quinta-feira, 25 de maio de 2023

A sobrevida dos condes de Ferreira & C.ª

 É grave que o conde de Ferreira continue a ser apresentado como um benfeitor. É inadmissível que se continue a fazer de conta que não se sabe das origens escravocratas da sua “caridade”.

Cristina Roldão 25 de Maio de 2023

Conde de Ferreira
 
No quadro da exposição Vento (A)mar, os artistas Dori Nigro e Paulo Pinto apresentaram a instalação Adoçar a Alma para o Inferno III que discute o passado escravocrata do conde de Ferreira e que, por isso mesmo, viram a sua exposição censurada pelo Centro Hospitalar do Conde de Ferreira, tutelado pela Santa Casa da Misericórdia do Porto (SCMP). Foi através do dinheiro sujo do tráfico esclavagista, à custa da vida de cerca de 10 mil pessoas negras, que se construiu o Hospital do Conde de Ferreira, 120 escolas primárias e que foram apoiadas inúmeras obras sociais, como as Misericórdias. Não tendo demonstrado em vida ser um homem de “causas sociais”, Joaquim Ferreira dos Santos ter-se-á dedicado às mesmas, postumamente, com o objetivo de limpar o seu nome que, com a abolição, ficara publicamente manchado, como muitos dos que enriqueceram com o tráfico. Nada que trabalhos como Conde de Ferreira & C.ª, de José Capela, já não nos tivessem mostrado há vários anos ou que projetos recentes como Joaquim – O Conde de Ferreira e Seu Legado, de Nuno Coelho, não discutam.
 
Ora, no que aos dias de hoje diz respeito, é grave que o conde de Ferreira continue a ser apresentado como um benfeitor, glorificado na estatuária, na toponímia e noutros meios de memorialização. É inadmissível que hoje se beneficie desses equipamentos e serviços e se continue a fazer de conta que não se sabe das origens escravocratas da sua “caridade”. E o que é mais grave ainda é que instituições como o referido centro hospitalar se sintam à vontade para censurar trabalhos artísticos que colocam essas continuidades coloniais a nu. Esperemos que a instituição recue e se demarque rapidamente da decisão do seu administrador e do seu diretor clínico – Ângelo Duarte e Nuno Trovão –, peça publicamente desculpa e se posicione do lado certo da história, reabra o acesso à instalação e inscreva de uma vez por todas na sua “memorália” o envolvimento escravocrata do seu patrono. Esperemos também que a Câmara Municipal do Porto, a Direção-Geral das Artes e outras instituições com responsabilidades não fiquem em silêncio. Ou será pedir muito ao país da vocação para o diálogo entre os povos?
 
Este caso remete-nos para a necessidade de olhar o racismo não só como algo que violenta pessoas racializadas, mas também enquanto relação que beneficia pessoas brancas, no passado e no presente, isto é, enquanto “privilégio branco”. São poucos aqueles que vão rompendo este silêncio. Alguns, corajosamente, expuseram as origens escravocratas da fortuna das suas famílias, como é o caso de Francisco Sousa, que se considera um “afro-beneficiário”, ou de Catarina Demony, jornalista que realizou recentemente o documentário Debaixo do Tapete. Há também quem, como o meu colega e amigo Pedro Varela, investigue as origens escravocratas e coloniais das fortunas de grupos poderosos, como a família Ulrich ou o empresário, apoiante do partido Chega, João Maria Bravo. Aline de Biase Albuquerque, por sua vez, tem estudado o caso de Ângelo Francisco Carneiro, que, de traficante de pessoas escravizadas, passou a visconde de Loures. O seu palacete em Loures é hoje a morada do Grémio Literário.
 
Este é um debate melindroso para famílias e grupos com responsabilidade no tráfico transatlântico de pessoas escravizadas, não só pela nódoa simbólica, mas por poder vir a “despertar” maior contundência nas reivindicações por reparações materiais. Se há quem se sinta incomodado e critique um suposto desvio “subjetivo” da luta antirracista, eis que tem aqui a oportunidade de mergulhar na “objetividade” das continuidades coloniais em Portugal. Não é?

O traficante de escravos que ofereceu 120 escolas a Portugal

Na história nada simples nem linear da escravatura avultam personagens paradoxais como Edward Colston, cuja estátua, em Bristol, foi derrubada na semana passada por manifestantes antirracistas. Mas Portugal também teve figuras destas, como o 1.º conde de Ferreira, benemérito da saúde e da instrução pública graças à fortuna amealhada no tráfico negreiro entre Angola e a costa do Brasil.

Retrato do 1.º conde de Ferreira

Convencido de que a instrução pública é um elemento essencial para o bem da sociedade, quero que os meus testamenteiros mandem construir e mobilar cento e vinte casas para escolas primárias de ambos os sexos nas terras que forem cabeças de concelho, sendo todas por uma mesma planta e com acomodação para vivenda do professor." Assim determinava, já entrado nos anos, o 1.º conde de Ferreira, nascido sem brasão e registado, segundo o assento paroquial, como Joaquim Ferreira dos Santos, filho de agricultores pobres do norte de Portugal.

A generosidade do gesto, que dotava o reino, sempre parco em instrução pública, de uma primeira rede de ensino elementar, terá sido reconhecido pelos seus contemporâneos. À boca pequena alguns ainda lhe chamariam "brasileiro", nome então dado aos portugueses de torna-viagem que tinham conseguido amealhar fortuna na antiga colónia, enquanto outros, decerto mais raros, talvez ainda lembrassem que na origem desse sucesso estavam os vastos lucros do comércio negreiro, entre Angola e o Rio de Janeiro, Bahia ou Pernambuco, para abastecer de mão-de-obra jovem e vigorosa os engenhos da colónia tornada independente em 1822. Milhares de homens, mulheres e crianças arrancados às suas aldeias em África e metidos à força, acorrentados, no insalubre porão de navios cargueiros. Os que morriam durante a travessia (e não eram poucos) eram prontamente lançados ao mar. Os que chegavam eram leiloados em praça pública como vulgar mercadoria, à mistura com marfim e animais de carga.
Assim fora durante muito tempo, mas, nas primeiras décadas do século XIX, o impacto dos movimentos abolicionistas na opinião pública tornou tal prática um negócio degradante. As mãos dos que a ele se dedicavam tinham enriquecido soberanos, que não se coibiam de cobrar a sua percentagem nos lucros como acontecia com os nossos reis D. Manuel I ou D. João III, mas a gradual consciencialização dos direitos humanos das populações escravizadas passou a vê-las maculadas de sangue.
Na segunda metade do século XIX, Eça de Queiroz dava conta, em Os Maias, da repugnância que as fortunas obtidas com tal tráfico tinham passado a suscitar. A burguesia lisboeta começara por admirar a extrema beleza de Maria Monforte, mas, invejosa, não tardou a aplicar-lhe o epíteto malsão de "a negreira". Quando Pedro da Maia todo se arrebatou pela beldade, disposto a casar, o pai dele, Afonso, viu nesse amor a ameaça da desonra e do estigma social. Porquê? Porque "havia uma treva na história do Monforte. Parece que servira algum tempo de feitor numa plantação da Virgínia... Enfim, quando reapareceu à face dos céus comandava o brigue Nova Linda, e levava cargas de pretos para o Brasil, para a Havana e para a Nova Orleães. Escapara aos cruzeiros ingleses, arrancara uma fortuna da pele do africano, e agora rico, homem de bem, proprietário, ia ouvir A. Corelli a São Carlos". A fortuna, manchada de sangue inocente, assombrava o próprio futuro da filha.
Monforte procurava esconder os fantasmas do passado com os novos hábitos requintados, exibidos no "palco" do Chiado, ou com as toilettes da linda filha. Outros, que não foram personagem de ficção como 1.º visconde de Loures (1791-1858), mandaram erguer palacetes como aquele que hoje acolhe o Grémio Literário. Manuel Pinto da Fonseca, proprietário de várias feitorias na costa ocidental africana e no Brasil, foi benemérito de várias ordens religiosas, entre as quais a do Bom Jesus de Braga, cidade de onde era originário. Mais de 200 anos antes, quando a escravatura ainda era vista como qualquer outro negócio, o próprio Edward Colston, cuja estátua foi agora derrubada em Bristol, adquiriu notoriedade pública ao transformar parte dos seus muitos dividendos obtidos no comércio negreiro na construção de hospitais para os pobres da cidade. Assim conseguiu a gratidão dos seus conterrâneos e um lugar no Parlamento britânico.

Nobreza fresca e filantropia

Nascido no Porto em 1782, Joaquim Ferreira dos Santos embarcou para o Brasil em 1800, levando consigo pouco mais do que uma carta de recomendação, dirigida a um parente que se encontrava estabelecido como comerciante no Rio de Janeiro. Ali, ajudado e protegido pelo seu parente, foi prosperando no negócio, dedicando-se ao comércio por consignação de produtos enviados da então metrópole.

Fosse porque Joaquim era, por sua natureza, irrequieto, fosse porque as guerras napoleónicas ameaçavam a estabilidade do comércio com a Europa, em breve reforçava os negócios entre a sua casa e a praça de Buenos Aires, ao mesmo tempo que dirigia as suas atenções para África. Na costa angolana montou três postos cujo principal objetivo era a exportação de escravos para os engenhos brasileiros de açúcar e cacau, dando lucrativa continuidade a um comércio secular entre as duas costas atlânticas que se manteve mesmo após a independência do Brasil, em 1822 (a ponto de vários negociantes angolanos terem chegado a equacionar a hipótese de se unirem à coroa do Brasil, em detrimento da soberania portuguesa).

Já viúvo e sem filhos, regressou a Portugal, dedicando-se, pelo menos à luz do dia, à banca e a outros investimentos financeiros. Rico como Midas, viu no liberalismo emergente uma oportunidade de afirmação social. Faltavam-lhe pergaminhos de nascimento? Em plenas lutas entre liberais e miguelistas declarou-se partidário da causa política da pequena rainha D. Maria, para a qual contribuiu financeiramente com avultadas somas. O favor não foi esquecido pelo novo poder: feito visconde e, mais tarde, conde (com direito a brasão de armas), tornou-se par do reino por Carta Régia de 3 de maio de 1842. Mais tarde foi membro do Conselho de Sua Majestade, comendador da Ordem Militar de Cristo e da Ordem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa, e recebeu, em Espanha, a Grã-Cruz da Ordem de Isabel, a Católica.
 

Das 120 escolas projetadas, só 90 foram construídas e 70 resistiram até hoje, como esta em Setúbal

Das 120 escolas projetadas, só 90 foram construídas e 70 resistiram até hoje, como esta em Beduído

Das 120 escolas projetadas, só 90 foram construídas e 70 resistiram até hoje. Como esta, no Montijo

O novo conde de Ferreira não se limitaria, todavia, a passear as condecorações pelos corredores do paço. Era um homem de ação e a proximidade com o poder político não lhe retirara essa faceta. Informava-se, lia, acompanhava o que de mais moderno se passava por essa Europa fora. Certa vez, o rei D. Pedro V, filho e sucessor de D. Maria II, que morrera nova, falara-lhe da sua preocupação com o abandono a que eram votados os doentes mentais - os alienados, na linguagem da época. O conde ficou a matutar no caso. Do mesmo modo, inquietava-o a falta de acesso dos jovens portugueses, nomeadamente os mais pobres, às primeiras letras.

No seu testamento deixaria, pois, os recursos financeiros para ajudar a colmatar tais lacunas. Em 1883 inaugurava, no Porto, o primeiro hospital português pensado de raiz para a psiquiatria, que receberia o nome do seu benemérito. Aí seriam instalados doentes vindos de Santo António de Rilhafoles, assistidos por alguns dos mais conceituados médicos especialistas da época.

Este cuidado que evidencia, pela riqueza de pormenores, uma longa reflexão sobre o tema, estendeu-se à sua disposição para criar uma rede de 120 escolas públicas de norte a sul de Portugal. Do seu testamento consta o primeiro tipo de planta concebido de origem para servir de escola primária, com uma arquitetura utilitária e facilmente identificável. Por razões de eficácia económica, os edifícios eram uniformizados, incluindo o escolar, de linhas depuradas, com fachada encimada por frontão triangular com sineira, porta axial e uma janela de cada lado. Na fachada podia ler-se 24 de março de 1866 (data da morte do benfeitor) e o seu nome. Destinada a rapazes e raparigas, incluía ainda muitas vezes uma modesta residência para o docente. Das 120 escolas previstas, foram construídas 91. Desse conjunto hoje restam cerca de 70, algumas ainda na sua função primitiva e outras adaptadas a outros serviços municipais.

O que fez "correr" homens como este? A necessidade de comprar o esquecimento dos seus contemporâneos, a simples vaidade ou o íntimo impulso de limpar a consciência? No requinte das vidas novas que construíam, que fantasmas os assombravam à noite? Sendo o espírito humano o mais imperscrutável dos continentes, o mais provável é que nunca o saibamos.
 
 
 
 
 
 

quinta-feira, 18 de maio de 2023

Vazamento desmascara Zelensky, que ambiciona avançar sobre a Rússia


Uma série de vazamentos de inteligência dos EUA, chamados de Discord Leaks, revelam um presidente ucraniano capaz de jogo sujo e o Pentágono ciente de tudo, entre outros segredos

por Cezar Xavier  Publicado 16/05/2023

O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, utiliza inovações tecnológicas em captura de vídeo volumétrico 3D, para transmissão de seu holograma em reuniões pelo mundo. (foto Divulgação)

Enquanto o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, viaja pela Europa repetindo a retórica de um país vítima de um ataque despropositado que precisa de ajuda para se defender, suas comunicações internas com os principais assessores e líderes militares revelam um homem agressivo, capaz de jogo sujo para avançar sobre o território russo.

Os documentos obtidos com exclusividade pelo The Washington Post, fazem parte de um vazamento mais amplo de segredos dos EUA divulgados na plataforma de mensagens Discord. Mostram também que o Pentágono, de onde vieram os documentos, está ciente de toda a movimentação e intenções do governo ucraniano, inclusive das ameaças de atacar a Rússia, que a Casa Branca evita.

Embora o The Post destaque os temas relativos a condução de Zelensky para a guerra, o vazamento vai muito além, e como já ocorreu em outros casos, pode criar problemas diplomáticos para além da região da Península da Crimeia. Mostra a preocupação dos americanos com a fragilidade da defesa aérea na Coreia do Sul e em Taiwan, por exemplo, ou vínculos militares entre Emirados Árabes e China. O Pentágono está ciente de que a Rússia tem fôlego para, ao menos, mais um ano de guerra, e preocupa-se com ameaças espaciais da Rússia e da China.

Os vazamentos revelaram a preocupação da agenda global do presidente Biden com o fato das principais nações em desenvolvimento evitar o impasse cada vez maior entre os Estados Unidos, a Rússia e a China e, em alguns casos, explorar essa rivalidade para seu próprio ganho. Os documentos citam Índia, Brasil, Paquistão e Egito.

Face pública e privada

O vazamentos revelam um Zelensky que contrasta com sua imagem pública do estadista calmo e devotado ao seu povo, resistindo ao ataque brutal da Rússia. As revelações foram obtidas por meio de comunicações digitais interceptadas, fornecendo uma visão rara das deliberações de Zelensky em meio a barragens de mísseis russos, ataques à infraestrutura e crimes de guerra.

Ele tem conquistado a confiança dos governos ocidentais ao se recusar a usar as armas que fornecem para ataques dentro da Rússia e priorizar como alvo as forças russas dentro das fronteiras da Ucrânia.

Mas a portas fechadas, o líder da Ucrânia propôs ir em uma direção mais audaciosa – ocupando aldeias russas para ganhar vantagem sobre Moscou, bombardeando um oleoduto que transfere petróleo russo para a Hungria, um membro da OTAN, e ansiando em particular por mísseis de longo alcance para atingir alvos dentro das fronteiras da Rússia.

Segundo o jornal americano, quem vazou centenas de páginas de informações classificadas de inteligência militar foi Jack Teixeira, um jovem membro da Guarda Aérea Nacional de Massachusetts, que está preso. Ele compartilhou os documentos com um pequeno círculo de amigos na plataforma de bate-papo Discord.

Longe da paz

Os documentos revelam profundas preocupações sobre a trajetória da guerra e a capacidade de Kiev de travar uma ofensiva bem-sucedida contra as forças russas. De acordo com uma avaliação da Agência de Inteligência de Defesa, entre os documentos vazados, “as negociações para encerrar o conflito são improváveis durante 2023”.

Os arquivos incluem resumos de inteligência e conversas de alto nível entre líderes mundiais, bem como informações sobre tecnologia de satélite avançada que os Estados Unidos usam para espionar. Também incluem inteligência sobre aliados e adversários, incluindo Irã e Coreia do Norte, bem como Grã-Bretanha, Canadá, Coreia do Sul e Israel.

Raiva da Hungria

Em alguns casos, Zelensky é visto restringindo as ambições de seus subordinados; em vários outros, é ele quem propõe ações militares arriscadas.

Em uma reunião em meados de fevereiro com a vice-primeira-ministra Yuliya Svrydenko, Zelensky sugeriu que a Ucrânia “explodisse” o oleoduto Druzhba, construído pelos soviéticos, que fornece petróleo à Hungria. “Zelenskyy destacou que … a Ucrânia deveria simplesmente explodir o oleoduto e destruir a provável indústria húngara do [primeiro-ministro] Viktor Orban, que é fortemente baseada no petróleo russo”, diz o documento.

Ao detalhar a conversa, oficiais de inteligência admitem que Zelensky estava “expressando raiva contra a Hungria e, portanto, poderia estar fazendo ameaças hiperbólicas e sem sentido”, uma qualificação que não acompanha os outros relatos de Zelensky sugerindo uma ação militar ousada. Embora a Hungria seja nominalmente parte da aliança ocidental, Orban é amplamente considerado o líder europeu mais amigo do Kremlin.

O risco nuclear

Zelensky não se intimidou diante das revelações, e afirmou que será capaz das mesmas práticas que critica na ofensiva russa. Durante uma entrevista ao The Post em Kiev, o presidente rejeitou as alegações de inteligência dos EUA como “fantasias”, mas defendeu seu direito de usar táticas não convencionais na defesa de seu país.

“A Ucrânia tem todo o direito de se proteger e estamos fazendo isso. A Ucrânia não ocupou ninguém, mas vice-versa”, disse Zelensky. “Quando tantas pessoas morreram e houve valas comuns e nosso povo foi torturado, tenho certeza de que teremos que usar todos os truques.”

O uso de mísseis de longo alcance para atingir o interior da Rússia é um tema particularmente delicado para a Casa Branca, que há muito teme que o conflito na Ucrânia possa ficar fora de controle e forçar um impasse catastrófico entre os Estados Unidos e a Rússia, a maior potência nuclear do mundo.

Embora Washington tenha dado a Zelensky bilhões de dólares em armamento avançado, o presidente Biden rejeitou o pedido do líder ucraniano de mísseis de longo alcance, capazes de atingir alvos a até 300 km de distância. Desde o início da guerra, Biden disse que os Estados Unidos “não estão encorajando ou permitindo que a Ucrânia ataque além de suas fronteiras”. Questionado, Zelensky diz que não deu ordens neste sentido, negando as intenções reveladas pelos documentos.

Na semana passada, a Grã-Bretanha se tornou o primeiro país ocidental a fornecer à Ucrânia mísseis de longo alcance. O Storm Shadow, um sistema de mísseis de cruzeiro com capacidade furtiva, tem um alcance de 250 km, excedendo em muito o alcance de 80 km dos lançadores HIMARS fornecidos pelos EUA.

Zelensky disse acreditar que os Estados Unidos não estão enviando as armas porque não confiam em Kiev. “Acho que eles têm medo de que possamos usá-los no território da Rússia”, disse Zelensky ao The Post, reafirmando sua intenção defensiva.

Embora não haja indicação de que a Ucrânia tenha usado mísseis ocidentais para atacar o território russo, o mesmo não pode ser dito sobre o uso de drones armados por Kiev.

Explosões causadas por veículos aéreos não tripulados tornaram-se uma ocorrência regular na Rússia, inclusive em Rostov, onde um drone caiu em uma refinaria de petróleo neste mês. As autoridades ucranianas costumam ser discretas sobre os incidentes, insinuando que são responsáveis sem assumir o crédito diretamente.

A Rússia acusou este mês a Ucrânia de encenar um ataque de drones com o objetivo de matar o presidente Vladimir Putin no Kremlin. Vídeos que circulam nas redes sociais mostram dois drones avançando em direção ao Kremlin. A alegação foi negada com veemência por autoridades ucranianas, incluindo Zelensky.

segunda-feira, 1 de maio de 2023

“Corrida ao ouro”: a procura dos tão desejados metais para carros eléctricos deixa um rasto de miséria

  
Um dos países mais pobres da Terra é crucial na transição energética. E exemplo de que, se não estivermos atentos, corremos o risco de repetir a crueldade de revoluções industriais anteriores.


Rachel Chason (Texto) e Chloe Sharrock (Fotografia), em Kagbani (Guiné-Conacri) 30 de Abril de 2023 


A aldeia de Dapilon fotografada em Setembro de 2022 CHLOE SHARROCK/MYOP/THE WASHINGTON POST

A Guiné, uma nação da África Ocidental com mais de 13 milhões de habitantes, tem as maiores reservas mundiais de bauxite – uma rocha avermelhada que é a principal fonte de alumínio. Esse metal leve, por sua vez, é essencial para veículos eléctricos, pois permite que percorram distâncias maiores sem recarregar do que se fossem feitos de aço. E ao longo da década actual, quando os especialistas esperam que as vendas globais de veículos eléctricos aumentem quase nove vezes, a procura por alumínio subirá quase 40%, para 119 milhões de toneladas anuais, segundo analistas do sector.

A Guiné já está a sentir o aumento sem precedentes nas suas exportações de bauxite, que aumentaram quase cinco vezes de 2015 a 2020, segundo estatísticas do Governo dos Estados Unidos, e os analistas prevêem que a produção continuará a aumentar drasticamente na próxima década. A região Noroeste do país, Boké, que está no epicentro da febre da bauxite, foi transformada por uma interminável cadeia de camiões e de comboios transportando o minério precioso ao longo de estradas e caminhos recém-construídos até aos portos costeiros.

Mas em toda a região de Boké, milhares de aldeões estão a pagar um preço demasiado alto, de acordo com dezenas de entrevistas com moradores de seis aldeias da região, grupos de monitorização sem fins lucrativos e especialistas do sector. O Governo guineense informou que centenas de quilómetros quadrados antes utilizados para agricultura foram adquiridos por empresas do sector mineiro para as suas operações e infra-estruturas associadas, como estradas, caminhos-de-ferro e portos. Os activistas e os habitantes locais afirmam que os aldeões receberam pouca ou nenhuma compensação. Segundo um estudo do Governo, nas próximas duas décadas mais de 80 mil hectares de terras agrícolas e 445 mil hectares de habitat natural serão destruídos pela mineração de bauxite – uma área quase do tamanho do estado americano de Delaware.

A impressionante procura por veículos eléctricos – que só para os pôr a trabalhar precisam habitualmente de seis vezes mais minerais por peso do que os seus equivalentes a combustíveis fósseis – está a impulsionar uma nova “corrida ao ouro” em relação a uma série de metais, incluindo bauxite, níquel, lítio e manganês, necessários para os construir e alimentar. Mas enquanto os veículos eléctricos são generalizadamente considerados essenciais para os esforços globais de combate às mudanças climáticas, os custos e as consequências não-intencionais de garantir estes minerais têm sido muitas vezes ignorados. Há pouca noção do preço que se paga por este tipo de exploração mineira – e que pode vir a ser cada vez maior – nas comunidades locais, nas pessoas, no ambiente e mesmo na estabilidade política, porque grande parte da actividade é feita em cantos remotos do mundo, de aldeias de pescadores na África Ocidental a ilhas distantes no Sudeste asiático.

Sem um levantamento completo, a transição para as energias verdes corre o risco de repetir a história cruel das revoluções industriais anteriores.

Quando uma empresa mineira chinesa chegou pela primeira vez, em 2016, à aldeia guineense de Kagbani, perto da costa atlântica, representantes da empresa e funcionários do Governo ofereceram empregos e dinheiro aos moradores em troca de centenas de hectares de terras agrícolas, recordou o aldeão Mohamed Sylla. Os moradores sentiram-se obrigados a aceitar.


Mohamed Sylla, pescador da aldeia de Kagbani CHLOE SHARROCK/MYOP/THE WASHINGTON POST


Pouco tempo depois, explosões de dinamite para construir uma estrada para a mina de bauxite destruíram as paredes de cimento da casa de Sylla, fazendo a sua esposa fugir por segurança e obrigando a família a mudar-se. Nos anos que se seguiram, disse, assistiu à destruição das colheitas de beringelas, milho e caju por camiões que transportavam bauxite e as barcaças que transportam o minério para o exterior afugentaram os peixes que antes eram abundantes.

Mulheres no Noroeste da Guiné disseram, em entrevistas, que agora desesperam por colheitas míseras e pescadores, como Sylla, de 30 anos, afirmou que capturam quantidades tão pequenas de peixe que mal conseguem sustentar-se. Os aldeões referiram que os empregos que lhes foram prometidos pela Société Minière de Boké (SMB) – consórcio que inclui uma subsidiária do maior produtor mundial de alumínio, a China Hongqiao Group – nunca se concretizaram. Os pagamentos em dinheiro mostraram-se profundamente decepcionantes.

“Estou frustrado”, disse Sylla, com as sobrancelhas arqueadas acima dos óculos escuros enquanto a voz ia alternando entre agitação e resignação silenciosa. “Mas, ainda mais do que isso, perdi a esperança.”

Sylla e outros moradores relataram que o escoamento da estrada da mina tornou imprópria para consumo a água em muitos dos rios e riachos. E, no ano passado, a bomba de água que a empresa de mineração tinha construído para a comunidade avariou e Kagbani ficou sem água.

Segundo Sylla, não foi difícil mobilizar os habitantes locais. Foram para a linha do comboio da SMB – que a empresa construiu em 2021 como meio adicional de transporte do minério – e bloquearam-na e recusaram-se a sair.

Após dois dias de protesto – um de muitos protestos na região nos últimos anos –, a empresa arranjou uma nova bomba de água, disse Sylla. Os aldeões deixaram a linha de comboio, mas, para Sylla, o abastecimento de água é consolo escasso para tudo o que perderam.

Explosão inesperada

Na estrada de terra vermelha que liga o porto costeiro às minas no interior de Boké, apareceu um enorme camião amarelo numa manhã de domingo, cortando o silêncio com a sua buzina. Dez segundos depois, apareceu outro. Depois outro, e outro, e outro.

Mesmo depois de uma noite de chuva intensa, os camiões da SMB levantavam nuvens de poeira que revestiam as palmeiras, cajueiros e mangueiras próximas da estrada. Os camiões já haviam feito a sua primeira entrega de bauxite do dia no porto e estavam a regressar às minas a céu aberto para buscar mais. Ainda nem eram 9h.

Uma aldeia junto à estrada mineira na região de Boké CHLOE SHARROCK/MYOP/THE WASHINGTON POST


O Governo da Guiné, na altura liderado pelo Presidente Alpha Condé, concedeu uma licença à SMB em 2015, ao mesmo tempo que a Indonésia e a Malásia restringiam as suas próprias exportações de bauxite devido a preocupações com a exploração estrangeira de recursos e a degradação ambiental.

Ao fim de seis meses, a SMB enviou a sua primeira tonelada de bauxite da Guiné, ainda antes de o Ministério do Ambiente ter concluído as suas avaliações de impacto ambiental, afirmam activistas.

A SMB rapidamente ultrapassou a Compagnie des Bauxites de Guinée – multinacional com 50 anos de existência, co-propriedade do Governo guineense e de empresas privadas, incluindo a americana Alcoa e a anglo-australiana Rio Tinto – para se tornar o maior produtor de bauxite da Guiné. Em apenas cinco anos, a produção aumentou tão rapidamente que a Guiné passou de uma quota de mercado de 6% da bauxite mundial para 22%.

A entrada para uma mina da empresa chinesa SMB perto da aldeia de Dapilon CHLOE SHARROCK/MYOP/THE WASHINGTON POST


Durante esse período, a revolução dos veículos eléctricos começou a ganhar força, impulsionada por uma procura sem precedentes na China, onde foram vendidos 1,8 milhões de veículos em 2020, o que exigiu quase 900 milhões de libras (mais de 408 mil toneladas) de alumínio, de acordo com a CRU, consultora empresarial que analisa as indústrias mineiras e de metais. Até 2030, quando a China, segundo as estimativas da CRU, deverá vender 18,5 milhões de veículos eléctricos, precisará de uns incríveis 8,8 mil milhões de libras de alumínio (4 milhões de toneladas).

Embora menor, o mercado dos EUA para veículos eléctricos também está a ganhar ritmo, projectando-se que cresça mais de cinco vezes entre 2020 e 2028. A cadeia de fornecimento de alumínio para fabricantes de automóveis americanos, incluindo a Ford, a General Motors e a Tesla, inclui bauxite extraída pelos dois maiores produtores na Guiné, de acordo com um relatório de 2021 da Human Rights Watch e do Inclusive Development International (IDI), um grupo de defesa dos direitos humanos com sede nos EUA que visa defender comunidades ameaçadas pelo desenvolvimento empresarial.

Ibrahima Diallo, antigo funcionário do Governo, afirmou que a rápida expansão da indústria de bauxite da Guiné é, em muitas formas, uma história de sucesso. O sector criou milhares de empregos e milhões de dólares anuais em receita fiscal. No entanto, o Governo estava mal preparado para o grande interesse nos minérios do país e faltavam meios para proteger o ambiente ou direccionar a receita para as áreas mais afectadas pelo boom.


 Ibrahima Diallo, antigo funcionário do Governo e agora instrutor e investigador em minas no seu escritório em Conacri Chloe Sharrock/MYOP/The Washington Post

"Não poderíamos imaginar, mesmo nós especialistas em mineração, que isso fosse possível", disse Diallo, que agora é instrutor e está a concluir o seu doutoramento em mineração. "Foi uma enorme explosão. E ninguém estava preparado."

“O que estão aqui a fazer?”

Aboubacar Dembo Diaby, chefe da aldeia de Dapilon, ficou perplexo quando avistou uma equipa de trabalhadores chineses a percorrer os campos de amendoim e batata naquela manhã de Primavera em 2016. Chegaram sem aviso, recordou, e estavam a cavar buracos com equipamento estranho, recolhendo amostras do solo vermelho-sangue.

“O que estão aqui a fazer?”, perguntou.

Os homens não falavam francês ou susu, a língua local, e Diaby não falava chinês ou inglês. Mas pouco depois, segundo ele, uma equipa de funcionários da SMB e do governo local chegou à sua aldeia sombreada por palmeiras para explicar. A empresa precisava de vastas extensões de terra perto de Dapilon para o principal porto da SMB. Em troca, Diaby disse que a empresa ofereceu aos habitantes da aldeia um pagamento único que variava de 200 (168 euros) a 450 dólares (cerca de 380 euros).

Aboubakar Dembo Diaby, chefe da aldeia de Dapilon CHLOE SHARROCK/MYOP/THE WASHINGTON POST

N'Näissata Dansoko, viúva e mãe de sete filhos, disse que inicialmente estava optimista ao ouvir os representantes da empresa falar sobre trazer electricidade, um hospital e programas de formação de emprego para a aldeia. Dansoko, que não sabe ler, contou ter assinado o documento desistindo dos seus campos mais férteis.

Quando abriu o envelope com o dinheiro, sentiu o coração quase a explodir. O maço de notas era uma fracção do que esperava com base no valor da terra – e uma fracção do que calculou ser necessário para compensar os anos de perdas que se seguiriam. "Nada", afirmou Dansoko. "Não nos deram nada."

N’Näissata Dansoko, viúva e mão de sete filhos que vive em Dapilon CHLOE SHARROCK/MYOP/THE WASHINGTON POST


Em todas as seis aldeias – quatro próximas às operações da SMB e duas próximas às da CBG –, os residentes repetiram versões da história de Dansoko, descrevendo pagamentos únicos que pouco fizeram para compensar as perdas de rendimentos em terras agrícolas transmitidas de geração em geração.

As duas empresas aproveitaram as frágeis leis de propriedade da Guiné, de acordo com um relatório de 2018 da Human Rights Watch, que descobriu que as empresas ignoraram em grande parte as ligações históricas dos aldeões com a terra. No relatório de 2021, a ONG afirma que as empresas tomaram para si, com pouco envolvimento público, a decisão de "arbitrariamente determinar se e como compensar as famílias pelas suas terras".

Três organizações sem fins lucrativos, incluindo a IDI, apresentaram uma queixa em 2019 em nome de 13 aldeias da Guiné, alegando que a CBG violara os seus direitos e não tinha dado às famílias a compensação adequada. A queixa foi apresentada contra a International Finance Corporation, braço do Banco Mundial, que concedeu em 2016 um empréstimo de 200 milhões de dólares (cerca de 170 milhões de euros) à CBG para a sua expansão; o caso está agora em mediação. Em 2021, a CBG concordou em parar as explosões de dinamite dentro de um raio de 1000 metros das aldeias e em mudar o tipo de explosão para diminuir o impacto. O processo de mediação virou-se agora para as preocupações das aldeias em relação ao acesso e à qualidade da água.

Actividade disruptiva

A mineração a céu aberto de bauxite é intrinsecamente disruptiva. Especialistas do sector reconhecem que a perda de terras, a perturbação de habitats da vida selvagem e o ruído e a poeira são inevitáveis. E concordam que mitigar os danos requer regulamentação efectiva, envolvimento das comunidades e supervisão agressiva. Até agora, em todos os aspectos, isso tem sido extremamente deficiente na Guiné.

 
O assentamento de Hamdallaye, construído pela CBG para realojamento de aldeões que saíram das suas terras para aí serem construídas as infra-estruturas da mina Chloe Sharrock/MYOP


O Natural Resource Governance Institute, organização com sede em Nova Iorque que defende o desenvolvimento sustentável e inclusivo, deu ao Governo guineense uma classificação de "medíocre" em termos de controlo da corrupção em 2021 e uma classificação de "falhado" em relação ao Estado de direito. Mamadou Oury Bah, activista da Action Mines Guinée, afirmou que no Governo de Condé era impossível uma supervisão eficaz devido à corrupção generalizada.

Depois de Condé ser deposto pelo coronel Mamady Doumbouya, em 2021, o jovem líder das forças especiais mostrou vontade para ser duro com as mineradoras estrangeiras. No entanto, decisões do Governo de Doumbouya, incluindo a suspensão das receitas da mineração que eram partilhadas com as comunidades locais, levantam dúvidas entre os críticos sobre as perspectivas de uma verdadeira melhoria.

“Ponto cego” dos fabricantes de automóveis

A bauxite extraída na Guiné é enviada para o exterior para ser refinada em alumina (óxido de alumínio), que por sua vez é fundida em alumínio. A SMB envia o minério para a China Hongqiao Group, o maior produtor de alumínio do mundo, enquanto a CBG envia a sua bauxite para refinarias nos Estados Unidos, Canadá e Europa, de acordo com o IDI.

As principais empresas de automóveis do mundo, que compram o metal refinado, não mapeiam as suas cadeias de abastecimento de alumínio até ao nível da mina e, em resultado disso, não as controlam adequadamente para evitar abusos, segundo o relatório da Human Rights Watch e do IDI. Os grupos chamam ao minério de bauxite o "ponto cego" para os fabricantes de automóveis. Várias empresas reagiram às descobertas, citando a complexidade das cadeias de abastecimento como obstáculo para identificar a origem do seu alumínio.

O IDI diz que alguns construtores de automóveis têm levantado preocupações. Por exemplo, 11 empresas americanas, europeias e japonesas escreveram em 2021 à Aluminum Association para expressar "preocupação com a situação na Guiné" e apoiar os esforços de mediação entre a CBG e as aldeias. O IDI considerou esse um passo positivo, mas acrescentou que os fabricantes deveriam realizar as suas próprias auditorias regulares às cadeias de abastecimento.

No terreno, os habitantes das aldeias afirmam que a responsabilização é difícil de alcançar.

À sombra de uma das minas da SMB, onde os moradores dizem que as explosões de dinamite são tão fortes que não conseguem dormir e que os protestos foram reprimidos com prisões, Diallo Thierno Mamoudou disse que se sente traído pela empresa mineira em que um dia sonhou trabalhar. Há três anos, o irmão de 20 anos estava a trabalhar no campo e foi atingido na cabeça por uma pedra expelida pelo rebentamento de dinamite. Quando Mamoudou o encontrou, o irmão estava coberto de sangue, incapaz de falar.


Diallo Thierno Mamoudou CHLOE SHARROCK/MYOP/THE WASHINGTON POST

Na clínica administrada pela SMB na aldeia de Barkéré, um médico chinês deu penicilina ao irmão e mandou-o para casa, Mamoudou relatou. O jovem ainda tem o rosto inchado e às vezes perde a visão e o equilíbrio. Os esforços repetidos da família para conseguir mais cuidados médicos ou mesmo um pedido de desculpas da SMB foram ignorados.

“Já não quero tentar trabalhar para eles. Só quero que se vão embora”, disse Mamadou, sentado na sua casa de cimento repleta de fissuras causadas pelas explosões de dinamite.