quarta-feira, 5 de agosto de 2015

O braço armado do Estado


Fernando Sobral

Jornal de Negócios, 2015.08.03

Durante muitas décadas, a Caixa Geral de Depósitos foi o amigo número um do Estado. O seu braço armado, em tempos de tempestade, e o refúgio perfeito para os que tinham deixado de ter lugar no Governo ou no Parlamento. Quando o rei D. Luís a criou em 1876, para “incitar o espírito da economia”, talvez se imaginasse já que viria a transformar-se no banco do Estado. Salazar transformou-a num instrumento da sua política económica. Mas, sobretudo, pela sua pujança e peso na sociedade portuguesa, a CGD foi sempre o palco perfeito para se observar o teatro político e as motivações «pe mudam consoante o rumo do vento. Nos últimos anos a CGD serviu, para lá do seu fulcral papel na economia, para, sob diferentes administrações, influir em decisões políticas tomadas por sucessivos governos. Basta lembrar o seu papel a financiar accionistas do BCP no tempo em que este era palco de uma luta de poder sem quartel ou na sua retirada de cena quando se decidiram alienações de algumas das mais emblemáticas empresas portuguesas. Só que tudo isto não invalida uma coisa: a CGD simboliza o Estado português e a força que ainda julga ter. Se imagem mais poderosa não existisse, bastava olhar para a sua sede: a caixa-forte do Estado português, agora que a emissão de moeda é decidida lá fora. O actual Governo, que convive mal, por razões ideológicas, com empresas do Estado, já privatizou quase tudo. Como símbolo, só resta a CGD. O “fastio” com que Passos Coelho encarou o facto de a CGD ainda não ter reembolsado ao Estado a ajuda pública que recebeu, é um sinal eloquente de que velhos fantasmas regressam como convicções. A administração de José de Matos foi, com uma frase, colocada entre a espada e a parede. Sairá, pelo fim do mandato. Mas a questão é que Passos, sem mais nada para privatizar (excepto as águas), poderá estar a recuperar o seu velho sonho (transferir a CGD para o sector privado), como dizia há muitos anos. É uma opção. Mas então o Estado ficará sem o seu último Robocop.

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