Demitiu-se ou fugiu?
Os seus amigalhaços, comparsas da política e das negociatas obscuras tramadas a coberto do PSD, dizem que ele se demitiu, tanto mais que a demissão foi aceite por Passos Coelho, e louvam-lhe o gesto nobre de um homem de carácter que, apesar de inocente e puro, sabe afastar-se resolutamente das más companhias. Mas tudo isto é conversa fiada de fariseus como Marques Mendes e Marcelo Rebelo de Sousa, oportunistas que nem param para reflectir na total impossibilidade ética de existir no mundo um único homem, inocente e puro, que durma, conviva, coma e viaje com uma quadrilha de gatunos, dos quais um total de onze é preso numa única madrugada, por duzentos inspectores da polícia judiciária...
Sim, o que é que fará o nosso São Miguel Arcanjo de Macedo no meio de semelhante corte de bandidos?!
Diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és!
Todavia, Miguel Macedo alegou, no domingo à noite, como razão política suprema da sua demissão, a perda da autoridade que necessitaria para exercer as suas funções governativas, perda consequente do processo criminal instaurado aos seus amigos e à prisão a que haviam sido submetidos. Mas aqui também não bate a bota com a perdigota, pois Miguel nunca seria tão anjinho que não soubesse a natureza dos amiguinhos que só ele escolhera ter. Ora, onde Miguel perde toda a autoridade não é quando a Judiciária lhe põe a careca à mostra, prendendo os gatunos que compõem o círculo de amigos do ministro da administração interna; onde Miguel perdeu toda a autoridade foi no momento em que escolheu conviver com tão execranda canalha.
A questão é pois esta: Miguel escolheu viver com uma alcateia de ladrões; não é o capuchinho vermelho – ou laranja! – no meio dos lobos maus. É, para todos os efeitos, e de pleno direito, um membro da própria alcateia. E que devia estar preso!
Miguel Macedo não renunciou ao exercício das suas funções, mas pediu a demissão do cargo. Miguel de Macedo fugiu, pôs-se na alheta, desapareceu pura e simplesmente, julgando que ainda o fazia a tempo.
E talvez tenha conseguido…
Na verdade, tudo indica que Miguel Macedo se escapuliu antes que fosse descoberto o grande golpe-de-mão – o negócio do século – que os seus onze amigos, presos três dias antes do seu pedido de demissão, preparavam com funcionários do património da Câmara Municipal de Lisboa, com vista a vender aos chineses entretanto presos, e também amigos do ministro da administração interna, os terrenos da antiga Feira Popular, em Entre campos: 100 000 metros quadrados de terreno, no valor de mil milhões de euros, para condomínios de luxo na zona nobre do planalto da cidade de Lisboa, às Avenidas Novas.
É isto que está em causa na desesperada demissão de Miguel Macedo! E é nisto que está metido o arcanjinho do nosso Miguel.
Foi disto que ele conseguiu pôr-se na alheta a tempo? Ver-se-á!...
Toda a comunicação social e tutólogos dos respectivos órgãos homenageiam aos gritos o ministério público e a polícia judiciária, por terem sido capazes de deter o maior conjunto de altas personalidades da política portuguesa num só golpe, na manhã de quinta-feira, dia 13 de Novembro, na operação Labirinto:
1. Manuel Jarmela Palos, director do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, amigo e subordinado de Miguel Macedo, preso preventivamente na cadeia;
2. António Figueiredo, presidente do Instituto de Registos e Notariado,amigo íntimo de Miguel Macedo, preso preventivamente na cadeia;
3. Maria Antónia Anes, secretária-geral do ministério da justiça, amiga de Miguel Macedo, presa preventivamente no domicílio;
4. Zhu Xiaodong, empresário chinês, com quem Miguel Macedo teve encontros e para quem meteu cunhas, preso preventivamente na cadeia;
5. Jaime Couto Alves, empresário, de quem Miguel Macedo era sócio, conjuntamente com a filha de António Figueiredo, na sociedade JMF,preso preventivamente;
6. Zhu Baoe, empresário chinês, que ainda não conseguimos determinar se esteve ou não com Miguel Macedo no fim-de-semana passado com Zhu Xiaodong em Aiamonte, Espanha, preso preventivamente;
7. Chan Baliang, empresário chinês, que também não sabemos se esteve ou não em Aiamonte, preso preventivamente;
8 a 11. Paulo Eliseu, Paulo Vieira, José Manuel Gonçalves e Abílio Silva, funcionários do Instituto Central de Registos e Notariado, também detidos na operação Labirinto, constituídos arguidos com coação monetária;
Albertina Gonçalves, secretária-geral do ministério do ambiente, amiga e sócia de Miguel Macedo no escritório de advogados, foi também constituída arguida.
A lista que ficou elaborada acima comprova as relações directas, pessoais, profissionais, societárias e até talvez íntimas de Miguel Macedo, ex-ministro da administração interna, com a quadrilha de criminosos agora detida, e a que foram aplicadas as mais pesadas medidas de coacção, determinadas pelo juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal.
Quando se demitia, imediatamente a seguir à prisão dos seus comparsas, Miguel Macedo sabia que estava simplesmente em fuga, pois o advogado do seu íntimo amigo António de Figueiredo não terá deixado de informar o ministro do conteúdo das escutas telefónicas em que Miguel de Macedo tinha sido apanhado.
Acontece ainda que os principais cabecilhas desta rede, montada para extrair dos passaportes dourados todo o dinheiro possível, estavam todos informados de que tinham os telefones sob escuta, incluindo o ministro Miguel Macedo. Imaginem que o confrade António Figueiredo andava com oito telemóveis, pensando que assim poderia ludibriar as escutas, o que só mostra a ignorância actual de alguns licenciados em direito.
Mas chegados a este ponto cabe perguntar: porque é que o ministério público e a polícia judiciária não aguardaram pelo começo da consumação da criminosa negociata da Feira-Popular, para prender então todos os implicados no negócio do século?
O avanço prematuro da operação Labirinto mostra que há alguém, ao mais alto nível do ministério público e ao mais alto nível da polícia judiciária, que decidiu abortar a operação, permitindo que Miguel Macedo e outros altos quadros do Estado, do governo e do PSD pudessem escapar à prisão.
Ora, o povo português exige que a procuradora-geral da República e o Conselho Superior do Ministério Público, por um lado, e o ministério da justiça, por outro, encontrem os magistrados e funcionários responsáveis pelas fugas de informação sobre as escutas e sobre o avanço prematuro e consequente abortamento da Operação Labirinto, porque essa conduta criminosa das autoridades de investigação criminal impediu que se levasse à prisão a maior quadrilha de altos dirigentes do Estado até hoje constituído em organização criminosa em Portugal.
O presidente da República está a colaborar objectivamente na prática de todos estes crimes, pois fecha os olhos e deixa passar uma situação que é, para todos os efeitos, de manifesto irregular funcionamento das instituições democráticas e de crise constitucional, e se recusa a usar dos seus poderes para dissolver a Assembleia da República e marcar logo as novas eleições legislativas, que dê uma nova oportunidade à democracia constitucional.
A sua decisão pré-anunciada de que não convocará eleições antecipadas é um toque de clarim ao PSD: é roubar vilanagem! Aproveitem agora, que não haverá tão cedo uma oportunidade como esta!...
O reaccionário de Boliqueime é o maior responsável pela situação caótica a que chegámos. Ele também deve ser posto na rua, pois está a dar total cobertura à gatunagem que está no poder em São Bento e que é aliás composta por seus companheiros de partido.
Encarnação Leonardo
Sem comentários:
Enviar um comentário