Pato, mesmo antes das relações políticas, nasceram relações pessoais. É no Colégio Moderno, fundado pelo seu pai, o pedagogo João Soares, que Mário Soares, nascido em 7 de Dezembro de 1924, conhece Álvaro Cunhal, que no início da década de quarenta foi responsável pela área de acompanhamento dos alunos e funcionou como uma figura tutelar perante o jovem Soares.

É através de Cunhal que Soares se aproxima do PCP e integra o Movimento de Unidade Nacional Antifascista (MUNAF) e anos depois, em 1946, a Comissão Central do Movimento de Unidade Democrática (MUD) e funda o MUD Juvenil. Soares só romperá com o PCP uma década depois, em meados dos anos cinquenta.

Da mesma década de quarenta vem a relação pessoal de Soares e Pato, uma amizade tão sólida que mesmo em pleno PREC (Processo Revolucionário Em Curso), as tensas relações PS-PCP eram superadas pela ligação pessoais entre ambos. Octávio Pato perde o seu irmão Carlos, morto pelos agentes da PIDE ao ser torturado, na sequência das greves de 1944. Um ano depois, Pato mergulha na clandestinidade e integra o MUD-Juvenil onde conhece Soares, em casa de quem Pato chega a viver – é conhecido o tom de amizade e admiração com que falava da mãe de Soares, Elisa Nobre Baptista. E é o amigo Mário que já como advogado representará o preso político, Octávio.

Também na Comissão Central do MUD Juvenil se conheceram Soares e Zenha, que à época liderava a Federação das Juventudes Comunistas Portuguesas em Coimbra, depois de, em 1944, ter sido o primeiro presidente eleito da Direcção da Associação Académica de Coimbra. Desde o MUD Juvenil inicia-se uma forte ligação entre Soares e Zenha que será estreitada quando ambos deixam o PCP uma década depois e que os levará a juntos construírem o PS em 19 de Abril de 1973.

A ruptura definitiva entre os dois surgirá em 1979, quando Zenha lidera dentro do Secretariado do PS, um movimento de apoio a Ramalho Eanes, enquanto candidato à reeleição como Presidente da República. Em protesto, Soares demite-se de secretário-geral. Reconquistará o partido em 1981, e instaurará um processo interno a Zenha, expulsando-o então de líder parlamentar.

O confronto anunciado entre os dois” irmãos socialistas” dá-se em 1985, quando ambos se enfrentam cara-a-cara precisamente na primeira volta das Presidenciais. Uma eleição a que Cunhal nunca se apresentou, mas em que Pato foi o primeiro candidato do PCP, em 1976.


Com Cavaco Silva como primeiro-ministro, em Maio de 1990

Campanha do PS para as Europeias de 1999

Exposição sobre a vida e obra de Mário Soares, nos Arcos de Valdevez

Na muralha da China, com Maria Barroso



Soares: as notícias do regresso do exílio


A Hemeroteca Municipal de Lisboa disponibilza uma selecção de diferentes publicações que noticiaram momentos decisivos do percurso político de Mário Soares e da história colectiva do país. Entre os momentos seleccionados estão o regresso do exílio em Paris, com a chegada à estação de Santa Apolónia, a 28 de Abril de 1974, no denominado "comboio da liberdade". Ou ainda a reunião com o general António de Spínola, então Presidente da República, no palácio da Cova da Moura, também na capital, noticiado no Jornal de Notícias do dia 29 de Abril.

A chegada a Lisboa, noticiada pelo diário A Capital, dá conta de que o líder do PS foi "abraçado pela multidão". A reunião de Mário Soares com o ex-Presidente da República António de Spínola no palácio da Cova da Moura foi noticiado, entre outros, pelo Diário Popular, mas também pelo jornal O Século, ambos com destaque na primeira página. O Jornal de Notícias de 29 de Abril de 1974 noticia na 1.º página a chegada de Mário Soares e a reunião com o general Spínola.
O jornal assinala na fotografia, com um círculo, o rosto de Mário Soares, dando conta de que este foi "recebido em apoteose", e afirma que "a manifestação prolongou-se até ao Palácio da Cova da Moura", onde "conferenciou durante meia hora" com Spínola.

Após a revolução do 25 de Abril de 1974, Mário Soares regressou do exílio em França e foi ministro dos Negócios Estrangeiros e primeiro-ministro entre 1976 e 1978 e entre 1983 e 1985, tendo pedido a adesão de Portugal à então Comunidade Económica Europeia (CEE), em 1977, e assinado o respetivo tratado, em 1985. Em 1986, ganhou as eleições presidenciais e foi Presidente da República durante dois mandatos, até 1996.
























O adeus a Mário Soares













Mário Soares, 92 anos em nove pequenas histórias

Episódios que não constroem a história de Soares, mas ajudam a conhecê-lo.

Aos 90, a festa foi memorável. O Espaço Tejo, na antiga FIL, encheu-se de amigos, fiéis e assim-assim – 275, mais precisamente. Portugueses e não só. Até os adversários de outros tempos marcaram presença. Passaram dois anos, e, durante esse período, Mário Soares perdeu a companheira de mais de seis décadas, Maria Barroso, que morreu na sequência de uma queda em casa, em Julho de 2015, aos 90 anos. Também foi deixando de aparecer em público, ausentando-se, por conselho médico, das reuniões do Conselho de Estado de que é membro permanente. No dia 7 de Dezembro fez 92 anos.

1. A mosca no café

Esta é uma história sobre um café com uma mosca dentro. Talvez Mário Soares nem tencionasse recordá-la, em entrevista a Anabela Mota Ribeiro, há 12 anos, mas a verdade é que a deixou escapar, depois de falar sobre a mãe e as ausências do pai. Contava Soares que o pai, republicano progressista, esteve muito tempo fora, exilado e preso e na clandestinidade. “Só começámos a conviver com os meus 13, 14 anos. Antes, o meu pai aparecia como uma figura mítica, nos sítios mais estranhos, para eu o poder ver e para ele me poder ver a mim.” Num desses encontros fugazes, Soares foi com a mãe e com o irmão a Peniche para ver o pai embarcar para os Açores. “Fomos de carro, chegámos lá e vi o barco. A minha mãe desesperada, o meu irmão e eu, tinha menos de dez anos, vimos o meu pai a ir para os Açores, não me posso esquecer. Depois meteram-me num café em Peniche e uma coisa que fixei: a minha mãe ia a beber o café e tinha uma mosca dentro!” Num momento de tristeza, Soares recorda o incómodo da mosca no café.

2. Debate à antiga

O cruzamento das vidas de Álvaro Cunhal e Mário Soares dava um romance. Dois homens da mesma época, de espectros políticos distintos mas próximos, ambos intelectuais e inteligentes, diferentes um do outro, capazes de elevar a discussão política e, ainda assim, ambos a concorrerem pelo seu lugar na História e na revolução. O lugar de cada um ficará para sempre marcado pelos inúmeros episódios, atitudes e discursos que produziram. Mas há um momento que, no pós-25 de Abril e depois de o país ter finalmente conhecido o sonho de liberdade que os dois andavam a vender sob o rótulo do socialismo e da social-democracia, ilustra a relação de admiração e respeito mútuo que alimentavam. É a célebre entrevista à RTP, emitida a 6 de Novembro de 1975. A do "olhe que não, olhe que não" dito por Cunhal, respondendo à acusação de Soares de que o PCP queria transformar Portugal numa ditadura. Durante 210 minutos – sim, foram três horas e meia – Joaquim Letria e José Megre moderaram o debate em que nenhum dos intervenientes se furtou aos temas densos. E até fumaram em estúdio, enquanto se discutia a diferença entre democracias ocidentais e democracias populares, enquanto se falava de socialismo e liberdades, de revolução e contra-revolução, de reformas sociais, de liberdade de imprensa, de ódio e intolerância. O frente-a-frente teve dois blocos com um intervalo a meio e não houve limite de tempo à partida.



3. Um homem do mundo

Ainda na década de 70, quando começou a falar-se em Comunidade Económica Europeia (CEE), em Portugal havia muitos eurocépticos. Não era o caso de Mário Soares, que se tornou um dos padrinhos da adesão de Portugal à CEE. Obrigado a viver no estrangeiro nos anos do exílio, o ex-Presidente da República era o mais cosmopolita dos políticos portugueses. A relação com a Europa não só era fácil para si, como era natural. Nos anos em que viveu em Paris, partilhou momentos com líderes históricos como Olof Palme, Pietro Nenni, Willy Brandt e até Salvador Allende. “Seguir a política francesa diariamente constituiu uma aprendizagem política de excepção”, disse o próprio. Uma expressão sua, proferida anos mais tarde, ficará para a história: “Mon ami, Mitterrand.” Soares referia-se ao ex-Presidente da República francesa com intimidade, porque era intimidade que havia entre os dois. “Quando fui visitar Paris, levei o Cesariny comigo, porque ele foi expulso de França, no tempo do De Gaulle, por causa da homossexualidade. Apresentei-o ao Mitterrand: ‘Olha, vocês expulsaram aqui este amigo que eu trago, que é um tipo de génio, mas homossexual, como muitos outros’”, recordou Soares a Anabela Mota Ribeiro.

4. Marinha Grande é do povo

Na altura em que Mário Soares se iniciou na política ainda não se usava o termo soundbyte, mas com ele era muito fácil ter frases que agarravam, que ficavam no ouvido – quem não se lembra da célebre “Soares é fixe”? Uma delas encerra toda uma história. “A Marinha Grande é do povo, não é de Moscovo.” Em plena campanha para as presidenciais de 26 de Janeiro de 1986, com a esquerda dividida em quatro candidatos, Soares foi alvo de insultos e de um projecto de bofetada que ficou para a história, quando se preparava para uma visita à Fábrica-Escola Irmãos Stephens. A Marinha Grande era então um bastião comunista que tinha, à entrada, uma placa a dizer: “Moscovo.” Na sequência da zaragata em que a comitiva se viu envolvida, o candidato lançou as palavras de ordem que marcaram a campanha: “A Marinha Grande é do povo, não é de Moscovo.” Nestas eleições não ganhou Freitas do Amaral, o candidato da direita unida que estava mais bem colocado. Venceu Soares, à segunda volta (a única que houve em Portugal até hoje) e com o apoio do PCP.

5. Desbloqueador de problemas

Ano de 1989. A Europa vive momentos históricos e Mário Soares assiste a uns quantos como espectador bem colocado. Em Praga, dá-se a Revolução de Veludo da qual Vaclav Havel acaba por sair Presidente, eleito a 29 de Dezembro. O intelectual está para tomar posse no último dia do ano como Presidente da República Checoslovaca (foi o último, antes da dissolução e cisão entre a República Checa e a Eslováquia), mas depara-se com um problema: o carro em que deve ir para a cerimónia é soviético. Vaclav Havel, o ícone da revolução, não aceita dar esse sinal ao povo. Apesar de a Checoslováquia não ser propriamente um país vizinho de Portugal, acabou por ser Mário Soares a resolver o problema. Ali presente por sugestão de Leonor Beleza, o então Presidente da República português envolveu-se no assunto, desbloqueou contactos e Vaclav Havel acabou a tomar posse num Renault 21 de matrícula portuguesa. Não é dos episódios mais importantes da vida de Soares, é certo, mas na ocasião serviu para demonstrar, com eficácia, a sua capacidade para resolver problemas.

6. Forças de bloqueio

Os episódios do eixo Belém-São Bento – Soares na Presidência e Cavaco na chefia do Governo – são muitos e não há um mais memorável do que os outros. Mas o facto de o primeiro-ministro de então ter criado uma expressão para se referir esta relação tem a sua relevância. Cavaco chamou “forças de bloqueio” aos partidos da oposição que faziam valer, na Assembleia da República, a sua condição maioritária, atrasando discussões, chumbando propostas do Governo e actuando de forma a impedi-lo de levar a cabo a tarefa de governante. Mas a mais importante dessas forças era, sem dúvida, Mário Soares. Na segunda fase do mandato, já com Cavaco em situação de maioria absoluta, Soares vetou 30 diplomas (23 dos quais decretos-lei do Governo), lançou as Presidências Abertas (o pretexto ideal para levar, ao país real, a visão soarista da solução para o país) e ainda organizou o congresso Portugal Que Futuro?, no dia em que Cavaco estava no Pulo do Lobo. “Uma ingerência”, bradaram os cavaquistas. A parte boa é que Soares nunca criticava o Governo fora de Portugal. Isto dito por um antigo ministro dos Negócios Estrangeiros.

7. Aventuras exóticas

Hão-de ficar para a posteridade as fotografias de Mário Soares, enquanto Presidente da República, nas suas aventuras pelo mundo fora. Uma delas mostra o político de boné, camisola verde de marca e calções beges montado em cima da carapaça de uma tartaruga centenária, nas Seychelles. Outra mostra-o na Índia, a andar de elefante. Quem fez as contas garante que, só entre 1986 e 1996, Soares foi a 57 países, a muitos deles mais do que uma vez (por exemplo, a Espanha terá ido 24 vezes e a França 21). Ao todo, nesse tempo, percorreu 992.809 quilómetros. As viagens de Soares são, por isso, lendárias e deram até origem a uma anedota/adivinha que diz assim: "Qual é a diferença entre Deus e Mário Soares? Resposta: Deus está em toda a parte e Soares já lá esteve." Para um agnóstico, esta piada é uma espécie de medalha. E em matéria de medalhas e condecorações, Mário Soares também foi um Presidente que deixou marcas. Em dez anos, entregou mais do que qualquer outro: 2505 (0,68 por dia).

8. 80 anos ao jantar

No dia 7 de Dezembro de 2004, no local onde viria, dez anos depois, a celebrar os 90 anos, Mário Soares fez o jantar do seu 80.º aniversário. Perante duas mil pessoas, anunciou o que muitos entenderam ser o ponto final na sua carreira política. Podia ter sido, mas não. Oito meses depois, no Hotel Altis, em Lisboa, estava a apresentar o manifesto eleitoral de uma nova candidatura a Belém, a terceira. O resto já se sabe. É a história de uma luta política, acima de tudo fratricida (o PS dividiu-se entre o apoio a Mário Soares e a Manuel Alegre), que culminou em derrota. Soares acreditava que Cavaco Silva seria um flop como Presidente da República e queria impedir que o país abraçasse de novo o cavaquismo. Mas, após dez anos fora da política e depois de uma primeira derrota contra Jorge Sampaio, Cavaco ganhou à primeira volta e Manuel Alegre ficou em segundo lugar. Soares teve menos de 15% dos votos, o pior resultado de sempre para um homem que foi duas vezes Presidente da República, três vezes primeiro-ministro, ministro, líder partidário, deputado, eurodeputado…

9. Duas zangas improváveis
Na sua longa vida, Mário Soares não fez só amigos. Coleccionou adversários políticos e riscou vários amigos da sua vida. Dois dos mais marcantes foram Salgado Zenha e Manuel Alegre. As zangas, separadas no tempo por 20 anos, estiveram ambas relacionadas com razões eleitorais – eleições presidenciais, mais concretamente. A primeira não foi inesperada. “O Zenha não me magoou muito porque não foi uma coisa que considerasse inesperada. Percebi que havia um distanciamento dele em relação a mim a partir dos últimos anos”, contou Soares em entrevista a Anabela Mora Ribeiro. “A cisão entre o Zenha e eu mesmo foi a propósito do Eanes, da 'crise do ex-secretariado', como se chamava. Fiz ali umas malfeitorias, ganhei o congresso e depois tive de varrê-los, tive de exercer o poder”, explicou. Os dois homens acabaram a disputar a cadeira de Belém, dividindo a esquerda. Ganhou Soares, ao contrário do que aconteceu em 2006, quando o facto de Manuel Alegre ter avançado como independente dividiu o PS de tal modo que a vitória coube a Cavaco Silva. Os dois fizeram as pazes em 2013, por telefone. Foi António José Seguro que trabalhou para a aproximação.

































































Um guia para ler sobre Mário Soares

Um grande obituário, um especial multimédia, uma cronologia digital e vários artigos de opinião são alguns dos trabalhos que publicamos sobre Mário Soares.

A morte de Mário Soares é aproveitada para recordar os anos democráticos de Portugal, e por isso é que se justifica esta imensa biografia histórica que dedicamos ao ex-Presidente da República, juntamente com uma cronologia digital do percurso de uma vida única, uma fotogaleria que recupera imagens que são de todos nós, outra galeria com cartazes que fizeram história e uma mapa com alguns dos lugares marcantes da vida de Soares. Acima de tudo, não deixe de ver os vídeos da colecção Soares e Eu, em que 27 personalidades recordam a relação que viveram com esta carismática figura da vida política portuguesa.




O homem que gostava de ser amado mas nunca se preocupou em ser consensual deixa um legado histórico à sua medida. Mário Soares cruzou a segunda metade do século XX e com ela todas as grandes derivas históricas: o fim do colonialismo, a construção europeia, a queda do muro de Berlim, o fim da guerra fria e a primeira guerra do Iraque. Em todas, Soares esteve do lado certo da história, tendo sido personagem importante em alguns desses momentos. Carlos Gaspar conta aqui como foi o mundo que Soares conheceu.

E com nove pequenas histórias começamos a olhar para o outro lado da vida do homem que ajudou a fazer Portugal o que o país é hoje. Teresa de Sousa recorda como Mário Soares amava a liberdade: “É essa a sua herança nestes tempos conturbados que vivemos”. E com ele, há uma geração de políticos que se despede, como aqui recorda São José Almeida.

Soares não era imune a polémicas e por isso nunca as temeu. Foi a face de uma descolonização atabalhoada que o país absorveu de forma notável, envolveu-se em histórias sujas em Macau e ganhou inimigos e perdeu amigos em eleições disputadas até ao tutano. Luciano Alvarez recorda aqui as principais polémicas de uma vida cheia.

Várias personalidades (Jorge Sampaio, Miguel Esteves Cardoso, Vicente Jorge Silva, Rui Tavares, Joaquim Vieira, Francisco Louçã, António Valdemar) deixaram aqui a opinião sobre Mário Soares, o líder político que ganhou dez milhões de votos ao longo de uma vida política com onze corridas eleitorais. Temos ainda um editorial de David Dinis a dizer “Dr. Soares, obrigado”. E como queremos também saber o que pensa desta personagem incontornável da história portuguesa moderna, abrimos as nossas páginas à sua opinião: aproveite para deixar aqui algumas palavras sobre Mário Soares. E nesta página poderá encontrar todos os artigos publicados sobre a morte do ex-Presidente da República.