sexta-feira, 12 de abril de 2019

"CANSEI-ME... RENDO-ME...!"

HÉCTOR LLANOS MARTÍNEZ 11 NOV 2018


Leonardo Haberkorn, jornalista e escritor, foi professor numa universidade de Montevideu. Corre na internet um artigo seu publicado em papel, em 2015, com o título "Me cansé... me rindo...", onde declara ter deixado o ensino, que antes o apaixonava, e explica porquê.

Tomámos a liberdade de o traduzir, pois, por certo, ele tocará muitos professores e directores de escolas portuguesas. Desejável é que tocasse instâncias superiores e, de modo mais alargado, toda a sociedade.

"Depois de muitos e muitos anos, hoje dei a última aula na Universidade...

Cansei-me de lutar contra os telemóveis, contra o whatsapp e contra o facebook.

Ganharam-me.

Rendo-me.

Atiro a toalha ao chão.

Cansei-me de falar de assuntos que me apaixonam perante jovens que não conseguem desviar a vista do telemóvel que não pára de receber selfies.

Claro que nem todos são assim.

Mas cada vez são mais...

Até há três ou quatro anos a advertência para deixar o telemóvel de lado durante 90 minutos, ainda que fosse só para não serem mal-educados, ainda tinha algum efeito.

Agora não.

Pode ser que seja eu, que me desgastei demasiado no combate.

Ou que esteja a fazer algo mal.

Mas há algo certo: muitos desses jovens não têm consciência do efeito ofensivo e doloroso do que fazem.

Além disso, cada vez é mais difícil explicar como funciona o jornalismo a pessoas que o não consomem nem vêem algum sentido em estar verdadeiramente informadas.

Esta semana foi tratado o tema Venezuela.

Só uma estudante entre 20 conseguiu explicar o básico do conflito.

O muito básico.

O resto não fazia a mais pequena ideia.

Perguntei-lhes (...) o que se passa na Síria?

Silêncio.

Que partido é mais liberal ou que está mais à 'esquerda' nos Estados Unidos, os democratas ou os republicanos?

Silêncio.

Sabem quem é Vargas Llosa?

Sim!

Alguém leu algum dos seus livros?

Não, ninguém!

Lamento que os jovens não possam deixar o telemóvel, nem na aula.

Levar pessoas tão desinformadas para o jornalismo é complicado.

É como ensinar botânica a alguém que vem de um planeta onde não existem vegetais.

Num exercício em que deviam sair para procurar uma notícia na rua, uma estudante regressou com a notícia de que se vendiam, ainda, jornais e revista na rua.

Chega um momento em que ser jornalista é colocar-se na posição do contra.

Porque está treinado a pôr-se no lugar do outro, cultiva a empatia como ferramenta básica de trabalho.

E então vê que estes jovens, que continuam a ter inteligência, simpatia e afabilidade, foram enganados, a culpa não é só deles.

Que a incultura, o desinteresse e a alienação não nasceram com eles.

Que lhes foram matando a curiosidade e que, com cada professor que deixou de lhes corrigir as faltas de ortografia, ensinaram-lhes que tudo é mais ou menos o mesmo.,,

Então, quando compreendemos que eles também são vítimas, quase sem darmos conta vamos baixando a guarda.

E o mau é aprovado, como medíocre e o medíocre passa por bom, e o bom, as poucas vezes que acontece, celebra-se como se fosse brilhante.

Não quero fazer parte deste círculo perverso.

Nunca fui assim e não serei assim.

O que faço, sempre fiz questão de o fazer bem.

O melhor possível.

E não suporto o desinteresse, face a cada pergunta que faço e para a qual a resposta é o silêncio.

Silêncio...

Silêncio...

Silêncio. ..!!!

Eles queriam que a aula terminasse.

Eu também."



Talvez o pior de tudo seja o facto de aqueles alunos que vão ser Adultos amanhã, sem terem crescido nem amadurecido intelectualmente, julgam-se cheios de Direitos e sem Deveres nem Responsabilidade .

Alguns serão Políticos e até Governantes …ASSUSTA!

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