ALBERTO PINTO NOGUEIRA
12/08/2013
Por vezes, os tribunais e seus juízes surpreendem-me. A República também.
Numa das minhas deambulações pela cidade, subi a Rua dos Mártires da Liberdade. Faz honra a doze liberais enforcados e depois decapitados, por sentença do tribunal miguelista. Em 7 de Maio de 1829.
Na baixa portuense, escura, esconsa e triste, a rua desemboca na Praça da República, antes do Campo de Santo Ovídio. Ao centro da praça, o Jardim Teófilo Braga. Homem de letras e político. Foi presidente da República. O jardim mantém bancos de madeira, árvores enormes, palmeiras, tílias, lilaseiras e outras espécies. E estátuas.
Era uma manhã fresca, de Sol. Aqui e ali, idosos batiam cartas. Discutiam com ruído. Fiquei por ali. Em modorra doce. A folhear um jornal. A olhar o jardim. E as estátuas. A magicar na República, seus princípios e valores. De como hoje a maltratam.
No limite norte da praça, ao centro, também voltada a norte, a estátua da República. Bela em qualquer parte do mundo. E imponente. Virada para o que foi o Quartel-General da Região Norte. Ali colocada em 2010, no centenário da República. Oferta da Fundação António de Almeida ao povo do Porto. Que bem merece.
Voltei a sul da praça. Um pouco enviezada para a direita está a estátua do Padre Américo, protegendo dois jovens. Nortenho sobejamente conhecido por uma vida dedicada aos jovens. Sobretudo pobres. Questionei-me como se lembraram de meter o Padre Américo, em 1959, na Praça da República. Lateralizei a questão. Podia estar ali, como noutro lado qualquer.
Embelezava o jardim, regozijava os devotos. E os pobres. Na sua base, depositam flores.
Galguei mais uns metros para sul e à esquerda. O meu espanto! Risonho, empunhando uma taça de vinho, ou de equivalente néctar, uma estátua de um deus pagão: Baco. Olhar e riso debochados e alarves. Mais próximo, sobe o espanto. Ali está desde 1916. Para comemorar a República no sexto aniversário!
Cem anos se esperou pela estátua da República! Mas esta recebe, em seis, um deus pagão, deus do vinho, do vício, dos bacanais! Inquiri das motivações. Ninguém sabia. Talvez por ser de mestre Teixeira Lopes.
Retomei a Rua dos Mártires da Liberdade. Muito devagar. A pensar. A olhar.
Um pouco abaixo, a casa onde nasceu Ricardo Jorge. Cientista, investigador. Dedicou a vida à ciência e saúde pública.
Mais abaixo ainda, agora do lado esquerdo, a sede da Renascença Portuguesa. Na sua revista, “A Águia”, colaboraram nomes sempre presentes das artes, literatura e ciência. Fernando Pessoa, Mário de Sá Carneiro, Leonardo de Coimbra, Agostinho da Silva e tantos outros. Pensadores. Revista do Pensamento.
Um tribunal superior engrandece o álcool que “pode esquecer as agruras da vida” e reforça o empenho no trabalho! A República o deus pagão do álcool e do vício!
Onde está o Pensamento?
O autor é Procurador-Geral Adjunto
12/08/2013
O Tribunal da Relação do Porto surpreendeu-me.
Com aquela deliberação em que enaltece as supostas virtudes do álcool e minimiza o bom sensoPor vezes, os tribunais e seus juízes surpreendem-me. A República também.
Numa das minhas deambulações pela cidade, subi a Rua dos Mártires da Liberdade. Faz honra a doze liberais enforcados e depois decapitados, por sentença do tribunal miguelista. Em 7 de Maio de 1829.
Na baixa portuense, escura, esconsa e triste, a rua desemboca na Praça da República, antes do Campo de Santo Ovídio. Ao centro da praça, o Jardim Teófilo Braga. Homem de letras e político. Foi presidente da República. O jardim mantém bancos de madeira, árvores enormes, palmeiras, tílias, lilaseiras e outras espécies. E estátuas.
Era uma manhã fresca, de Sol. Aqui e ali, idosos batiam cartas. Discutiam com ruído. Fiquei por ali. Em modorra doce. A folhear um jornal. A olhar o jardim. E as estátuas. A magicar na República, seus princípios e valores. De como hoje a maltratam.
No limite norte da praça, ao centro, também voltada a norte, a estátua da República. Bela em qualquer parte do mundo. E imponente. Virada para o que foi o Quartel-General da Região Norte. Ali colocada em 2010, no centenário da República. Oferta da Fundação António de Almeida ao povo do Porto. Que bem merece.
Voltei a sul da praça. Um pouco enviezada para a direita está a estátua do Padre Américo, protegendo dois jovens. Nortenho sobejamente conhecido por uma vida dedicada aos jovens. Sobretudo pobres. Questionei-me como se lembraram de meter o Padre Américo, em 1959, na Praça da República. Lateralizei a questão. Podia estar ali, como noutro lado qualquer.
Embelezava o jardim, regozijava os devotos. E os pobres. Na sua base, depositam flores.
Galguei mais uns metros para sul e à esquerda. O meu espanto! Risonho, empunhando uma taça de vinho, ou de equivalente néctar, uma estátua de um deus pagão: Baco. Olhar e riso debochados e alarves. Mais próximo, sobe o espanto. Ali está desde 1916. Para comemorar a República no sexto aniversário!
Cem anos se esperou pela estátua da República! Mas esta recebe, em seis, um deus pagão, deus do vinho, do vício, dos bacanais! Inquiri das motivações. Ninguém sabia. Talvez por ser de mestre Teixeira Lopes.
Retomei a Rua dos Mártires da Liberdade. Muito devagar. A pensar. A olhar.
Um pouco abaixo, a casa onde nasceu Ricardo Jorge. Cientista, investigador. Dedicou a vida à ciência e saúde pública.
Mais abaixo ainda, agora do lado esquerdo, a sede da Renascença Portuguesa. Na sua revista, “A Águia”, colaboraram nomes sempre presentes das artes, literatura e ciência. Fernando Pessoa, Mário de Sá Carneiro, Leonardo de Coimbra, Agostinho da Silva e tantos outros. Pensadores. Revista do Pensamento.
Um tribunal superior engrandece o álcool que “pode esquecer as agruras da vida” e reforça o empenho no trabalho! A República o deus pagão do álcool e do vício!
Onde está o Pensamento?
O autor é Procurador-Geral Adjunto
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