ALBERTO PINTO NOGUEIRA
12/11/2013
Portugal foi a "ditosa Pátria minha amada" de Luís Vaz de Camões.
De Tomás Ribeiro, "jardim à beira mar plantado".
É um território de alguns milhares de quilómetros quadrados. Um mendigo com a mão direita à frente, a esquerda atrás.
O jardim à beira-mar plantado afogou-se. Ficaram jardins por esse país fora. Um é o do Passeio Alegre. Ou da Foz do Douro. O Rio, ao mergulhar e beijar o mar, tem na margem direita o Passeio Alegre. Aí vive o Jardim da Foz do Douro.
A Foz é de artistas e poetas. Irene Vilar, escultora, Vasco Graça Moura, poeta, Eugénio de Andrade, poeta do Porto e Foz do Douro. Tantos outros. Raul Brandão ali nasceu, filho de pescadores. Foi militar, jornalista, político, homem de letras. Tem um monumento no lado Sul do Jardim da Foz, a curta distância do Douro.
A entrada é um encanto, com dois obeliscos do arquitecto do Porto: Nicolau Nasoni.
O jardim , dos fins do séc. XIX, projectado pelo arquitecto Émile David, estende-se por umas boas centenas de metros, quase até ao castelo de São João da Foz. Os arquitectos da Porto/2001, por sorte, não deram conta dele. Deixaram-no romântico.
É povoado de sonhos: a liberdade do Douro, a perenidade das árvores que tomam conta de tudo. A arte de Nicolau Nasoni.
Muitas árvores centenárias. Tílias, palmeiras, plátanos, ciprestes, açafrões.
José Nogueira, acima dos 80, acomodado num dos bancos de madeira que por ali se oferecem, lê apreensivo a página de obituário do Jornal de Notícias: “… isto são coquinhos, ali mata-bois, estas choupezas. 'Estas' fui eu que as prantei há mais de 60 anos. Aquelas e 'maisaquelas' ninguém sabe o que sejam…”.
E pinheiros. Tão enormes que lá de cima protegem o jardim cá em baixo. Passeiam o olhar pelo mar fora.
Dezenas de bancos de madeira pelas avenidas. Entre as árvores.
Quem vem de Leste, entra pela porta dos obeliscos de Nasoni. A poucos metros, um lago de águas sempre renovadas. Nele, mergulha uma escultura de João Baptista. Do braço direito, brota água que recolhe do lago. Há anos, sem folgas, baptiza Jesus Cristo.
Nas bordas do lago, um edital camarário de apelo sanitário: “Não deixe no chão/aquilo que é do cão”. Distribui saquinhos de plástico.
Uns metros adiante, o coreto. A austeridade, meretriz da tristeza do povo, silenciou-o. Abandonou a música. Só toca no São João.
Mais um lago. Águas em alto repuxo.
Para Oeste, um monumento nacional do séc. XVIII: o Chafariz do Passeio Alegre de Nicolau Nasoni.
Virado ao rio, o campo de minigolfe de pouco mais de 40 anos. Organiza, anualmente, dezenas de campeonatos.
Mais idoso que o jardim, esquinado a Norte, o Chalé Suísso, ou do Passeio Alegre: “… escreve-se à moda antiga, com dois “ss”, assim é que está bem. Pode ver na net", diz D.ª Maria que ali trabalha há anos. Sítio de tertúlias. Camilo Castelo Branco e Ramalho Ortigão ali paravam.
A uns dez metros do Douro, imperam dezenas e dezenas de palmeiras, em correnteza paralela ao jardim até ao mar. Entre si, deixam espaços de estacionamento. Os Apartamentos das Palmeiras. Daí se gozava o mar, o casario da margem esquerda, as luzinhas dos barquinhos de pesca de arrasto. Noite dentro, estranhos abalos telúricos estremeciam os carros em recolhimento nas madrugadas do Douro.
Moralista, a Câmara Municipal despejou-os. Apartamentos sem renda!? Proibição de estacionar.
Há um todo harmónico. No jardim, fiada de palmeiras ao longo do rio, barquitos de pesca da Afurada, dezenas de pescadores que aí lançam o anzol. Tudo se harmoniza com o Douro.
Raul Brandão, escritor e voz do Jardim da Foz do Douro, inquire sempre: “Quem fez mal à República?”
Jardim do Passeio Alegre, “à beira-mar plantado”!
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