Rivka Ravitz
Aos 43 anos, Rivka Ravitz garante que a família e a religião não a impedem de ter uma vida profissional. Casou aos 18, espera o 12.º filho e o trabalho com o presidente israelita Reuven Rivlin já lhe permitiu conhecer inúmeras personalidades. Até o Papa Francisco - a quem não apertou a mão.
"Olá, sou a Rivka, tenho 43 anos, sou mãe de 11 filhos e sou judia ultraortodoxa", começa por se apresentar. Para logo acrescentar: "Sou também a chefe de gabinete do presidente Reuven Rivlin." Diante de um grupo de jornalistas europeus, a referência religiosa não é um acaso. Rivka Ravitz faz questão de explicar que uma das grandes preocupações do chefe do Estado israelita é a coabitação entre as várias comunidades que compõem o país. Judeus e árabes, claro, com os chamados árabes israelitas (palestinianos que ficaram a viver no território após a criação do Estado de Israel em 1948 e seus descendentes, hoje cerca de dois milhões numa população de perto de nove milhões), mas também entre os vários grupos de judeus. Desde os ultraortodoxos, a que Ravitz e a família pertencem, aos laicos, passando pelos religiosos.
A verdade é que se a figura do judeu ultraortodoxo, com o chapéu preto, os caracolinhos e o fato escuros usado sobre uma camisa branca faz parte do imaginário colectivo, poucos têm contacto direto com a comunidade. Mesmo em Jerusalém, é possível vê-los nas ruas, junto ao Muro das Lamentações, com a mulher, sempre de cabelo coberto, seja por uma peruca, por um boné ou por uma espécie de turbante, quase sempre a empurrar um carrinho de bebé e rodeada pelos restantes filhos, ou cruzar-se com eles nas ruas de bairros como o Mea Shearim, onde se concentram. Mas continuam a ser um mistério.
Um mistério que Rivka Ravitz procura explicar. "Sou uma de dez filhos, o meu marido tem 11 irmãos. Conhecemo-nos quando éramos muito jovens. Casei aos 18 anos. Aos 21 tive a minha primeira filha, quase ao mesmo tempo em que a minha mãe tinha a sua 10.ª", conta diante de um ecrã onde projeta informações sobre a população israelita. Na comunidade haredi não há acesso livre à internet e os computadores são escassos. Os telemóveis são daqueles antigos com uma tampa. Nas suas casas não há televisão e os únicos jornais que entram são os jornais haredi, aprovados pelos rabinos - ou seja, nada de imagens de mulheres, por exemplo. Idas ao cinema, nem pensar, e os casamentos são arranjados por casamenteiros que as famílias usam para encontrar noiva ou noivo para os seus jovens. São eles quem sugere um nome que consideram adequado e marcam o encontro. Num sítio público, claro, os dois jovens sentam-se frente a frente e conversam. Se gostarem, quando chegam a casa comunicam às famílias que desejam marcar um segundo encontro, os familiares voltam ao casamenteiro, que volta então a entrar em acção.
Ora, para quem conhece um pouco o estilo de vida dos haredi, essa é a parte verdadeiramente surpreendente. Separados por sexos na escola a partir dos 3 anos. As raparigas seguem um método de ensino semelhante ao da restante população israelita, com disciplinas como Hebraico, Matemática, Inglês ou Ciências. Já os rapazes, passam a dedicar-se apenas aos estudos religiosos, da Torá e do Talmude, passando longas horas na yeshivá. E assim continuam, vida fora. Para eles não há matemática, nem inglês, nem ciências. Só estudos religiosos. Num país onde o serviço militar é obrigatório para todos - três anos para os rapazes, dois para as raparigas - os ultraortodoxos estão, no entanto, isentos. Tudo para evitar distrações. Uma posição que lhes vale duras críticas por parte de alguns sectores dentro da própria sociedade israelita.
E a maior parte dos homens não trabalham - só 45% o fazem. São as mulheres quem traz dinheiro para casa, apesar dos muitos filhos - seis, sete, dez ou doze por família. Muitas são professoras na comunidade. Algumas trabalham como secretárias ou aprenderam informática. Mas muito poucas foram para a universidade e arranjaram um emprego com o destaque do de Rivka, formada em Gestão na Universidade Aberta de Israel e com um doutoramento em Políticas Públicas pela Universidade de Haifa. A própria filha mais velha, explica a chefe de gabinete do presidente, começou a trabalhar mas, quando engravidou pela segunda vez, desistiu: "Disse-me: "mãe, não quero criar os meus filhos como tu nos criaste"", confessa Rivka a rir.
Foi este emprego pouco comum para uma haredi que lhe permitiu conhecer gente famosa. Seja a Mulher-Maravilha, a também israelita Gal Gadot, da qual diz nunca ter ouvido falar antes de lhe ser apresentada, ou não estivesse o cinema proibido aos ultraortodoxos, até ao Papa Francisco, cuja mão recusou apertar uma vez que as haredi não podem tocar num homem que não seja seu marido.
"Quando chegámos ao Vaticano recebemos instruções sobre como agir com o Papa. O nosso cônsul disse-me que tinha de lhe apertar a mão. Eu expliquei que não podia, porque não aperto a mão a homens. As mulheres ultraortodoxas não tocam num homem que não seja o marido", conta. O cônsul não ficou muito convencido e tentou pressioná-la a fazer o que ele estava a pedir. "Não respondi, mas quando o Papa chegou eu expliquei-lhe: "Desculpe, mas não posso apertar-lhe a mão, sou religiosa". E ele percebeu tão bem que fez isto [aponta para a fotografia em que o Papa surge inclinado diante dela, num cumprimento à distância respeitoso].
Rivka orgulha-se de, apesar de todas as viagens e de até ter um smartphone por motivos de trabalho, sempre ter mantido as tradições da sua fé. Mas confessa que hoje muitos jovens - cerca de 10% - ultraortodoxos deixam a comunidade. Seja para ir para a universidade ou para o exército.
Apesar disso, e com taxas de natalidade de 6,2 filhos por mulher, os ultraortodoxos são uma comunidade em forte crescimento em Israel. Em 2009 eram cerca de 750 mil numa população de 7,5 milhões (menos de 10%), hoje são mais de 12% dos 8,7 milhões de israelitas. Estima-se que cheguem aos 16% em 2030 e em 2065 sejam um quarto da população.
Um problema para qualquer governo, uma vez que esta população em crescimento não contribui de forma proporcional para a economia do país. Rivka admite que esse é um desafio real. Mas acredita que o Estado israelita vai encontrar uma solução.
Saia comprida preta, casaco branco e preto, sandálias rasas que usa por cima dos collants e a peruca impecável a cobrir o seu cabelo natural, Rivka Ravitz entra na sala de um hotel em Jerusalém com a segurança de quem está habituada a percorrer o mundo e a falar em público. A barriga proeminente denuncia mais uma gravidez a caminho. Será a 12.ª. Sim, aos 43 anos, a mulher que nos últimos 20 anos se tornou o braço direito de Reuven Rivlin e é hoje a chefe de gabinete do homem que em 2014 foi escolhido para presidir a Israel encontrou maneira de equilibrar o respeito pelas regras religiosas da comunidade judia ultraortodoxa (ou haredi) com o trabalho e os 11 filhos.
"Olá, sou a Rivka, tenho 43 anos, sou mãe de 11 filhos e sou judia ultraortodoxa", começa por se apresentar. Para logo acrescentar: "Sou também a chefe de gabinete do presidente Reuven Rivlin." Diante de um grupo de jornalistas europeus, a referência religiosa não é um acaso. Rivka Ravitz faz questão de explicar que uma das grandes preocupações do chefe do Estado israelita é a coabitação entre as várias comunidades que compõem o país. Judeus e árabes, claro, com os chamados árabes israelitas (palestinianos que ficaram a viver no território após a criação do Estado de Israel em 1948 e seus descendentes, hoje cerca de dois milhões numa população de perto de nove milhões), mas também entre os vários grupos de judeus. Desde os ultraortodoxos, a que Ravitz e a família pertencem, aos laicos, passando pelos religiosos.
A verdade é que se a figura do judeu ultraortodoxo, com o chapéu preto, os caracolinhos e o fato escuros usado sobre uma camisa branca faz parte do imaginário colectivo, poucos têm contacto direto com a comunidade. Mesmo em Jerusalém, é possível vê-los nas ruas, junto ao Muro das Lamentações, com a mulher, sempre de cabelo coberto, seja por uma peruca, por um boné ou por uma espécie de turbante, quase sempre a empurrar um carrinho de bebé e rodeada pelos restantes filhos, ou cruzar-se com eles nas ruas de bairros como o Mea Shearim, onde se concentram. Mas continuam a ser um mistério.
Separação por sexos aos 3 anos
Ora, para quem conhece um pouco o estilo de vida dos haredi, essa é a parte verdadeiramente surpreendente. Separados por sexos na escola a partir dos 3 anos. As raparigas seguem um método de ensino semelhante ao da restante população israelita, com disciplinas como Hebraico, Matemática, Inglês ou Ciências. Já os rapazes, passam a dedicar-se apenas aos estudos religiosos, da Torá e do Talmude, passando longas horas na yeshivá. E assim continuam, vida fora. Para eles não há matemática, nem inglês, nem ciências. Só estudos religiosos. Num país onde o serviço militar é obrigatório para todos - três anos para os rapazes, dois para as raparigas - os ultraortodoxos estão, no entanto, isentos. Tudo para evitar distrações. Uma posição que lhes vale duras críticas por parte de alguns sectores dentro da própria sociedade israelita.
E a maior parte dos homens não trabalham - só 45% o fazem. São as mulheres quem traz dinheiro para casa, apesar dos muitos filhos - seis, sete, dez ou doze por família. Muitas são professoras na comunidade. Algumas trabalham como secretárias ou aprenderam informática. Mas muito poucas foram para a universidade e arranjaram um emprego com o destaque do de Rivka, formada em Gestão na Universidade Aberta de Israel e com um doutoramento em Políticas Públicas pela Universidade de Haifa. A própria filha mais velha, explica a chefe de gabinete do presidente, começou a trabalhar mas, quando engravidou pela segunda vez, desistiu: "Disse-me: "mãe, não quero criar os meus filhos como tu nos criaste"", confessa Rivka a rir.
Foi este emprego pouco comum para uma haredi que lhe permitiu conhecer gente famosa. Seja a Mulher-Maravilha, a também israelita Gal Gadot, da qual diz nunca ter ouvido falar antes de lhe ser apresentada, ou não estivesse o cinema proibido aos ultraortodoxos, até ao Papa Francisco, cuja mão recusou apertar uma vez que as haredi não podem tocar num homem que não seja seu marido.
"Quando chegámos ao Vaticano recebemos instruções sobre como agir com o Papa. O nosso cônsul disse-me que tinha de lhe apertar a mão. Eu expliquei que não podia, porque não aperto a mão a homens. As mulheres ultraortodoxas não tocam num homem que não seja o marido", conta. O cônsul não ficou muito convencido e tentou pressioná-la a fazer o que ele estava a pedir. "Não respondi, mas quando o Papa chegou eu expliquei-lhe: "Desculpe, mas não posso apertar-lhe a mão, sou religiosa". E ele percebeu tão bem que fez isto [aponta para a fotografia em que o Papa surge inclinado diante dela, num cumprimento à distância respeitoso].
Jovens decidem sair da comunidade
Apesar disso, e com taxas de natalidade de 6,2 filhos por mulher, os ultraortodoxos são uma comunidade em forte crescimento em Israel. Em 2009 eram cerca de 750 mil numa população de 7,5 milhões (menos de 10%), hoje são mais de 12% dos 8,7 milhões de israelitas. Estima-se que cheguem aos 16% em 2030 e em 2065 sejam um quarto da população.
Um problema para qualquer governo, uma vez que esta população em crescimento não contribui de forma proporcional para a economia do país. Rivka admite que esse é um desafio real. Mas acredita que o Estado israelita vai encontrar uma solução.
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