sábado, 24 de março de 2018

Rui Rio não percebeu nada de nada






24 de Março de 2018

Nunca esperei que Rui Rio trouxesse grandes ideias. Mas sempre esperei que trouxesse seriedade ao debate político. Se ele não traz uma coisa nem outra, tem para oferecer o quê, afinal?


Peço desculpa por regressar ao tema, mas há coisas que me encanitam. Ouvir Rui Rio declarar, acerca do caso Barreiras Duarte, que o que aconteceu “foi de uma desproporção brutal relativamente àquilo que estava em causa”, é um absurdo tão grande que não pode passar em claro. Rio falou mesmo num “massacre” que “não é bom para a democracia”, e que representa “uma transformação negativa na sociedade portuguesa”. A sério? Ora, tendo sido eu uma das pessoas que mais insistentemente escreveu sobre o assunto, não quero ficar no papel de Touro Sentado enquanto tentam vestir à pressa Barreiras Duarte com as roupas ensanguentadas do general Custer. Se houve algum “massacre”, os responsáveis não são os jornalistas, não são os colunistas, nem são os conspiradores do PSD. O primeiro responsável é Feliciano Barreiras Duarte e o segundo é Rui Rio.

Portanto, convém fixar os factos de uma vez por todas, e alinhavar uma espécie de guia político para totós, de forma a que o actual presidente do PSD não roube a Santana Lopes o recorde – que sempre tive por imbatível – de maior número de gafes destrambelhadas por semana de mandato. Rui Rio nunca será primeiro-ministro, mas a continuar por este caminho desastroso pode espatifar o maior partido da oposição – exercício que, por mais incrível que lhe possa parecer, eu não desejo que pratique. Se o primeiro erro deste processo está na criação de um “visiting scholar” que nunca visitou coisa alguma, não foi por isso que o “massacre” ocorreu. O “massacre” começou no dia em que Rui Rio comentou o caso, e disse: “Há um aspecto do seu currículo que estava a mais, não estava preciso, e ele corrigiu.”

Com esta inteligentíssima frase, que desvalorizava um assunto evidentemente grave, até pelo insuportável histórico de trafulhices académicas da recente política portuguesa, Rui Rio achou que ia ganhar tempo. Mas a única coisa que fez foi dar tempo à comunicação social e aos milhões de portugueses que sabem googlar para se entreterem a investigar mais a fundo a performance académica e política do senhor Feliciano. Tivesse Barreiras Duarte apresentado de imediato a demissão, ou tivesse Rio demitido imediatamente Barreiras Duarte, e o terrível “massacre” – também conhecido como “escrutínio” – jamais teria ocorrido.

Infelizmente para os dois, quando a opinião pública descobriu a famosa tese de mestrado, aquilo que tinha diante de si era de um calibre muitíssimo diferente. Os portugueses depararam-se nesse momento não com um político que dourou o currículo, mas com um homem incapaz de escrever uma frase em português ou alinhavar um raciocínio complexo. Aí a pergunta deixou de ser “como é que ele foi capaz de fazer isto?”, e passou a ser “como é que ele chegou até aqui?”. A primeira pergunta é do domínio da ética e diz respeito ao próprio. A segunda pergunta é do domínio da política e diz respeito a Rui Rio.

É verdade que Rio andou a apregoar banhos de ética, e quando se olha para a sua equipa parece que quer o duche só para ele – mas o problema Barreiras Duarte vai muito além disso. Rui Rio apregoou também um profissionalismo e uma exigência que este caso destruiu pela base, e em cima disso ainda veio queixar-se da comunicação social, como se reclamar por melhores políticos prejudicasse a democracia portuguesa. Eu nunca esperei que Rui Rio trouxesse grandes ideias. Mas sempre esperei que trouxesse seriedade ao debate político. Se ele não traz uma coisa nem outra, tem para oferecer o quê, afinal?

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