Publicado em 2013-10-03
Um (futuro) presidente de câmara vai para uma cadeira do estádio da sua terra, entre o povo, ver o jogo. Chegamos à Escandinávia? A foto que Rui Moreira pôs anteontem no Facebook antes do jogo F. C. Porto--Atlético de Madrid é apenas pormenor de algo que começou bem cedo: um intuitivo uso das redes sociais, tão normal como beber água. E foi assim que a onda d' "O meu Partido é o Porto" começou a alastrar através de uma base ideológica na qual as pessoas o identificavam como genuinamente portuense e antissistema - contra os partidos, lobbies e Estado. Uma pessoa antipoder, tal como a net. E havia algo de básico que Moreira estava a fazer e Menezes não: copiar Obama. Foi mais importante ganhar o Facebook que as arruadas.
Interessa também perceber como se 'espalhou a mensagem' deste "Porto Independente". Ora, os resultados, freguesia a freguesia, mostram um candidato que espalha influência de cima para baixo na pirâmide social. Repare-se no resultado da nova tripla freguesia Aldoar-Foz-Nevogilde: os independentes obtêm maioria absoluta (45%), o resultado mais expressivo em toda a cidade.
Quem conhecer sociologicamente a Foz, Nevogilde e os seus arredores (as freguesia de Aldoar, Ramalde e Massarelos), sabe que ali estão concentrados os empresários (alguns deles exportadores), professores universitários, médicos, advogados e a cultura inglesa do vinho do Porto. É lá que está a Católica do Porto, os colégios internacionais e as lojas de novas tendências. É esta "Foz" que, em boa parte, lidera a opinião da cidade - cada vez mais pelas redes sociais.
Esta sociedade portuense, burguesa, empreendedora e ainda não engolida pela crise, está cansada "disto". De ser esmagada pelo Estado, pelos impostos e pelas grandes instituições do país. De não ter armas para mudar nada em Lisboa (um pormenor: os comentadores da noite eleitoral dos canais de sinal aberto eram, como sempre, de Lisboa, apesar do Porto ser o principal tema da noite). Lisboa é o centro de poder que despromove a segunda cidade do país e a "província" - seja por extinção de serviços, de cargos de direção fora da capital, ou por simples concentração de poderes.
A venda dos aeroportos em monopólio ameaçando Pedras Rubras, as queixas contra a falta de ambição da TAP na cidade, o saneamento político do anterior presidente do Porto de Leixões, a forma totalmente absurda como se criou um inferno de multas com as scut à volta do Porto, ou, mais importante, a forma como os fundos comunitários acabam sistematicamente desviados das regiões pobres para Lisboa são alguns dos temas que germinam nesta guerra surda Porto-Lisboa. O episódio do abaixo-assinado da SRU (Sociedade de Reabilitação Urbana) foi um momento demagógico, mas simbólico sobre a facilidade com que se juntaram 1500 figuras representativas da cidade por causa de uma ridícula verba de 2,4 milhões de euros... O desrespeito pelo Porto ajudou a eleger um Porto Independente.
Por isso, agora, segue-se o processo em que esta contaminação eleitoral da 'Foz' (e não só) contra o Estado despesista e mau gestor se espelha no ideário nacional de Rui Rio - só António Costa pode contrapor uma ideia diferente de desenvolvimento. A ideia das boas contas e de menos Estado é mais forte na classe média privada do que mil excelentes ideias de desenvolvimento.
Quanto a Rui Moreira, há agora duas hipóteses: poderia pensar-se que um independente estaria em melhores condições para unir a Área Metropolitana do Porto, ou até o Norte, em grandes causas comuns. Mas é de temer que as famílias partidárias (PS e PSD) o deixem a falar sozinho. Resta um objetivo, apesar de tudo, interessante: uma cidade mais cosmopolita, com mais cultura e melhor turismo, melhor qualidade de habitação para os mais pobres, e um qualquer milagre que traga investimento estrangeiro e mais emprego.
Vai conseguir? Se não desaparecer da rua e continuar a ser a pessoa normal que faz caminhadas na Avenida Brasil, Moreira receberá força, todos os dias, dos anónimos da cidade que querem essa "independência". E ela pode fazer-se através de uma 'movida' criativa que una as boas ideias e as boas marcas às novas gerações. Assim se conseguirá pôr o Porto no mapa global através das exportações e do turismo. Não é impossível.
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