terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Porque dormem os bebés finlandeses em caixas de cartão?



Porque dormem os bebés finlandeses em caixas de cartão?

Há 75 anos que as futuras mães da Finlândia recebem uma caixa do Estado. Este «kit» inicial com roupa, lençóis e brinquedos pode até mesmo ser usado como cama.

O pacote de maternidade – um presente do governo finlandês – está disponível para todas as grávidas. É uma medida social que remonta à década de 1930 e foi projetada para dar a todas as crianças da Finlândia, não importa o contexto familiar, um início de vida igual. Contémbodies, um saco-cama, equipamento de ar livre, produtos para o banho do bebé, assim como fraldas, roupa de cama e um pequeno colchão.

Com o colchão no fundo, a caixa torna-se na primeira cama de um bebé. Muitas crianças, de todas as origens sociais, fazem os seus primeiros sonos dentro da segurança das quatro paredes da caixa de cartão.

As mães podem escolher entre aceitar a caixa ou um valor pecuniário, atualmente fixado em 140 euros, mas 95 por cento optam pela caixa, pois vale muito mais. 


Tradição remonta a 1938

No início, o esquema estava disponível apenas para famílias com baixos rendimentos, mas tal mudou em 1949. «Não só a caixa era oferecida a todas as futuras mães, comoa nova legislação estipulava que, para terem direito ao dinheiro ou à caixa de maternidade, tinham de ir ao médico ou a uma clínica pré-natal antes do quarto mês de gravidez», conta Heidi Liesivesi, que trabalha na Kela – a agência de Segurança Social da Finlândia.

Assim, a caixa fornecia às mães o que elas precisavam para cuidar do seu bebé, mas também ajudou a conduzir as grávidas para os cuidados de médicos e enfermeiros do estado social nascente da Finlândia.

Na década de 1930 a Finlândia era um país pobre e com uma mortalidade infantil elevada – 65 em cada mil bebés morriam. Mas os números melhoraram rapidamente nas décadas que se seguiram.

Mika Gissler, professor no Instituto Nacional para Saúde e Bem-Estar de Helsínquia, Finlândia, aponta várias razões para isso – a caixa de maternidade e os cuidados pré-natais para todas as mulheres na década de 1940, seguidos nos anos 60 por um sistema de seguro de saúde nacional e o desenvolvimento de uma rede central hospitalar.

Aos 75 anos de idade, a caixa é agora uma parte bem estabelecida do ritual finlandês de passagem para a maternidade, unindo gerações de mulheres.

Reija Klemetti, de 49 anos, lembra-se de ir ao correio para recolher uma caixa para um dos seus seis filhos. «Foi lindo e emocionante recebê-lo e, de alguma forma, a primeira promessa para o bebé», diz. «A minha mãe, os amigos e os familiares estavam todos ansiosos para ver que tipo de coisas estavam lá dentro e quais as cores que tinha escolhido para esse ano».

A sogra, de 78 anos, apoiou-se fortemente na caixa de maternidade quando nasceu o primeiro dos seus quatro filhos, nos anos 60. Na altura, não tinha muita ideia do que um bebé precisava, mas tudo foi fornecido.

Mais recentemente, Soija, filha de Reija Klemetti, de 23 anos, partilhou o sentimento de emoção que a mãe tinha experimentado quando tomou posse da «primeira coisa substancial» antes do próprio bebé. É agora mãe de dois filhos.

«É fácil saber em que ano nasceram os bebés porque a roupa da caixa varia um pouco todos os anos. É engraçado comparar e pensar “Ah, aquela criança nasceu no mesmo ano da minha”», diz Titta Vayrynen, 35 anos, mãe de dois rapazes pequenos.

Para algumas famílias, o conteúdo da caixa seria inviável se não fosse gratuita, embora para Titta Vayrynen, era mais uma questão de economia de tempo do que de dinheiro. Trabalhava longas horas enquanto estava grávida do primeiro filho e ficou contente de lhe ter sido poupado o esforço de comparar preços e de ir às compras.

«Recentemente foi publicado um relatório que dizia que as mães finlandesas são as mais felizes do mundo, e a caixa foi uma das coisas de que me lembrei quando li essa notícia. Somos bem tratadas, mesmo agora que alguns serviços públicos tenham sido cortados», afirma. Quando teve o seu segundo filho, Ilmari, Titta Vayrynen optou pelo dinheiro em vez da caixa de maternidade e reutilizou as roupas usadas por Aarni, o seu primeiro filho

Como a caixa de maternidade evoluiu

Um menino pode passar a roupa para uma menina e vice-versa, já que as cores escolhidas para a caixa de maternidade são deliberadamente neutras. O conteúdo da caixa tem mudado muito ao longo dos anos, reflectindo a evolução dos tempos.

Durante os anos 30 e 40, continha tecido porque as mães estavam acostumadas a fazer as roupas do bebé. Mas, durante a Segunda Guerra Mundial, a flanela e o tecido de algodão foram requisitados pelo Ministério da Defesa, de modo que algum do material foi substituído por lençóis de papel e pano de cueiros.

Os anos 50 viram um aumento no número de roupas prontas a vestir, e nos anos 60 e 70 estas começaram a ser feitas a partir de novos tecidos elásticos.

Em 1968, um saco-cama apareceu e no ano seguinte foram apresentadas pela primeira vez fraldas descartáveis.

Mas não por muito tempo, já que na viragem do século, as fraldas de pano estavam de volta e a variedade descartável estava fora, depois de ter caído em desuso por razões ambientais.

Além disso, incentivar boas práticas parentais tem feito parte da política da caixa de maternidade desde o início. «Os bebés costumavam dormir na mesma cama que os pais e foi recomendado que esta prática fosse abolida», afirma Panu Pulma, professor de História Nórdica e Finlandesa na Universidade de Helsínquia. «Transformar a caixa numa cama significou que os pais começaram a deixar de dormir com o bebé na mesma cama».

A certa altura, os biberões e as chupetas foram removidos da caixa de maternidade para promover a amamentação. «Um dos principais objetivos de todo o sistema era fazer com que as mulheres amamentassem mais», diz Panu Pulma. E, acrescenta, «Resultou».

O especialista também considera que a inclusão de um livro infantil teve um efeito positivo, pois encoraja desde cedo o bebé a lidar com livros, fomentando a curiosidade pela leitura.

«E além de tudo isto», afirma Panu Pulma, «a caixa é um símbolo. Um símbolo da ideia de igualdade e da importância das crianças.»

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