domingo, 20 de outubro de 2013

A inteligência da subserviência




Por Carlos Pimenta
publicado em 26 Jul 2013

As "elites" não aprendem com a história. A sua incapacidade não é intelectual. É de subserviência política aos que criaram montanhas de nada (crédito fictício)


1. Há uma estreita relação entre as dinâmicas cíclicas dos negócios, da hegemonia de ideologias, da tendência para o esquecimento da inevitabilidade das crises, da prática de crimes de colarinho branco, de comportamento político face aos "mercados" e das concepções éticas.

É inequívoco o impacto actual da financiarização e desindustrialização dos países capitalistas centrais; da ideologia neoliberal; das teses do fim da história e da superação das crises; das fraudes financeiras, da corrupção, da lavagem de dinheiro e da economia ilegal; da ausência de regulação e fiscalização por parte do Estado; da debilitação da moral e da assunção de que o crime compensa. É inequívoco o sincronismo destes múltiplos aspectos na actual crise estrutural do capitalismo.

O entrelaçamento encoberto e espontâneo das "máfias organizadas" no funcionamento da economia faz parte do nosso presente.

As "elites" não aprendem com a história. A sua incapacidade não é intelectual. É de subserviência política aos que criaram montanhas de nada (crédito fictício) e hoje sugam as populações para refazerem as montanhas imaginadas. Para a economia deles ir bem tem o país de ir mal.

2. Um livro recente ("À Minha Maneira?", de Filipe Fernandes) vem revelar-nos acontecimentos similares aos de hoje quando da crise de 1929/33.

As dificuldades, e o apoio do Estado, não foram com o BPN & C.a mas com um banco estruturante do império colonial, o Banco Nacional Ultramarino. Mas as semelhanças são gritantes.

Vive-se uma crise de sobreprodução que afecta todo o sistema bancário. Durante a fase de expansão da economia fizeram-se negócios de curto prazo de elevado risco, privilegiaram-se os amigos que as teias do poder económico aconselhavam, houve fraudes avultadas, impunes ou quase, mesmo depois de detectadas. A fraude gerou riqueza para quem a praticou.

Na Europa defendiam-se políticas de equilíbrio orçamental, abrindo-se excepções para a salvação da banca. Germinavam os conflitos sociais que desembocaram nas ditaduras e na Segunda Guerra Mundial.

Essas dramáticas situações nada ensinaram. Então como agora as manifestações da crise são semelhantes e os erros políticos também. Como diz Galbraith, "os desastres financeiros são rapidamente esquecidos". Economistas e políticos têm memória curta.

3. As semelhanças entre as duas crises não nos devem fazer esquecer as diferenças.

Éramos uma sociedade mais atrasada, condicionada e fechada, implantados numa Europa mais preponderante política, cultural, tecnológica e industrialmente no plano mundial. Então havia maior capacidade de decisão política nacional e o Banco de Portugal funcionava como financiador de última instância (pretendia-se respeitar o padrão-ouro, mas a crise forçou a uma maior autonomia do sistema bancário e sua ligação à sociedade).

A mundialização ampliou-se, para o bem e para o mal. Hoje prolifera a economia paralela. A criminalidade económica internacional tem assento no banquete dos negócios à escala mundial. A independência nacional diluiu--se nos jogos de poder europeus.

4. O 25 de Abril de 1974 é uma ruptura insofismável na passagem da ditadura para a democracia, no fim do império colonial, na assunção da dignidade e da vontade de um povo.

Mas não será a "ditadura dos mercados" uma ameaça à efectiva democracia política? Não será que o actual "estado de golpe", de que fala Manuel Alegre, associado às graves tensões na Europa e na região mediterrânica, uma possível porta de entrada do golpe de Estado?

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