POR NICOLAU SANTOS
Bom dia.
Desculpem, mas não há peru, rabanadas e lampreias de ovos que me façam passar o engulho da fatura que neste final do ano veio parar outra vez aos bolsos dos contribuintes por mais um banco que entrega a alma ao criador, no caso o Banif, no caso mais 3 mil milhões. É de mais, é inaceitável, é uma ignomínia para todos os que estão desempregados ou caíram no limiar da pobreza por causa desta crise e mais uma violência brutal para os que continuam a pagar impostos (e que são apenas cerca de 50% de todos os contribuintes).
Todos nos lembramos do cortejo dos cinco maiores banqueiros portugueses (Ricardo Salgado, Fernando Ulrich, Nuno Amado, Faria de Oliveira e Carlos Santos Ferreira) a irem ao Ministério das Finanças e depois à TVI exigir ao então ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, para pedir ajuda internacional.
Todos nos lembramos como o santo e a senha da altura era o da insustentável dívida pública portuguesa por erros de gestão do Governo de José Sócrates.
Todos nos lembramos das sucessivas reafirmações de que a banca estava sólida por parte do Banco de Portugal e do governador Carlos Costa.
Todos nos lembramos dos testes de stress aos bancos conduzidos pela Autoridade Bancária Europeia – e como os bancos nacionais passaram sempre esses testes. E depois disso BPI, BCP, CGD e Banif tiveram de recorrer à linha de crédito de 12 mil milhões acordada com a troika. E depois disso o BES implodiu – e agora o Banif também. E depois disso só o BPI pagou até agora tudo o que lhe foi emprestado. E antes disso já o BPN e o BPP tinham implodido. E a Caixa vai ter de fazer um aumento de capital. E o Montepio é uma preocupação. É de mais! Chega! Basta!
No caso do Banif, é claro que o governador Carlos Costa tem enormes responsabilidades na forma como o problema acabou por ter de ser resolvido. No caso do BES foi ele também que seguiu a estratégia da resolução, da criação do Novo Banco e do falhanço total dessa estratégia – a venda rápida que não aconteceu, a venda sem despedimentos que também não vai acontecer, os 17 interessados que afinal eram só três, as propostas que não serviam, e o banco que era para ser vendido inteiro e agora vai ser vendido após uma severa cura de emagrecimento. É claro também que a ex-ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, tem responsabilidades diretas no caso, por inação ou omissão. E é claro que o ex-primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, geriu politicamente o dossiê.
Mas não confundamos os políticos e o polícia com os bandidos, com os que levaram a banca portuguesa ao tapete.
E para isso nada melhor do que ler o excelente texto que o Pedro Santos Guerreiro e a Isabel Vicente escreveram na revista do Expresso da semana passada com um título no limite mas que é um grito de alma: «O diabo que nos impariu» - ou como os bancos nacionais destruíram 40 mil milhões desde 2008. Aí se prova que houve seguramente muitos problemas, mas que a origem de tudo está no verdadeiro conúbio lunar que se viveu entre a banca e algumas empresas e alguns empresários do setor da construção.
Perguntam os meus colegas:
«Sabe quem é Emídio Catum?
É um desses empresários da construção, que estava na lista de créditos do BES com empresas que entretanto faliram. Curiosamente, Catum estava também na lista dos maiores devedores ao BPN, com empresas de construção e imobiliário que também faliram».
E como atuava Catum?
«O padrão é o mesmo: empresas pedem crédito, não o pagam, vão à falência, têm administradores judiciais, não pagam nem têm mais ativos para pagar, o prejuízo fica no banco, o banco é intervencionado, o prejuízo passa para o Estado». Simples, não é, caro leitor?
A pergunta que se segue é:
E o tal de Catum está preso? Não, claro que não.
E assim, de Catum em Catum, ficámos nós que pagamos impostos com uma enorme dívida para pagar que um dia destes vai levar o Governo a aumentar de novo os impostos ou a cortar salários ou a baixar prestações sociais. Mas se fosse só o Catum… Infelizmente, não.
Até as empresas de Luís Filipe Vieira deixaram uma dívida de 17 milhões do BPN à Parvalorem, do Estado, e tinham ainda por pagar 600 milhões de crédito do BES.
O ex-líder da bancada parlamentar do PSD, Duarte Lima,deixou perdas tanto no Novo Banco como no BPN.
Arlindo Carvalho, ex-ministro cavaquista, também está acusado por ilícitos relacionados com crédito concedido pelo BPN para compra de terrenos.
E um dos homens fortes do cavaquismo, Dias Loureiro é arguido desde 2009 por compras de empresas em Porto Rico e Marrocos, suspeita de crimes fiscais e burlas. Mas seis anos depois, o Ministério Público ainda não acusou Dias Loureiro, nem o processo foi arquivado.
Dos 50 maiores devedores do BES, que acumulavam um crédito total de dez mil milhões de euros, «o peso de construtores e promotores imobiliários é avassalador». No BPN, «mais de 500 clientes com dívidas iguais ou superiores a meio milhão de euros deixaram de pagar».
E a fatura a vir parar sempre aos bolsos dos mesmos...
Por isso, o artigo de Pedro Santos Guerreiro e Isabel Vicente é imperdível. Para ao menos sabermos que o que aconteceu não foi por acaso. Que muita gente não pagou o que devia ou meteu dinheiro ao bolso – e esperou calmamente que o Estado viesse socializar os prejuízos enquanto eles privatizaram os lucros.
"O mundo da realidade tem os seus limites. O mundo da imaginação não tem fronteiras." J.J. Rousseau ||| Faz mais ruído uma árvore que cai do que uma floresta a crescer.
quinta-feira, 31 de dezembro de 2015
Os Emídios Catuns que nos pregaram um calote de 6,3 mil milhões e andam à solta
A SUÍÇA ESTREMECE com a queda lenta e segura do segredo bancário!
A SUIÇA ESTREMECE
Acredita-se que os brasileiros têm 400 bilhões de dólares em paraísos fiscais na Suíça.
A Argentina teria 200 bilhões.
A maior lavanderia de dinheiro do mundo ameaça falir ...
Os belos bancos, elegantes, silenciosos de Basileia e Berna estão ofegantes.
Poderia dizer-se que eles estão assistindo na penumbra a uma morte ou estão velando um moribundo.
Esse moribundo, que talvez acabe mesmo morrendo, é o segredo bancário suíço.
O ataque veio dos Estados Unidos, em acordo com o presidente Obama.
O primeiro tiro de advertência foi dado na quarta-feira.
A USB-União de Bancos Suíços, gigantesca instituição bancária suíça, viu-se obrigada a fornecer os nomes de 250 clientes americanos por ela
ajudados para defraudar o fisco.
O banco protestou, mas os americanos ameaçaram retirar a sua licença nos Estados Unidos.
Os suíços, então, passaram os nomes.
E a vida bancaria foi retomada tranquilamente.
Mas, no fim da semana, o ataque foi retomado.
Desta vez os americanos golpearam forte, exigindo que a USB forneça o nome dos 52.000 clientes americanos titulares de contas ilegais.
O banco protestou.
A suíça ficou temerosa.
O partido de extrema-direita, UDC-União Democrática do Centro, que detêm um terço das cadeiras no Parlamento Federal, propõe que o segredo bancário seja inscrito e ancorado pela Constituição Federal.
Mas como resistir?
A União de Bancos Suíços não pode perder sua licença nos EUA, pois é nesse país que aufere um terço de seus benefícios.
Um dos pilares da Suíça está sendo sacudido.
O segredo bancário suíço não é coisa recente.
Esse dogma foi proclamado por uma lei de 1934, embora já existisse desde 1714.
No inicio do século 19, o escritor francês Chateaubriand escreveu que, neutros nas grandes revoluções nos Estado que os rodeavam, os suíços enriqueceram à custa da desgraça alheia e fundaram os bancos em cima das calamidades humanas.
Acabar com o segredo bancário suiço será uma catástrofe económica.
Para Hans Rudolf Merz, presidente da Confederação Helvética, uma falência da União dos Bancos Suíços custaria 300 bilhões de francos suíços (1 franco suíço = R$ 2,94 em Jun.15).
E não se trata apenas do UBS.
Toda a rede bancária do país funciona da mesma maneira.
O historiador suíço Jean Ziegler, que há mais de 30 anos denuncia a imoralidade helvética, estima que os banqueiros do país, amparados no segredo bancário, tornam frutíferos três trilhões de dólares de fortunas privadas estrangeiras, sendo que os ativos estrangeiros, chamados institucionais, como os fundos de pensão, são nitidamente minoritários.
Ziegler acrescenta ainda que se calcula em 27% a parte da Suíça no conjunto dos mercados financeiros “offshore” do mundo, bem à frente de Luxemburgo, Caribe ou do extremo Oriente.
Na Suiça, um pequeno país de 8 milhões de habitantes, 107 mil pessoas trabalham em bancos.
O manejo do dinheiro na Suíça, diz Ziegler, reveste-se de um caráter sacramental.
Guardar, recolher, contar, especular e ocultar o dinheiro, são todos atos que se revestem de uma majestade ontológica, que nenhuma palavra deve macular e realiza-se em silêncio e recolhimento .
Onde foram parar as fortunas recolhidas pela Alemanha nazi?
Onde estão as fortunas colossais de ditadores como Mobuto do Zaire,Eduardo dos Santos de Angola, dos Barões da droga Colombiana, Papa-Doc do Haiti, de Mugabe do Zimbabwe e da Máfia Russa?
Quantos atuais e ex-governantes, presidentes, ministros, reis e outros instalados no poder, até em cargos mais discretos como prefeitos de municípios tem polpudas contas na Suiça?
Quantas ficam eternamente esquecidas na Suíça, congeladas, e quando os titulares das contas morrem ou caem da cadeira do poder, estas se tornam impossíveis de alcançar pelos legítimos herdeiros ou pelos países espoliados?.
Por que, após a morte de Mobuto, os seus filhos nunca conseguiram entrar na Suiça?
Tudo ficou lá para sempre e em segredo ...
Agora surge outro perigo, depois do duro golpe dos americanos.
Na mini cúpula europeia que se realizou em Berlim (em preparação aoencontro do G-20 em Londres), França, Alemanha e Inglaterra (o que foi inesperado) chegaram a um acordo no sentido de sancionar os paraísos fiscais.
“Precisamos de uma lista daqueles que recusam a cooperação internacional”, vociferou a chancelar Angela Merkel."
No domingo o encarregado do departamento do Tesouro britânico Alistair Darling, apelou aos suíços para se ajustarem às leis fiscais e bancarias europeias.
Vale observar, contudo que a Suíça não foi convidada para participar do G-20 de Londres, quando serão debatidas as sanções a serem adotadas contra os paraísos fiscais.
Há muito tempo se deseja o fim do segredo bancário.
Mas, até agora, em razão da prosperidade económica mundial, todas as tentativas eram abortadas.
Mas hoje estamos em crise. E viva a crise!
Barack Obama, quando era senador, denunciou com perseverança a imoralidade desses reinados de paz para o dinheiro corrompido.
Hoje ele é presidente.
É preciso acrescentar que os Estados Unidos tem muitos defeitos, mas a fraude fiscal sempre foi considerada um dos crimes mais graves do país.
Nos anos 30, os americanos conseguiram caçar Al Capone. Sob que pretexto?
Fraude fiscal!
Muito em breve, haverá a queda do império financeiro suíço.
sábado, 12 de dezembro de 2015
Não lhes perdoo!
26 de novembro de 2015Acaba hoje aquela que constitui a mais penosa experiência política a que me foi dado assistir na minha vida adulta em democracia. Salvaguardadas as exceções que sempre existem, quero dizer que nunca me senti tão distante de uma governação como daquela a que este país sofreu desde 2011.
Não duvido que alguns dos governantes que hoje transitam para o passado tentaram fazer o seu melhor ao longo destes cerca de quatro anos e meio. Em alguns deles detetei mesmo competência técnica e profissional, fidelidade a uma linha de orientação que consideraram ser a melhor para o país que lhes calhou governarem. Mas há coisas que, na globalidade do governo a que pertenceram, nunca lhes perdoarei.
Desde logo, a mentira, a descarada mentira com que conquistaram os votos crédulos dos portugueses em 2011, para, poucas semanas depois, virem a pôr em prática uma governação em que viriam a fazer precisamente o contrário daquilo que haviam prometido. As palavras fortes existem para serem usadas e a isso chama-se desonestidade política.
Depois, a insensibilidade social. Assistimos no governo que agora se vai, sempre com cobertura ao nível mais elevado, a uma obscena política de agravamento das clivagens sociais, destruidora do tecido de solidariedade que faz parte da nossa matriz como país, como que insultando e tratando com desprezo as pessoas idosas e mais frágeis, desenvolvendo uma doutrina que teve o seu expoente na frase de um anormal que jocosamente falou, sem reação de ninguém com responsabilidade, de "peste grisalha". Vimos surgir, escudado na cumplicidade objetiva do primeiro-ministro, um discurso "jeuniste" que chegou mesmo a procurar filosofar sobre a legitimidade da quebra da solidariedade inter-geracional.
Um dia, ouvi da boca de um dos "golden boys" desta governação, a enormidade de assumir que considerava "legítimo que os reformados e pensionistas fossem os mais sacrificados nos cortes, pela fatia que isso representava nas despesas do Estado mas, igualmente, pela circunstância da sua capacidade reivindicativa de reação ser muito menor dos que os trabalhadores no ativo", o que suscitava menos problemas políticos na execução das medidas. Essa personagem foi ao ponto de sugerir a necessidade de medidas que estimulassem, presumo que de forma não constrangente, o regresso dos velhos reformados e pensionistas, residentes nas grandes cidades, "à provincia de onde tinham saído", onde uma vida mais barata poderia ser mais compatível com a redução dos seus meios de subsistência.
Fui testemunha de atos de desprezo por interesses económicos geoestratégicos do país, pela assunção, por mera opção ideológica, por sectarismo político nunca antes visto, de um desmantelar do papel do Estado na economia, que chegou a limites quase criminosos. Assisti a um governante, que hoje sai do poder feito ministro, dizer um dia, com ar orgulhosamente convicto, perante investidores estrangeiros, que "depois deste processo de privatizações, o Estado não ficará na sua posse com nada que dê lucro".
Ouvi da boca de outro alto responsável, a propósito do processo de privatizações, que "o encaixe de capital está longe de ser a nossa principal preocupação. O que queremos mostrar com a aceleração desse processo, bem como com o fim das "golden shares" e pela anulação de todos os mecanismos de intervenção e controlo do Estado na economia, é que Portugal passa a ser a sociedade mais liberal da Europa, onde o investimento encontra um terreno sem o menor obstáculo, com a menor regulação possível, ao nível dos países mais "business-friendly" do mundo".
Assisti a isto e a muito mais. Fui testemunha do desprezo profundo com que a nossa Administração Pública foi tratada, pela fabricação artificial da clivagem público-privado, fruto da acaparação da máquina do Estado por um grupo organizado que verdadeiramente o odiava, que o tentou destruir, que arruinou serviços públicos, procurando que o cidadão-utente, ao corporizar o seu mal-estar na entidade Estado, acabasse por se sentir solidário com as políticas que aviltavam a máquina pública.
No Ministério dos Negócios Estrangeiros, assisti a uma operação de desmantelamento criterioso das estruturas que serviam os cidadãos expatriados e garantiam a capacidade mínima para dar a Portugal meios para sustentar a sua projeção e a possibilidade da máquina diplomática e consular defender os interesses nacionais na ordem externa. Assisti ao encerramento cego de estruturas consulares e diplomáticas (e à alegre reversão de algumas destas medidas, quando conveio), à retirada de meios financeiros e humanos um pouco por todo o lado, à de lapidação de património adquirido com esforço pelo país durante décadas, cuja alienação se fez com uma irresponsável leveza de decisão.
Nunca lhes perdoarei o que fizeram a este país ao longo dos últimos anos. E, muito em especial, não esquecerei que a atuação dessas pessoas, à frente de um Estado que tinham por jurado inimigo e no seio do qual foram uma assumida "quinta coluna", conseguiu criar em mim, pela primeira vez em mais de quatro décadas de dedicação ao serviço público - em que cultivei um orgulho de ser servidor do Estado, que aprendi com os exemplos do meu avô e do meu pai -, um sentimento de desgostosa dessolidarização com o Estado que tristemente lhes coube titular durante este triste quadriénio.
Por essa razão, neste dia em que, com imensa alegria, os vejo partir, não podia calar este meu sentimento profundo. Há dúvidas quanto ao futuro que aí vem? Pode haver, mas todas as dúvidas serão sempre mais promissoras que este passado recente que nos fizeram atravessar. Fosse eu católico e dir-lhes-ia: vão com deus. Como não sou, deixo-lhe apenas o meu silêncio.
Publicado por Francisco Seixas da Costa
A Holanda, em que 6% da população é muçulmana
multiculturalismo!
O povo holandês está cansado de ser pisado pelos
muçulmanos e abandona o seu modelo de longa data de
multiculturalismo, que não fez senão incentivar os imigrantes
muçulmanos a criarem uma sociedade paralela dentro do país.
Um novo projecto de lei apresentado ao Parlamento pelo ministro do
Interior holandês, Piet Hein Donner, em 16 de Junho, diz o seguinte:
"O governo partilha a insatisfação do povo holandês face ao modelo de
uma sociedade multicultural na Holanda e manifesta a sua intenção de
agora concentrar suas prioridades nos valores fundamentais do povo
holandês. Sob o novo sistema de integração, os valores holandeses
terão um papel fulcral e, portanto, o governo "não adere mais ao
modelo de uma sociedade multicultural."
A proposta continua:
"Uma integração mais rigorosa é perfeitamente justificada porque isso
é o que é exigido pelo Governo e todo o seu povo. Esta orientação é
agora absolutamente necessária porque a sociedade holandesa está a
desintegrar-se, em termos de identidade e já ninguém se sente em sua
casa na Holanda.
"A nova política de integração será muito mais
exigente por com os imigrantes. Por exemplo, os imigrantes devem
necessariamente aprender holandês e o governo holandês vai tomar
medidas coercivas em relação aos imigrantes que ignoram os valores do
país e desobedecem às leis holandesas.
Assim, Governo holandês vai deixar de dar subsídios especiais aos
muçulmanos para os integrar (até porque, de qualquer forma, eles o não fazem) porque, segundo Donner, "não compete ao governo e aos fundos públicos a integração dos imigrantes.
"O projecto prevê também a
criação de legislação proibindo os casamentos forçados, bem como
legislação impondo medidas severas para esses imigrantes muçulmanos
que, por sua livre vontade, reduzem suas hipóteses de emprego pela
maneira como se vestem. Especificamente, o Governo vai proibir, a
partir de Janeiro 2016 o uso de roupas que cubram o rosto, como o
véu, burca, hijab, etc.
A Holanda deu-se conta, talvez tardiamente, que o seu liberalismo
multicultural está em vias de fazer do país um território de tribos do
deserto que está prestes a matar as origens do país e a sua própria identidade.
O futuro da Austrália, Reino Unido, Canadá, Bélgica e França pode
muito bem enquadrar-se neste texto!!! E o nosso também, enquanto
não é demasiado tarde!
Lutemos pela nossa cultura e identidade nacional!!!
Também outro artigo:
E o pior é que se continuarmos impávidos e serenos, a proteger a liberdade religiosa e de expressão, de quem não nos respeita, mais... de quem nos despreza, é mesmo isso que vai acontecer, a prazo, as feministas do piropo podem pensar em começar a preocupar-se com a Sharia. Mas eu acho bem, acho mesmo muito bem, afinal não estarei cá para ver, as nossas netas que se lixem, pois não é?
Imagens e textos (tradução automática), colhidos da internet
A ITALIA de "Cocoras"!
O director do Instituto Garofani de Rozzano, na província italiana de Milão, decidiu cancelar as festividades de Natal em nome do respeito das várias culturas e credos dos alunos do estabelecimento de ensino...!!!
A decisão provocou a ira dos pais e uma reacção do primeiro-ministro de Itália, que considerou que o responsável está a cometer um “erro enorme”.
Na escola, que tem cerca de mil alunos, entre turmas da primária até ao ensino secundário, perto de 20% de estudantes são de fés não cristãs, sendo que a maioria pertence a famílias que seguem o islamismo.
O director do instituto, Marco Parma, de 63 anos, decidiu que este ano o habitual concerto de Natal das crianças do primeiro ciclo seria adiado para 21 de Janeiro e passaria a ser um concerto de Inverno, sem temas com conteúdos religiosos. O responsável rejeitou a proposta de duas mães de alunos que se ofereceram para ensinar canções de Natal aos mais pequenos durante os intervalos. No entanto, considerou que as festas de Natal que cada sala costuma celebrar devem ser realizadas.
A decisão do responsável foi recebida com críticas e manifestações pela população de Rozzano, bem como no resto de Itália e mesmo do Governo. Marco Parma, citado pelos media italianos, argumenta que este tipo de iniciativas, “num ambiente multiétnico, provoca problemas”, dando como exemplo a experiência anterior. “No ano passado tivemos o concerto de Natal e alguns pais insistiram que houvesse canções de Natal. As crianças muçulmanas não cantaram, ficaram apenas paradas, absolutamente rígidas. Não é simpático ver uma criança sem cantar e a ser chamada pelos pais para sair do palco”, observou.
Parma afirmou que acredita que o “respeito pelas sensibilidades daqueles que pensam de forma diferente, têm culturas e religiões diferentes, é um passo em frente para a integração”.
O director da escola acabou por apresentar a sua demissão, sublinhando que a sua decisão contou com o apoio de professores, que discutiram a questão e consideraram que esta seria a melhor forma de lidar com as diferenças religiosas.
Marco Parma vai ser ouvido esta segunda-feira no gabinete regional de educação de Lombardia, para explicar as razões que o levaram a tomar a sua decisão. Deverá aí apresentar oficialmente a sua demissão.
O primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi, afirmou, em declarações ao jornal Corriere della Sera, que o “Natal é muito mais importante que um director a ser provocador”. “Se ele pensa que está a promover a integração e a coexistência desta forma, parece-me que ele cometeu um erro enorme”, defendeu o chefe de Governo. “Os italianos, tanto laicos como cristão, nunca irão desistir do Natal”, rematou.
O líder da Liga do Norte, o partido nacionalista da Lombardia, exigiu a demissão do director da escola, alegando que “cancelar as tradições é um favor ao terrorismo”.
Este caso acontece dias depois de vários infantários na Toscânia terem decidido não montar a tradicional cena da natividade por recearem ofender as famílias não cristãs.
Hijra - O Cavalo de Tróia Moderno.
Pintura de Henri-Paul Motte
E se for realmente como suspeitamos?
É precisamente a pergunta que eu faço a mim mesmo...
Pergunto-me: como é que, um refugiado que tem que pagar 3.000,00€ a um passador, sabendo este que ele precisa de muitos anos e ser muito poupado e trabalhador para chegar a ter 1.000,00€?
De onde vem este dinheiro todo?
A estratégia de reconquista... com 14 séculos de idade?
Quem são os migrantes que aportaram à Itália, à Grécia e a mais países europeus?
Dizem-se "refugiados" que perderam tudo... Os relatórios seguem, uns a seguir aos outros, para descrever as suas condições de vida terríveis. Eles têm, apenas, o suficiente para comer..., mas, assim que chegam, logo vemos pegarem nos telemóveis e falarem... para quem? Reclamam que não têm Internet e wi-fi...?!!!
Metade dos 22 milhões de Sírios vivem com menos de US$ 2,00 por dia, desde há mais de 2 anos, devido à guerra.
Então, como arranjam entre US$ 3.000,00 a US$ 5.000,00 para pagarem aos contrabandistas?
E, se alguém estiver a financiar a viagem a jihadistas disfarçados de refugiados?
Quem são os mais perseguidos na Síria e no Iraque? São cristãos, Yezidis, mulheres, velhos, crianças.
Há algum cristão em navios de carga que chegam às costas italiana e grega?
Não! São, essencialmente, muçulmanos.
Crianças, idosos, mulheres?
Não muitos, só os necessários para o espectáculo, a grande maioria são homens solteiros.
Calais é testemunha.
A ONU fala de um milhão de crianças sem um cobertor para enfrentarem o inverno, enquanto que os "traficantes" têm 2 ou 3 milhões de dólares para comprarem cargueiros e depois abandoná-los, como acontece regularmente.
E esses contrabandistas passaram a ser marinheiros, capitães, mecânicos. Eles teriam aprendido a navegar navios de carga, para depois os abandonarem?
Sabe-se que o Estado Islâmico tem enormes recursos financeiros (financiados por quem?), bancos, poços de petróleo....
Como não podem retornar de forma anónima à Europa, depois de lutar pelo Estado Islâmico, os "guerreiros muçulmanos" presumivelmente entram disfarçados como refugiados e escondidos em navios que navegam no Mediterrâneo.
Se a invasão muçulmana da Europa continua ao ritmo actual, em poucas décadas os cemitérios são os únicos lugares onde cristãos, judeus e outros... serão a maioria!!!
O Qatar é um dos países muçulmanos mais ricos e mais extremistas... Isto é bem conhecido, assim como a Arábia Saudita.
E porque será que esses países árabes não acolhem os seus irmãos?
Toda a Europa se preocupa em acolher os «migrantes» (?!), mas nenhum país islâmico se prontificou a recebê-los!!!
Para aqueles que ainda não sabem, a Embaixada do Qatar, situada numa das mais bonitas e caras avenidas de Bruxelas (Avenue Franklin Roosevelt) tem previsto o financiamento da construção de uma mesquita para 6000 pessoas!
No entanto, o Ministério das Relações Exteriores não só se recusou a aprovar este financiamento, mas, também, respondeu ao Centro de Tawfiq islâmica "...que seria paradoxal aceitar esse tipo de financiamento proveniente de um país que não aceita nenhuma liberdade religiosa".
O ministro das Relações Exteriores da Noruega, Jonas Gahr Støre, disse, ao jornal VG, a propósito do pedido da Arábia Saudita para a construção de uma mesquita:
"Podemos, apenas, dizer NÃO. O Ministério não aprova, mas aproveitou a oportunidade para acrescentar que a aprovação seria paradoxal,sabendo que tentar estabelecer uma comunidade cristã na Arábia Saudita será considerado um crime punível por decapitação."
NOTA: Outra mesquita está em construção no Court Saint-Étienne.
Eles têm o direito de destruir tudo o que é diferente do Islão (cristãos, coptas, judeus, budistas e, etc., por exemplo: Palmira), mas invadem países ocidentais com as suas mesquitas e minaretes....!
Em suma:
1. Por que razão recusam caixas com alimentos e medicamentos, somente porque têm o símbolo da “Cruz Vermelha” impresso na caixa?
2. Por que razão não vão para os países árabes? E porque razão os países árabes não os aceitam?
3. Onde vão buscar os EUR 3.000,00, por pessoa, para pagarem aos traficantes?
4. Qualquer País fora da Síria,designadamente islâmico,seria supostamente bom para ficarem em paz e segurança! Não... Os solteiros só querem países como a Alemanha, França e Inglaterra. Para os outros Países (como Portugal, Espanha, Itália, etc.) vão as famílias. Porque será?
6. DÁ QUE PENSAR..., NÃO É?
E se for realmente como suspeitamos?
É precisamente a pergunta que eu faço a mim mesmo...
Pergunto-me: como é que, um refugiado que tem que pagar 3.000,00€ a um passador, sabendo este que ele precisa de muitos anos e ser muito poupado e trabalhador para chegar a ter 1.000,00€?
De onde vem este dinheiro todo?
A estratégia de reconquista... com 14 séculos de idade?
Quem são os migrantes que aportaram à Itália, à Grécia e a mais países europeus?
Dizem-se "refugiados" que perderam tudo... Os relatórios seguem, uns a seguir aos outros, para descrever as suas condições de vida terríveis. Eles têm, apenas, o suficiente para comer..., mas, assim que chegam, logo vemos pegarem nos telemóveis e falarem... para quem? Reclamam que não têm Internet e wi-fi...?!!!
Metade dos 22 milhões de Sírios vivem com menos de US$ 2,00 por dia, desde há mais de 2 anos, devido à guerra.
Então, como arranjam entre US$ 3.000,00 a US$ 5.000,00 para pagarem aos contrabandistas?
E, se alguém estiver a financiar a viagem a jihadistas disfarçados de refugiados?
Quem são os mais perseguidos na Síria e no Iraque? São cristãos, Yezidis, mulheres, velhos, crianças.
Há algum cristão em navios de carga que chegam às costas italiana e grega?
Não! São, essencialmente, muçulmanos.
Crianças, idosos, mulheres?
Não muitos, só os necessários para o espectáculo, a grande maioria são homens solteiros.
Calais é testemunha.
A ONU fala de um milhão de crianças sem um cobertor para enfrentarem o inverno, enquanto que os "traficantes" têm 2 ou 3 milhões de dólares para comprarem cargueiros e depois abandoná-los, como acontece regularmente.
E esses contrabandistas passaram a ser marinheiros, capitães, mecânicos. Eles teriam aprendido a navegar navios de carga, para depois os abandonarem?
Sabe-se que o Estado Islâmico tem enormes recursos financeiros (financiados por quem?), bancos, poços de petróleo....
Como não podem retornar de forma anónima à Europa, depois de lutar pelo Estado Islâmico, os "guerreiros muçulmanos" presumivelmente entram disfarçados como refugiados e escondidos em navios que navegam no Mediterrâneo.
Se a invasão muçulmana da Europa continua ao ritmo actual, em poucas décadas os cemitérios são os únicos lugares onde cristãos, judeus e outros... serão a maioria!!!
O Qatar é um dos países muçulmanos mais ricos e mais extremistas... Isto é bem conhecido, assim como a Arábia Saudita.
E porque será que esses países árabes não acolhem os seus irmãos?
Toda a Europa se preocupa em acolher os «migrantes» (?!), mas nenhum país islâmico se prontificou a recebê-los!!!
Para aqueles que ainda não sabem, a Embaixada do Qatar, situada numa das mais bonitas e caras avenidas de Bruxelas (Avenue Franklin Roosevelt) tem previsto o financiamento da construção de uma mesquita para 6000 pessoas!
No entanto, o Ministério das Relações Exteriores não só se recusou a aprovar este financiamento, mas, também, respondeu ao Centro de Tawfiq islâmica "...que seria paradoxal aceitar esse tipo de financiamento proveniente de um país que não aceita nenhuma liberdade religiosa".
O ministro das Relações Exteriores da Noruega, Jonas Gahr Støre, disse, ao jornal VG, a propósito do pedido da Arábia Saudita para a construção de uma mesquita:
"Podemos, apenas, dizer NÃO. O Ministério não aprova, mas aproveitou a oportunidade para acrescentar que a aprovação seria paradoxal,sabendo que tentar estabelecer uma comunidade cristã na Arábia Saudita será considerado um crime punível por decapitação."
NOTA: Outra mesquita está em construção no Court Saint-Étienne.
Eles têm o direito de destruir tudo o que é diferente do Islão (cristãos, coptas, judeus, budistas e, etc., por exemplo: Palmira), mas invadem países ocidentais com as suas mesquitas e minaretes....!
Em suma:
1. Por que razão recusam caixas com alimentos e medicamentos, somente porque têm o símbolo da “Cruz Vermelha” impresso na caixa?
2. Por que razão não vão para os países árabes? E porque razão os países árabes não os aceitam?
3. Onde vão buscar os EUR 3.000,00, por pessoa, para pagarem aos traficantes?
4. Qualquer País fora da Síria,designadamente islâmico,seria supostamente bom para ficarem em paz e segurança! Não... Os solteiros só querem países como a Alemanha, França e Inglaterra. Para os outros Países (como Portugal, Espanha, Itália, etc.) vão as famílias. Porque será?
6. DÁ QUE PENSAR..., NÃO É?
Imagens e textos (tradução automática), colhidos da internet
O Silva das vacas !!!
Quanto mais vezes leio mais convicto fico de que o Sr. Luís Manuel Cunha é um génio da escrita pois num pequeno texto que escreveu há algum tempo, conseguiu definir o povo português e o seu presidente.
O Silva das vacas
Algumas das reminiscências da minha escola primária têm a ver com vacas. Porque a D.ª Albertina, a professora, uma mulher escalavrada e seca, mais mirrada que uva-passa, tinha um inexplicável fascínio por vacas. Primavera e vacas. De forma que, ora mandava fazer redacções sobre a primavera, ora se fixava na temática da vaca. A vaca era, assim, um assunto predilecto e de desenvolvimento obrigatório, o que, pela sua recorrência, se tornava insuportavelmente repetitivo. Um dia, o Zeca da Maria "gorda", farto de escrever que a vaca era um mamífero vertebrado, quadrúpede ruminante e muito amigo do homem a quem ajudava no trabalho e a quem fornecia leite e carne, blá, blá, blá, decidiu, num verdadeiro impulso de rebelião criativa, explicar a coisa de outra forma. E, se bem me lembro ainda, escreveu mais ou menos isto:
"A vaca, tal como alguns homens, tem quatro patas, duas à frente, duas atrás, duas à direita e duas à esquerda. A vaca é um animal cercado de pêlos por todos os lados, ao contrário da península que só não é cercada por um. O rabo da vaca não lhe serve para extrair o leite, mas para enxotar as moscas e espalhar a bosta. Na cabeça, a vaca tem dois cornos pequenos e lá dentro tem mioleira, que o meu pai diz que faz muito bem à inteligência e, por não comer mioleira, é que o padre é burro como um tamanco. Diz o meu pai e eu concordo, porque, na doutrina, me obriga a saber umas merdas de que não percebo nada como as bem-aventuranças. A vaca dá leite por fora e carne por dentro, embora agora as vacas já não façam tanta falta, porque foi descoberto o leite em pó. A vaca é um animal triste todo o ano, excepto no dia em que vai ao boi, disse-me o pai do Valdemar "pauzinho", que é dono do boi onde vão todas as vacas da freguesia. Um dia perguntei ao meu pai o que era isso da vaca ir ao boi e levei logo um estalo no focinho. O meu pai também diz que a mulher do regedor é uma vaca e eu também não entendi. Mas, escarmentado, já nem lhe perguntei se ela também ia ao boi."
Foi assim. Escusado será dizer que a D.ª Albertina, pouco dada a brincadeiras criativas, afinfou no pobre do Zeca um enxerto de porrada a sério. Mas acabou definitivamente com a vaca como tema de redacção. Recordei-me desta história da D.ª Albertina e da vaca do Zeca da Maria "gorda", ao ler que Cavaco Silva, presidente da República desta vacaria indígena, em visita oficial ao Açores, saiu-se a certa altura com esta pérola vacum: "Ontem eu reparava no sorriso das vacas, estavam satisfeitíssimas olhando o pasto que começava a ficar verdejante"! Este homem, que se deixou rodear, no governo, pelo que viria a ser a maior corja de gatunos que Portugal politicamente produziu; este homem, inculto e ignorante, cuja cabeça é comparada metaforicamente ao sexo dos anjos; este político manhoso que sentiu necessidade de afirmar publicamente que tem de nascer duas vezes quem seja mais honesto que ele; este "cagarola" que foi humilhado por João Jardim e ficou calado; este homem que, desgraçadamente, foi eleito presidente da República de Portugal, no momento em que a miséria e a fome grassam pelo país, em que o desemprego se torna incontrolável, em que os pobres são miseravelmente espoliados a cada dia que passa, este homem, dizia, não tem mais nada para nos mostrar senão o fascínio pelo "sorriso das vacas", satisfeitíssimas olhando o pasto que começava a ficar verdejante"! Satisfeitíssimas, as vacas?! Logo agora, em tempos de inseminação artificial, em que as desgraçadas já nem sequer dispõem da felicidade de "ir ao boi", ao menos uma vez cada ano!
Noticiava há dias o Expresso que, há mais ou menos um ano e aquando de uma visita a uma exploração agrícola no âmbito do Roteiro da Juventude, Cavaco se confessou "surpreendidíssimo por ver que as vacas, umas atrás das outras, se encostavam ao robô e se sentiam deliciadas enquanto ele, durante seis ou sete minutos, realizava a ordenha"! Como se fosse possível alguma vaca poder sentir-se deliciada ao passar seis ou sete minutos com um robô a espremer-lhe as tetas!! Não sei se o fascínio de Cavaco por vacas terá ou não uma explicação freudiana. É possível. Porque este homem deve julgar-se o capataz de uma imensa vacaria, metáfora de um país chamado Portugal, onde há meia-dúzia de "vacas sagradas", essas sim com direito a atendimento personalizado pelo "boi", enquanto as outras são inexoravelmente "ordenhadas"! Sugadas sem piedade, até que das tetas não escorra mais nada e delas não reste senão peles penduradas, mirradas e sem proveito.
A este "Américo Tomás do século XXI" chamou um dia João Jardim, o "sr. Silva". Depreciativamente, conforme entendimento generalizado. Creio que não. Porque este homem deveria ser simplesmente "o Silva". O Silva das vacas. Presidente da República de Portugal. Desgraçadamente.
Luís Manuel Cunha in «Jornal de Barcelos»
Algumas das reminiscências da minha escola primária têm a ver com vacas. Porque a D.ª Albertina, a professora, uma mulher escalavrada e seca, mais mirrada que uva-passa, tinha um inexplicável fascínio por vacas. Primavera e vacas. De forma que, ora mandava fazer redacções sobre a primavera, ora se fixava na temática da vaca. A vaca era, assim, um assunto predilecto e de desenvolvimento obrigatório, o que, pela sua recorrência, se tornava insuportavelmente repetitivo. Um dia, o Zeca da Maria "gorda", farto de escrever que a vaca era um mamífero vertebrado, quadrúpede ruminante e muito amigo do homem a quem ajudava no trabalho e a quem fornecia leite e carne, blá, blá, blá, decidiu, num verdadeiro impulso de rebelião criativa, explicar a coisa de outra forma. E, se bem me lembro ainda, escreveu mais ou menos isto:
"A vaca, tal como alguns homens, tem quatro patas, duas à frente, duas atrás, duas à direita e duas à esquerda. A vaca é um animal cercado de pêlos por todos os lados, ao contrário da península que só não é cercada por um. O rabo da vaca não lhe serve para extrair o leite, mas para enxotar as moscas e espalhar a bosta. Na cabeça, a vaca tem dois cornos pequenos e lá dentro tem mioleira, que o meu pai diz que faz muito bem à inteligência e, por não comer mioleira, é que o padre é burro como um tamanco. Diz o meu pai e eu concordo, porque, na doutrina, me obriga a saber umas merdas de que não percebo nada como as bem-aventuranças. A vaca dá leite por fora e carne por dentro, embora agora as vacas já não façam tanta falta, porque foi descoberto o leite em pó. A vaca é um animal triste todo o ano, excepto no dia em que vai ao boi, disse-me o pai do Valdemar "pauzinho", que é dono do boi onde vão todas as vacas da freguesia. Um dia perguntei ao meu pai o que era isso da vaca ir ao boi e levei logo um estalo no focinho. O meu pai também diz que a mulher do regedor é uma vaca e eu também não entendi. Mas, escarmentado, já nem lhe perguntei se ela também ia ao boi."
Foi assim. Escusado será dizer que a D.ª Albertina, pouco dada a brincadeiras criativas, afinfou no pobre do Zeca um enxerto de porrada a sério. Mas acabou definitivamente com a vaca como tema de redacção. Recordei-me desta história da D.ª Albertina e da vaca do Zeca da Maria "gorda", ao ler que Cavaco Silva, presidente da República desta vacaria indígena, em visita oficial ao Açores, saiu-se a certa altura com esta pérola vacum: "Ontem eu reparava no sorriso das vacas, estavam satisfeitíssimas olhando o pasto que começava a ficar verdejante"! Este homem, que se deixou rodear, no governo, pelo que viria a ser a maior corja de gatunos que Portugal politicamente produziu; este homem, inculto e ignorante, cuja cabeça é comparada metaforicamente ao sexo dos anjos; este político manhoso que sentiu necessidade de afirmar publicamente que tem de nascer duas vezes quem seja mais honesto que ele; este "cagarola" que foi humilhado por João Jardim e ficou calado; este homem que, desgraçadamente, foi eleito presidente da República de Portugal, no momento em que a miséria e a fome grassam pelo país, em que o desemprego se torna incontrolável, em que os pobres são miseravelmente espoliados a cada dia que passa, este homem, dizia, não tem mais nada para nos mostrar senão o fascínio pelo "sorriso das vacas", satisfeitíssimas olhando o pasto que começava a ficar verdejante"! Satisfeitíssimas, as vacas?! Logo agora, em tempos de inseminação artificial, em que as desgraçadas já nem sequer dispõem da felicidade de "ir ao boi", ao menos uma vez cada ano!
Noticiava há dias o Expresso que, há mais ou menos um ano e aquando de uma visita a uma exploração agrícola no âmbito do Roteiro da Juventude, Cavaco se confessou "surpreendidíssimo por ver que as vacas, umas atrás das outras, se encostavam ao robô e se sentiam deliciadas enquanto ele, durante seis ou sete minutos, realizava a ordenha"! Como se fosse possível alguma vaca poder sentir-se deliciada ao passar seis ou sete minutos com um robô a espremer-lhe as tetas!! Não sei se o fascínio de Cavaco por vacas terá ou não uma explicação freudiana. É possível. Porque este homem deve julgar-se o capataz de uma imensa vacaria, metáfora de um país chamado Portugal, onde há meia-dúzia de "vacas sagradas", essas sim com direito a atendimento personalizado pelo "boi", enquanto as outras são inexoravelmente "ordenhadas"! Sugadas sem piedade, até que das tetas não escorra mais nada e delas não reste senão peles penduradas, mirradas e sem proveito.
A este "Américo Tomás do século XXI" chamou um dia João Jardim, o "sr. Silva". Depreciativamente, conforme entendimento generalizado. Creio que não. Porque este homem deveria ser simplesmente "o Silva". O Silva das vacas. Presidente da República de Portugal. Desgraçadamente.
Luís Manuel Cunha in «Jornal de Barcelos»
Imagens e textos (tradução automática), colhidos da internet
quinta-feira, 10 de dezembro de 2015
MUNDO CÃO – O PERFIL DO TERRORISTA DOS NOSSOS DIAS – por José Goulão - 18/11/2015
As informações estão em poder da Interpol. Deitar-lhe a mão nestes tempos em que as leis e as fronteiras não são problema para assaltos a vidas, soberanias e privacidades, seria apenas uma questão de, digamos, “vontade política”, não é assim que costuma invocar-se? O seu paradeiro não é certamente segredo para a miríade de serviços secretos que apregoam defender “o nosso modo de vida”: é a Líbia, depois de tão bem democratizada pela NATO, onde ele exerce altos cargos políticos e operacionais no governo dominante, o mesmo que invoca para si próprio “o islamismo puro”.
Nome: Abdelhakim Belhadj. A história da sua vida dava um filme daqueles bem a gosto de Holywood, tanto mais que o seu currículo – em poder da Interpol, repito – corresponde às imagens dos rambos de séries A, B ou C cujos feitos heróicos coincidem com as vontades objectivas dos Estados Unidos e de Israel, países onde os fins e os agentes escolhidos para os executar justificam quaisquer meios e o recurso a psicopatas sanguinários.
Sabe a Interpol que Abdelhakim Belhadj é, no presente, o chefe do Estado Islâmico, ou ISIS ou Daesh, no Magrebe e que, operacionalmente, criou e orienta campos de treino de mercenários assassinos na Líbia, concretamente em Derna, Syrte e Sebrata, além de um escritório do ISIS em Djerba, na Tunísia.
Antes disto, Belhadj chefiou os terroristas do Grupo Islâmico Combatente na Líbia (GICL), que em 2007 mudou de nome para Al-Qaida, mais sintonizado com os tempos.Por quatro vezes, entre 1995 e 1998, tentou assassinar Khadaffi a mando do MI6, os serviços secretos ao serviço do terrorismo de Estado britânico. Perseguido na Líbia mudou-se para o Afeganistão, onde se instalou e agiu ao lado de Ussama bin-Laden, o qual dispensa apresentações.
Como a polícia espanhola suspeita de que foi um dos mandantes do atentado ferroviário em Madrid Atocha, em Março de 2004, foi detido logo a seguir na Malásia. Como se percebe, não terá sido difícil identificá-lo e prendê-lo, porque meia dúzia de dias e milhares de quilómetros mediaram entre crime e captura. Passou então maus bocados numa prisão secreta da CIA para onde foi transferido e onde ficou alojado para experimentar as famosas técnicas de tortura – “condicionamento de comportamento”, chamam-lhe nos Estados Unidos – do professor Seligman, métodos de cujas provas a CIA tentou desesperadamente impedir a divulgação.
Abdelhakim Belhadj restabeleceu-se depressa: para ele não se seguiram penas eternas no campo de concentração de Guantanamo, também ele eterno se a este Obama se sucederem outros obamas, coisa mais do que provável. É verdade que ainda foiextraditado para a Líbia, através de um acordo entre os Estados Unidos e o regime de Khadaffi, onde voltou a ser torturado, dessa feita às mãos do MI6 que antes servira.Nesta coisa a CIA e a sua irmã MI6 são muito ciosas, separam as águas, cada uma quer fazer a sua tarefa ainda que repetindo-se.
Khadaffi libertou-o em 2010, no quadro de uma “reconciliação nacional”, e mal teve tempo para se arrepender. Abdelhakim Belhadj viajou para o Qatar e no ano seguinte estava à frente de grupos de mercenários que, ao lado e protegidos pelos bombardeamentos da NATO – França e Reino Unido, principalmente – derrubaram e assassinaram Khadaffi. Como recompensa pelos serviços prestados, e por recomendação na NATO, o Conselho de Transição nomeou-o governador militar de Tripoli, a capital.
Belhadj não aqueceu o lugar. Ainda teve tempo, porém, para exigir e obter desculpas dos Estados Unidos e do Reino Unido pelas sevícias sofridas noutros tempos, e o que lá ia lá foi. Outras tarefas estratégicas o aguardavam. Partiu em finais de 2011 para a Síria, onde foi um dos principais fundadores do Exército Livre da Síria, os famosos “moderados” tão queridos da senhora Clinton, da NATO, da União Europeia – com destaque para a França – e dos regimes fundamentalistas do Golfo, Arábia Saudita à cabeça. O objectivo era derrubar Assad, mas Assad resiste e já lá vão mais de 250 mil mortos, milhões de refugiados e um país destroçado, massacre cujas responsabilidades nenhum intervencionista ilegal e ilegítimo assume.
Sempre sem perder tempo, Abdelhakim Belhadj regressou à Líbia natal, onde fundou um partido governante, a maneira que encontrou, num cenário de caos, para instalar os terroristas islâmicos no poder em Tripoli.
Na qualidade de figura de proa na Líbia, provavelmente já na posição de chefe do Estado Islâmico no Magrebe, que a Interpol reconhece, Abdelhakim Belhadj foi recebido em 2 de Maio de 2014 no Ministério dos Negócios Estrangeiros em Paris, tutelado por Laurent Fabius, ministro de Hollande e também um incondicional amigo de Israel.
Laurent Fabius, exactamente: que é ainda o ministro dos Negócios Estrangeiros de Hollande nestes dias em que continuam a sangrar as feridas abertas pelo assalto às vidas dos parisienses, ao que dizem cometido pela organização de que Abdelhakim Belhadj é um dos chefes máximos.
As informações sobre este terrorista-modelo dos nossos dias e o seu currículo estão nas mãos da Interpol. “Estamos em guerra”, proclama o presidente Hollande com os acenos concordantes do chefe da sua diplomacia. Vamos então esperar pelo que se segue, para ver o que acontece.
terça-feira, 1 de dezembro de 2015
Uma vida a falar da vida que não se teve, da vida no corredor da morte
SOFIA LORENA 01/12/2015
Curtis passou 19 anos à espera de ser executado. A condenação foi anulada e foi libertado, o que não significa que ficou livre. A impossibilidade de fazer conversa é um dos pesos que carrega.
Curtis McCarty esteve preso 21 aos, 19 dos quais no corredor da morte
Há pouco tempo, Curtis McCarty teve “uma experiência bizarra”. O pai, viúvo, voltou a casar e quando estava a arrumar a casa onde vivia com a mãe encontrou as cartas que ele enviara da prisão. “A partir de certa altura, havia ali muita violência. Não reconheci aquela pessoa. Era eu, mas era uma versão perversa de mim, não reconheci muito do que tinha escrito”, diz.
Curtis fala das cartas quando está a tentar explicar que não se lembra assim tão bem dos muitos anos que passou preso, 21, por um crime que não cometeu e dos três julgamentos, em 1986, 1989 e 1995, em que foi condenado à morte pelo assassínio de Pamela Willis, de 18 anos. “Sei que devia ter memórias mais vívidas, mas não tenho. Não sei como é que suportei esses julgamentos. Só sei que me levantava todos os dias da cama.”
Curtis nasceu pobre, na cidade norte-americana de Oklahoma, no estado norte-americano com o mesmo nome, e tomou más decisões. Aos 15 anos já tinha problemas com drogas e desistira da escola. Conheceu Pam, filha de um polícia que levava uma vida parecida. Pam foi morta em 1982 e Curtis, então com 19 anos, foi uma das muitas pessoas que os investigadores ouviram.
Quatro anos mais tarde foi acusado e condenado. Já tinha um filho com seis anos que vivia com a mãe e com quem nunca conseguiu construir uma relação desde que foi libertado, há sete anos.“Alguém decidiu que o melhor era dizer-lhe que eu era má pessoa, que não queria saber dele. Não culpo ninguém, mas foi uma má decisão. Mesmo um adolescente tem direito à verdade”, diz Curtis, depois de contar que o próprio filho, já pai, começou a fugir das suas responsabilidades. “Ele devia saber melhor, não é? Tendo o meu exemplo. E sabe, mas escolheu agir errado mesmo assim.”
Nos 21 anos de cárcere, os pais foram a única presença constante na sua vida. A mãe estava muito doente quando saiu da prisão e morreu três anos depois. “Eram a minha fundação no mundo real, emocionalmente, financeiramente, socialmente, eram só eles… Todos os meus amigos eram toxicodependentes e pequenos criminosos. É incrível, eu conhecia muita gente, nunca mais vi nenhuma das pessoas que conhecia em Oklahoma, nem uma.”
Os amigos desapareceram e não o apoiaram, embora alguns tenham ido falar com os pais, explicar-lhes que tinham medo de ser acusados de alguma coisa se o defendessem. “A polícia ameaçou-os”, explica Curtis. “Só uma pessoa é que testemunhou, Tracy, ela sabia onde é que eu estava e não teve medo de falar. Eu tinha conhecido a Pam através dela. Foi corajosa mas não valeu de nada.” Quando Curtis foi libertado, Tracy tentou contactá-lo e até enviou um recado através de um jornalista, mas Curtis não quis vê-la.
Tanto cansaço
O homem de 52 anos que agora conhecemos parece exausto. Está fisicamente cansado, chegou de Roma no domingo, passou três horas a responder a perguntas no chat de Facebook organizado pela Amnistia Internacional que o convidou a estar em Lisboa esta segunda-feira, 30 de Novembro, Dia Internacional Cidades Pela Vida – Cidades Contra a Pena de Morte.
A conversa com o PÚBLICO aconteceu segunda de manhã mas o cansaço de Curtis é maior do que o de uma noite mal dormida. É o cansaço de uma vida interrompida e impossível de recuperar. Há pausas enormes depois das perguntas e antes que a sua voz baixa comece a falar, sempre pausadamente. Às vezes os olhos encontram-se com o interlocutor, muitos períodos em que parecem perdidos no infinito. Há lágrimas e há dor, muita dor.
Pam foi violada, estrangulada e esfaqueada. Curtis foi condenado por um júri que acreditou no testemunho de uma analista forense, Joyce Gilchrist, que afirmou que os cabelos na cena do crime podiam ser seus e que o esperma recolhido na vítima correspondia ao seu tipo de sangue. Gilchrist tinha alterado as suas notas em 1985, para acrescentar a parte dos cabelos – algo que os advogados de Curtis só descobriram muito mais tarde.
Em 2000, a analista começou a ser investigada por falsos resultados noutros casos e acabou despedida por falsificar provas. As provas que examinou foram usadas em 3000 processos e conduziram a 23 sentenças de morte; onze destas pessoas foram executadas. O procurador que acusou Curtis em 1986 e 1989 também foi mais tarde acusado de “esconder provas essenciais”. Segundo o Registo Nacional de Exonerações, um projecto da Faculdade de Direito da Universidade do Michigan, Robert H. Macy enviou 73 pessoas para o corredor da morte em 21 anos, mais do que qualquer outro procurador nos Estados Unidos.
“No dia em que o juiz ordenou a minha libertação, os pais da Pam estavam lá, completamente sozinhos”, recorda Curtis. “Eles passaram anos a desejar a minha morte. Convenceram-nos da minha culpa e nesse mesmo dia disseram-lhes que eu era culpado.”
Em 2002, os advogados de Curtis conseguiram testar o esperma recolhido no corpo de Pam e os resultados mostraram que não podia ser seu. O Innocence Project, uma firma de advogados não lucrativa, envolveu-se no caso um ano depois e, em 2005, a defesa conseguiu um novo julgamento. Em 2007, testes de ADN mostrara que a pele encontrada debaixo das unhas da vítima pertencia a um homem que não era Curtis e que uma impressão digital ensanguentada encontrada no corpo também não era sua. A 11 de Maio desse ano, Curtis foi libertado.
Questionar factos
Hoje, a sua vida é militar contra a pena de morte. Trabalha com a comunidade de Sant’Egídio e com outras associações. “Numa audiência de dezenas de pessoas nos EUA eu sei que pelo menos duas serão algum dia chamadas a participar num júri e depois de me ouvirem talvez questionem os factos, talvez percebam que nem sempre o que a polícia diz é verdade.”
Curtis passou 21 anos preso, 19 no corredor da morte. Quando saiu da prisão foi diagnosticado com stress pós-traumático. “Quando falo em conferências pagas há sempre alguém que está atento ao que eu estou a dizer. Porque posso estar a contar como era a vida na cela, a dizer como era duro e, de repente, surge uma memória e eu perco-me e começo a divagar… É preciso alguém que diga, ‘estávamos a falar disto, era aqui que íamos”, conta.
Actualmente, Curtis não faz qualquer terapia, fez durante seis meses, duas vezes por semana. “É muito triste. O terapeuta preocupava-se muito comigo, descobri que tinha abdicado de receber para me ver. Na última vez que fui a casa dele estava lá a filha e dois outros terapeutas que ele consultava, que sabiam mais do que ele sobre estas situações, estavam em conferência telefónica. O que ele tinha para me dizer era que não havia maneira de eu melhorar, que o que tenho só ia piorar. Eles decidiram que era melhor dizerem-me, para eu estruturar a minha vida com essa consciência”, conta. E depois de uma pausa: “Infelizmente, tinham razão”.
“Orgulhoso” do trabalho que faz e das pessoas com quem trabalha, conta que antes da última viagem para Roma se esqueceu das datas, do que ia fazer e perdeu o avião. “Alguém ligou ao meu pai e ele veio ter comigo e perguntou-me se eu tinha feito as malas e se estava pronto para partir, e eu perguntei ‘para onde?’. E ele, ‘oh merda, ele esqueceu-se completamente.’”
Todos mortos
Curtis não se considera livre. Por uma vez, diz “quando fui libertado”, mas logo corrige para “quando saí da prisão”. Tinha 44 anos quando isso aconteceu, quase metade passados numa cela. Foi numa prisão de alta segurança que cresceu. E fez isso a ver morrer amigos. “É a coisa mais cruel que nos fazem, põe-nos numa situação em que podemos fazer amigos, gostar de pessoas que vão morrer. Era mais do que eu podia aguentar e isso acabou por me quebrar.”
Foi por isso que, a certa altura, deixou de querer conhecer pessoas. “Passado uns anos decidi que não ia aproximar-me de ninguém. Quanto mais alguém tentava ser simpático para mim mais bruto eu era, os novos pensavam que eu era um sacana”, diz. “Todas as pessoas que eu conheci e de quem gostei na minha vida adulta estão mortas.”
Isto é quase verdade. No início da conversa, enquanto fumava um cigarro de enrolar à janela, Curtis contou que talvez vá viver para Roma ou Paris. “Estou farto dos EUA. Nunca gostei. Tenho alguma família lá e alguns amigos”, afirmou. Curtis fez amigos nos últimos anos e são todos activistas.
Na sua nova vida, é incapaz de perder tempo a falar sobre nada, aquilo que fazemos com os amigos ou colegas de trabalho. Conta um episódio em que um homem se estava a queixar da mulher e ele desatou a enumerar desgraças pelo mundo, do sofrimento no Sudão aos refugiados do Ruanda que conheceu. “Sei que não é algo que possa fazer na maioria dos grupos, em ocasiões sociais”, diz. É incapaz de conversa fiada? “Sou, não aguento fazer conversa. É insuportável.”
Aquilo que Curtis faz hoje é “doloroso e compensador” ao mesmo tempo. “É irónico que a única coisa que me faz continuar inflija tanta dor.” Conta a sua história, dia após dia, em universidades, igrejas, “locais onde há alguma formalidade e as pessoas não dizem aquilo que diriam na rua” e acabam por ficar mais disponíveis para ouvir e serem influenciados por aquilo que ouvem.
“Sou capaz de estar a falar sobre a minha experiência de uma forma mais ou menos descontraída com alguém, não é assim tão mau”, diz. “Mas se me põem um microfone na mão, diante de um grupo, com alguma formalidade envolvida, fico em pânico, defensivo, fico doido.”
Commodore 64
Curtis sabe que “as pessoas precisam de histórias pessoais para mudarem de opinião, está estudado, as pessoas ficam disponíveis para pensar diferente quando as fazem rir ou chorar, eu sou pago para fazer as pessoas chorar”. Isso é duro e deixa-o exausto. Mas também o faz sentir bem. “Aquilo que eu faço é quantificável, no fim de cada conversa vemos quantas pessoas vão buscar as cartas para enviarem aos seus representantes no Congresso ou as que assinam as petições. E eu sei ver numa sala, percebo pelos rostos de quem está a ouvir e antecipo que dali a um bocado aquela pessoa vai dizer qualquer coisa como ‘eu pensava isto, mas…’”.
Antes de ser preso, Curtis tinha encontrado um caminho. “Foi o início do digital. O [computador] Commodore 64 tinha acabado de sair. No ano anterior tinha comprado efeitos digitais para o pedal da minha guitarra e estava a começar a ficar muito interessado, fascinado até, pela tecnologia digital”, recorda. Grandes empresas como a IBM, a Xerox e outras precisavam de técnicos, pessoas que compreendessem os novos equipamentos com tecnologia digital e abriram novas escolas profissionais. Ele conseguiu entrar numa delas, obteve um empréstimo e estava ainda a estudar Matemática.
“Foi a primeira vez na minha vida de jovem adulto que tive razões para me orgulhar de mim e do que eu estava a fazer. Estava a construir um caminho na minha vida, a iniciar algo que era entusiasmante e promissor. E não estava só a frequentar a escola, estava a sair-me bem. Mas não estava escrito.” Certo é que há algo que o fascina nos dias de hoje e que nos ajuda a imaginar o jovem Curtis à volta da sua guitarra ou de um computado novo. Dois fotógrafos aparecem durante a conversa e ele não resiste a meter conversa. Pergunta sobre as lentes, conta que partiu o seu tripé, que “até há dois dias não tinha flash nem zoom”, e é a olhar para as máquinas que os seus olhos mais brilham.
Curtis passou 19 anos à espera de ser executado. A condenação foi anulada e foi libertado, o que não significa que ficou livre. A impossibilidade de fazer conversa é um dos pesos que carrega.
Curtis fala das cartas quando está a tentar explicar que não se lembra assim tão bem dos muitos anos que passou preso, 21, por um crime que não cometeu e dos três julgamentos, em 1986, 1989 e 1995, em que foi condenado à morte pelo assassínio de Pamela Willis, de 18 anos. “Sei que devia ter memórias mais vívidas, mas não tenho. Não sei como é que suportei esses julgamentos. Só sei que me levantava todos os dias da cama.”
Curtis nasceu pobre, na cidade norte-americana de Oklahoma, no estado norte-americano com o mesmo nome, e tomou más decisões. Aos 15 anos já tinha problemas com drogas e desistira da escola. Conheceu Pam, filha de um polícia que levava uma vida parecida. Pam foi morta em 1982 e Curtis, então com 19 anos, foi uma das muitas pessoas que os investigadores ouviram.
Quatro anos mais tarde foi acusado e condenado. Já tinha um filho com seis anos que vivia com a mãe e com quem nunca conseguiu construir uma relação desde que foi libertado, há sete anos.“Alguém decidiu que o melhor era dizer-lhe que eu era má pessoa, que não queria saber dele. Não culpo ninguém, mas foi uma má decisão. Mesmo um adolescente tem direito à verdade”, diz Curtis, depois de contar que o próprio filho, já pai, começou a fugir das suas responsabilidades. “Ele devia saber melhor, não é? Tendo o meu exemplo. E sabe, mas escolheu agir errado mesmo assim.”
Nos 21 anos de cárcere, os pais foram a única presença constante na sua vida. A mãe estava muito doente quando saiu da prisão e morreu três anos depois. “Eram a minha fundação no mundo real, emocionalmente, financeiramente, socialmente, eram só eles… Todos os meus amigos eram toxicodependentes e pequenos criminosos. É incrível, eu conhecia muita gente, nunca mais vi nenhuma das pessoas que conhecia em Oklahoma, nem uma.”
Os amigos desapareceram e não o apoiaram, embora alguns tenham ido falar com os pais, explicar-lhes que tinham medo de ser acusados de alguma coisa se o defendessem. “A polícia ameaçou-os”, explica Curtis. “Só uma pessoa é que testemunhou, Tracy, ela sabia onde é que eu estava e não teve medo de falar. Eu tinha conhecido a Pam através dela. Foi corajosa mas não valeu de nada.” Quando Curtis foi libertado, Tracy tentou contactá-lo e até enviou um recado através de um jornalista, mas Curtis não quis vê-la.
Tanto cansaço
O homem de 52 anos que agora conhecemos parece exausto. Está fisicamente cansado, chegou de Roma no domingo, passou três horas a responder a perguntas no chat de Facebook organizado pela Amnistia Internacional que o convidou a estar em Lisboa esta segunda-feira, 30 de Novembro, Dia Internacional Cidades Pela Vida – Cidades Contra a Pena de Morte.
A conversa com o PÚBLICO aconteceu segunda de manhã mas o cansaço de Curtis é maior do que o de uma noite mal dormida. É o cansaço de uma vida interrompida e impossível de recuperar. Há pausas enormes depois das perguntas e antes que a sua voz baixa comece a falar, sempre pausadamente. Às vezes os olhos encontram-se com o interlocutor, muitos períodos em que parecem perdidos no infinito. Há lágrimas e há dor, muita dor.
Pam foi violada, estrangulada e esfaqueada. Curtis foi condenado por um júri que acreditou no testemunho de uma analista forense, Joyce Gilchrist, que afirmou que os cabelos na cena do crime podiam ser seus e que o esperma recolhido na vítima correspondia ao seu tipo de sangue. Gilchrist tinha alterado as suas notas em 1985, para acrescentar a parte dos cabelos – algo que os advogados de Curtis só descobriram muito mais tarde.
Em 2000, a analista começou a ser investigada por falsos resultados noutros casos e acabou despedida por falsificar provas. As provas que examinou foram usadas em 3000 processos e conduziram a 23 sentenças de morte; onze destas pessoas foram executadas. O procurador que acusou Curtis em 1986 e 1989 também foi mais tarde acusado de “esconder provas essenciais”. Segundo o Registo Nacional de Exonerações, um projecto da Faculdade de Direito da Universidade do Michigan, Robert H. Macy enviou 73 pessoas para o corredor da morte em 21 anos, mais do que qualquer outro procurador nos Estados Unidos.
“No dia em que o juiz ordenou a minha libertação, os pais da Pam estavam lá, completamente sozinhos”, recorda Curtis. “Eles passaram anos a desejar a minha morte. Convenceram-nos da minha culpa e nesse mesmo dia disseram-lhes que eu era culpado.”
Em 2002, os advogados de Curtis conseguiram testar o esperma recolhido no corpo de Pam e os resultados mostraram que não podia ser seu. O Innocence Project, uma firma de advogados não lucrativa, envolveu-se no caso um ano depois e, em 2005, a defesa conseguiu um novo julgamento. Em 2007, testes de ADN mostrara que a pele encontrada debaixo das unhas da vítima pertencia a um homem que não era Curtis e que uma impressão digital ensanguentada encontrada no corpo também não era sua. A 11 de Maio desse ano, Curtis foi libertado.
Questionar factos
Hoje, a sua vida é militar contra a pena de morte. Trabalha com a comunidade de Sant’Egídio e com outras associações. “Numa audiência de dezenas de pessoas nos EUA eu sei que pelo menos duas serão algum dia chamadas a participar num júri e depois de me ouvirem talvez questionem os factos, talvez percebam que nem sempre o que a polícia diz é verdade.”
Curtis passou 21 anos preso, 19 no corredor da morte. Quando saiu da prisão foi diagnosticado com stress pós-traumático. “Quando falo em conferências pagas há sempre alguém que está atento ao que eu estou a dizer. Porque posso estar a contar como era a vida na cela, a dizer como era duro e, de repente, surge uma memória e eu perco-me e começo a divagar… É preciso alguém que diga, ‘estávamos a falar disto, era aqui que íamos”, conta.
Actualmente, Curtis não faz qualquer terapia, fez durante seis meses, duas vezes por semana. “É muito triste. O terapeuta preocupava-se muito comigo, descobri que tinha abdicado de receber para me ver. Na última vez que fui a casa dele estava lá a filha e dois outros terapeutas que ele consultava, que sabiam mais do que ele sobre estas situações, estavam em conferência telefónica. O que ele tinha para me dizer era que não havia maneira de eu melhorar, que o que tenho só ia piorar. Eles decidiram que era melhor dizerem-me, para eu estruturar a minha vida com essa consciência”, conta. E depois de uma pausa: “Infelizmente, tinham razão”.
“Orgulhoso” do trabalho que faz e das pessoas com quem trabalha, conta que antes da última viagem para Roma se esqueceu das datas, do que ia fazer e perdeu o avião. “Alguém ligou ao meu pai e ele veio ter comigo e perguntou-me se eu tinha feito as malas e se estava pronto para partir, e eu perguntei ‘para onde?’. E ele, ‘oh merda, ele esqueceu-se completamente.’”
Todos mortos
Curtis não se considera livre. Por uma vez, diz “quando fui libertado”, mas logo corrige para “quando saí da prisão”. Tinha 44 anos quando isso aconteceu, quase metade passados numa cela. Foi numa prisão de alta segurança que cresceu. E fez isso a ver morrer amigos. “É a coisa mais cruel que nos fazem, põe-nos numa situação em que podemos fazer amigos, gostar de pessoas que vão morrer. Era mais do que eu podia aguentar e isso acabou por me quebrar.”
Foi por isso que, a certa altura, deixou de querer conhecer pessoas. “Passado uns anos decidi que não ia aproximar-me de ninguém. Quanto mais alguém tentava ser simpático para mim mais bruto eu era, os novos pensavam que eu era um sacana”, diz. “Todas as pessoas que eu conheci e de quem gostei na minha vida adulta estão mortas.”
Isto é quase verdade. No início da conversa, enquanto fumava um cigarro de enrolar à janela, Curtis contou que talvez vá viver para Roma ou Paris. “Estou farto dos EUA. Nunca gostei. Tenho alguma família lá e alguns amigos”, afirmou. Curtis fez amigos nos últimos anos e são todos activistas.
Na sua nova vida, é incapaz de perder tempo a falar sobre nada, aquilo que fazemos com os amigos ou colegas de trabalho. Conta um episódio em que um homem se estava a queixar da mulher e ele desatou a enumerar desgraças pelo mundo, do sofrimento no Sudão aos refugiados do Ruanda que conheceu. “Sei que não é algo que possa fazer na maioria dos grupos, em ocasiões sociais”, diz. É incapaz de conversa fiada? “Sou, não aguento fazer conversa. É insuportável.”
Aquilo que Curtis faz hoje é “doloroso e compensador” ao mesmo tempo. “É irónico que a única coisa que me faz continuar inflija tanta dor.” Conta a sua história, dia após dia, em universidades, igrejas, “locais onde há alguma formalidade e as pessoas não dizem aquilo que diriam na rua” e acabam por ficar mais disponíveis para ouvir e serem influenciados por aquilo que ouvem.
“Sou capaz de estar a falar sobre a minha experiência de uma forma mais ou menos descontraída com alguém, não é assim tão mau”, diz. “Mas se me põem um microfone na mão, diante de um grupo, com alguma formalidade envolvida, fico em pânico, defensivo, fico doido.”
Commodore 64
Curtis sabe que “as pessoas precisam de histórias pessoais para mudarem de opinião, está estudado, as pessoas ficam disponíveis para pensar diferente quando as fazem rir ou chorar, eu sou pago para fazer as pessoas chorar”. Isso é duro e deixa-o exausto. Mas também o faz sentir bem. “Aquilo que eu faço é quantificável, no fim de cada conversa vemos quantas pessoas vão buscar as cartas para enviarem aos seus representantes no Congresso ou as que assinam as petições. E eu sei ver numa sala, percebo pelos rostos de quem está a ouvir e antecipo que dali a um bocado aquela pessoa vai dizer qualquer coisa como ‘eu pensava isto, mas…’”.
Antes de ser preso, Curtis tinha encontrado um caminho. “Foi o início do digital. O [computador] Commodore 64 tinha acabado de sair. No ano anterior tinha comprado efeitos digitais para o pedal da minha guitarra e estava a começar a ficar muito interessado, fascinado até, pela tecnologia digital”, recorda. Grandes empresas como a IBM, a Xerox e outras precisavam de técnicos, pessoas que compreendessem os novos equipamentos com tecnologia digital e abriram novas escolas profissionais. Ele conseguiu entrar numa delas, obteve um empréstimo e estava ainda a estudar Matemática.
“Foi a primeira vez na minha vida de jovem adulto que tive razões para me orgulhar de mim e do que eu estava a fazer. Estava a construir um caminho na minha vida, a iniciar algo que era entusiasmante e promissor. E não estava só a frequentar a escola, estava a sair-me bem. Mas não estava escrito.” Certo é que há algo que o fascina nos dias de hoje e que nos ajuda a imaginar o jovem Curtis à volta da sua guitarra ou de um computado novo. Dois fotógrafos aparecem durante a conversa e ele não resiste a meter conversa. Pergunta sobre as lentes, conta que partiu o seu tripé, que “até há dois dias não tinha flash nem zoom”, e é a olhar para as máquinas que os seus olhos mais brilham.
segunda-feira, 30 de novembro de 2015
O túmulo de Nefertiti pode estar mais perto do que nunca
Sarcófago de Tutankhamon
INÊS NADAIS 28/11/2015
As análises conduzidas no túmulo de Tutankhamon sugerem que é “90% certa” a existência de uma câmara funerária oculta, reforçando a tese de que aí poderá estar enterrada uma das mais famosas rainhas do Antigo Egipto.
As autoridades egípcias estão “desesperadas por boas notícias” e este sábado puderam finalmente dá-las: os resultados preliminares das análises conduzidas por uma equipa internacional liderada pelo egiptólogo Nicholas Reeves apontam fortemente para a existência de uma segunda câmara funerária até aqui oculta por trás da parede Norte no túmulo de Tutankhamon. “Tínhamos dito que havia 60% de hipóteses de haver alguma coisa atrás destas paredes. Mas agora, após uma primeira leitura das imagens obtidas por radar, podemos afirmar que essa probabilidade é afinal de 90%”, afirmou este sábado, no Vale dos Reis, o ministro das Antiguidades Egípcias Mahmoud al-Damaty.
Tratando-se ou não do sarcófago de Nefertiti, como Reeves ardentemente defende, as autoridades egípcias acreditam que o que quer que ali venha a ser encontrado, selado atrás de uma parede há vários milhares de anos, pode constituir “o achado do século XXI” – na era moderna, apenas o túmulo de Tutankhamon foi descoberto intacto, com todo o seu infindável tesouro de mais de cinco mil peças que demorou quase uma década a catalogar.
Embora considerada fantasiosa por alguns egiptólogos, a tese de que após a sua morte precoce, com apenas 19 anos, Tutankhamon terá sido enterrado no mausoléu pré-existente da primeira mulher do seu pai, o faraó Akhenaton, parece cada vez menos incrível. Há muito que os especialistas tentam perceber porque é que o túmulo de Tutankhamon é mais pequeno do que o dos outros faraós enterrados no Vale dos Reis – a necrópole da antiga cidade de Tebas, actual Luxor – e porque é que exibe a orientação típica dos túmulos das rainhas egípcias do seu tempo, com o eixo central inclinado para a direita.
A eventual descoberta do túmulo de Nefertiti numa segunda câmara funerária até aqui desconhecida confirmaria a suspeita de que o mausoléu original da rainha terá sido reconvertido, dez anos após a sua morte, para acolher os restos mortais de Tutankhamon, o que explicaria também as orelhas furadas e os traços femininos da sua célebre máscara funerária – um dos mais extraordinários tesouros do Antigo Egipto, actualmente exposto no Museu do Cairo. “A minha hipótese é de que nos encontramos perante um túmulo dentro de outro túmulo. Tutankhamon terá sido enterrado na parte exterior de uma sepultura que já existia e que terá sido adaptada para o efeito”, explicou Nicholas Reeves ao El Mundo no Verão passado.
“Implicações extraordinárias”
Até que os resultados finais das análises feitas nos últimos dois dias sejam divulgados, não é de excluir que se esteja perante o início de uma campanha arqueológica tão apaixonante como aquela que o egiptólogo britânico Howard Carter concluiu, depois de muitas peripécias, a 16 de Fevereiro de 1922, dia em que finalmente pôde revelar ao mundo o túmulo até então selado de Tutankhamon. Nos últimos dias, a equipa internacional liderada por Nicholas Reeves aguardou pela saída dos últimos turistas para se fechar no mausoléu e auscultar os segredos que aquelas paredes ainda possam ter a contar. “O túmulo parece relutante em confiar-nos os seus segredos. Mas está a revelá-los pouco a pouco. E até agora nenhum dos resultados contradiz as bases da minha teoria”, disse o egiptólogo à National Geographic, que co-financia o projecto e em 2016 vai estrear um documentário exclusivo sobre a investigação em curso.
Especialista na 18.ª Dinastia, uma das mais misteriosas e fascinantes de toda a história do Antigo Egipto, Reeves começou a suspeitar de que poderemos estar mais perto do que nunca do túmulo de Nefertiti quando viu as imagens de altíssima resolução, obtidas com recurso a scanners 3D, que a empresa madrilena Factum Arte começou a recolher em 2009 no túmulo de Tutankhamon: “Se aquilo que as imagens sugerem vier a confirmar-se, as implicações são extraordinárias. Nestas profundezas inexploradas pode estar um enterramento anterior, o da própria Nefertiti, consorte celebrada, co-regente e eventual sucessora do faraó Akhenaton”, sugeria em Julho.
INÊS NADAIS 28/11/2015
As análises conduzidas no túmulo de Tutankhamon sugerem que é “90% certa” a existência de uma câmara funerária oculta, reforçando a tese de que aí poderá estar enterrada uma das mais famosas rainhas do Antigo Egipto.
Tratando-se ou não do sarcófago de Nefertiti, como Reeves ardentemente defende, as autoridades egípcias acreditam que o que quer que ali venha a ser encontrado, selado atrás de uma parede há vários milhares de anos, pode constituir “o achado do século XXI” – na era moderna, apenas o túmulo de Tutankhamon foi descoberto intacto, com todo o seu infindável tesouro de mais de cinco mil peças que demorou quase uma década a catalogar.
Ao longo do próximo mês, as imagens obtidas pelo especialista Hirokatsu Watanabe com um radar especialmente adaptado às difíceis condições geotérmicas e à relativa exiguidade do túmulo de Tutankhamon serão sujeitas a uma minuciosa análise no Japão. Se tudo correr como espera o egiptólogo britânico que convenceu as autoridades egípcias a reavaliar aquele que é o grande ex-libris do Vale dos Reis, as conclusões finais desta investigação confirmarão a sua tese de que o mausoléu ainda não foi integralmente escavado.
“Parece claro que, como predisse, o túmulo continua. O radar sugere que a câmara funerária [de Tutankhamon] se prolonga ao longo de um corredor que desemboca noutra câmara funerária”, sublinhou Reeves, secundado pelo perito japonês: “Existe de facto um espaço vazio atrás da parede, não há qualquer dúvida. Neste momento, porém, ainda não podemos fazer cálculos”, disse Watanabe, citado pela Reuters.
“Parece claro que, como predisse, o túmulo continua. O radar sugere que a câmara funerária [de Tutankhamon] se prolonga ao longo de um corredor que desemboca noutra câmara funerária”, sublinhou Reeves, secundado pelo perito japonês: “Existe de facto um espaço vazio atrás da parede, não há qualquer dúvida. Neste momento, porém, ainda não podemos fazer cálculos”, disse Watanabe, citado pela Reuters.
Perito japonês Hirokatsu Watanabe
Embora considerada fantasiosa por alguns egiptólogos, a tese de que após a sua morte precoce, com apenas 19 anos, Tutankhamon terá sido enterrado no mausoléu pré-existente da primeira mulher do seu pai, o faraó Akhenaton, parece cada vez menos incrível. Há muito que os especialistas tentam perceber porque é que o túmulo de Tutankhamon é mais pequeno do que o dos outros faraós enterrados no Vale dos Reis – a necrópole da antiga cidade de Tebas, actual Luxor – e porque é que exibe a orientação típica dos túmulos das rainhas egípcias do seu tempo, com o eixo central inclinado para a direita.
A eventual descoberta do túmulo de Nefertiti numa segunda câmara funerária até aqui desconhecida confirmaria a suspeita de que o mausoléu original da rainha terá sido reconvertido, dez anos após a sua morte, para acolher os restos mortais de Tutankhamon, o que explicaria também as orelhas furadas e os traços femininos da sua célebre máscara funerária – um dos mais extraordinários tesouros do Antigo Egipto, actualmente exposto no Museu do Cairo. “A minha hipótese é de que nos encontramos perante um túmulo dentro de outro túmulo. Tutankhamon terá sido enterrado na parte exterior de uma sepultura que já existia e que terá sido adaptada para o efeito”, explicou Nicholas Reeves ao El Mundo no Verão passado.
Mas desde que em Julho o arqueólogo da Universidade do Arizona publicou o artigo em que defende esta tese, The Burial of Nefertiti?, vários egiptólogos têm vindo lembrar que não há sequer consenso acerca do local onde Nefertiti morreu no século XIV a.C., e que o mais provável é ter sido enterrada em Amarna – foi de resto na capital que Akhenaton fundou e que dedicou ao seu único deus, Aton, que o magnífico busto da rainha esculpido há cerca de 3.300 anos foi encontrado em 1912.
Já depois da conferência de imprensa deste sábado, um dos mais destacados especialistas do Antigo Egipto, o ex-ministro das Antiguidades Zahi Hawass, frisou à AFP que a sugestão de que Nefertiti pode ter sido enterrada no mausoléu de Tutankhamon é totalmente inverosímil, dada a sua participação activa na aventura monoteísta de Akhenaton: “Nefertiti prestou culto a Aton durante anos. Os sacerdotes nunca autorizariam que fosse sepultada no Vale dos Reis.” E o próprio Mahmoud al-Damaty, o ministro das Antiguidades Egípcias que este sábado anunciou “o achado do século XXI”, acredita ser mais lógico estar-se perto do mausoléu de Kia, a segunda mulher de Akhenaton e provável mãe de Tutankhamon, do que do da mítica Nefertiti.
Já depois da conferência de imprensa deste sábado, um dos mais destacados especialistas do Antigo Egipto, o ex-ministro das Antiguidades Zahi Hawass, frisou à AFP que a sugestão de que Nefertiti pode ter sido enterrada no mausoléu de Tutankhamon é totalmente inverosímil, dada a sua participação activa na aventura monoteísta de Akhenaton: “Nefertiti prestou culto a Aton durante anos. Os sacerdotes nunca autorizariam que fosse sepultada no Vale dos Reis.” E o próprio Mahmoud al-Damaty, o ministro das Antiguidades Egípcias que este sábado anunciou “o achado do século XXI”, acredita ser mais lógico estar-se perto do mausoléu de Kia, a segunda mulher de Akhenaton e provável mãe de Tutankhamon, do que do da mítica Nefertiti.
“Implicações extraordinárias”
Até que os resultados finais das análises feitas nos últimos dois dias sejam divulgados, não é de excluir que se esteja perante o início de uma campanha arqueológica tão apaixonante como aquela que o egiptólogo britânico Howard Carter concluiu, depois de muitas peripécias, a 16 de Fevereiro de 1922, dia em que finalmente pôde revelar ao mundo o túmulo até então selado de Tutankhamon. Nos últimos dias, a equipa internacional liderada por Nicholas Reeves aguardou pela saída dos últimos turistas para se fechar no mausoléu e auscultar os segredos que aquelas paredes ainda possam ter a contar. “O túmulo parece relutante em confiar-nos os seus segredos. Mas está a revelá-los pouco a pouco. E até agora nenhum dos resultados contradiz as bases da minha teoria”, disse o egiptólogo à National Geographic, que co-financia o projecto e em 2016 vai estrear um documentário exclusivo sobre a investigação em curso.
Especialista na 18.ª Dinastia, uma das mais misteriosas e fascinantes de toda a história do Antigo Egipto, Reeves começou a suspeitar de que poderemos estar mais perto do que nunca do túmulo de Nefertiti quando viu as imagens de altíssima resolução, obtidas com recurso a scanners 3D, que a empresa madrilena Factum Arte começou a recolher em 2009 no túmulo de Tutankhamon: “Se aquilo que as imagens sugerem vier a confirmar-se, as implicações são extraordinárias. Nestas profundezas inexploradas pode estar um enterramento anterior, o da própria Nefertiti, consorte celebrada, co-regente e eventual sucessora do faraó Akhenaton”, sugeria em Julho.
É uma hipótese que de facto o radar de Hirokatsu Watanabe não descartou, tal como as sofisticadas imagens feitas no início deste mês com câmaras termográficas não tinham descartado. Além da câmara funerária selada atrás da parede Norte, sugerida pelas “destacadas irregularidades térmicas” que as imagens evidenciam, parece haver também indícios de que a parede ocidental adjacente esconde um outro compartimento, possivelmente um espaço de armazenamento onde Reeves ambiciona encontrar um tesouro à escala daquele com que Carter se deparou há quase um século. Se ambos os indícios confirmarem, será necessário encontrar uma maneira de passar para o lado de lá dessas paredes sem danificar as valiosas pinturas murais que constituem a exuberante decoração interna do túmulo de Tutankhamon: “Uma ideia é cortar os frescos e exibi-los num museu, talvez em colaboração com os especialistas italianos que usaram esta técnica em Pompeia. Não é fácil, mas pode fazer-se”, garante Reeves.
Para um país que, como lembra a National Geographic, atravessa um período de extrema turbulência económica e política e que viu uma das suas principais fontes de receitas, o turismo, recuar para níveis mínimos, “o potencial de uma descoberta arqueológica avassaladora” é incalculável. “A possibilidade de estarmos perante a existência de outra câmara funerária no túmulo de Tutankhamon é realmente intrigante e excitante, mas quem poderá lá estar? Falta-nos toda a família real, excepto Tutankhamon. Pode ser qualquer pessoa”, notou à revista norte-americana Ray Johnson, director da Chicago House, um núcleo de investigação da Universidade de Chicago que está sediado em Luxor.
Para um país que, como lembra a National Geographic, atravessa um período de extrema turbulência económica e política e que viu uma das suas principais fontes de receitas, o turismo, recuar para níveis mínimos, “o potencial de uma descoberta arqueológica avassaladora” é incalculável. “A possibilidade de estarmos perante a existência de outra câmara funerária no túmulo de Tutankhamon é realmente intrigante e excitante, mas quem poderá lá estar? Falta-nos toda a família real, excepto Tutankhamon. Pode ser qualquer pessoa”, notou à revista norte-americana Ray Johnson, director da Chicago House, um núcleo de investigação da Universidade de Chicago que está sediado em Luxor.
A máquina de fazer dinheiro do Estado Islâmico
Raqqa, na Síria, foi escolhida para ser a capital do "calfado"
CLARA BARATA 29/11/2015
Ter um território sob seu domínio é fundamental para a organização terrorista financiar uma guerra. Mercado negro, fronteiras porosas, acesso a recursos naturais e várias formas de roubo são as suas estratégias.
O Estado Islâmico (EI) é talvez a organização terrorista mais bem financiada de sempre, nas palavras do actual vice-director da CIA, David Cohen. Ao contrário da Al-Qaeda e outros grupos terroristas, que dependem fortemente de dadores simpatizantes das suas causas, o EI controla um território na Síria e no Iraque onde vivem pelo menos oito milhões de pessoas e que governa como se fosse um Estado. Impõe a quem lá vive os mais variados impostos, com inspiração no Corão, e explora recursos naturais, como o petróleo.
Uma ressalva: não há muitos dados concretos, nem uma pista electrónica das contas e transacções do EI que permita conhecer com pormenor as finanças do califado autodeclarado pelo líder Abu Bakr al Baghdadi em Junho de 2014, depois de o grupo ter conquistado Mossul, a segunda maior cidade iraquiana. Mas estimativas apresentadas ao Congresso dos Estados Unidos no final desse ano pela Rand Corporation, apontam para que o Estado Islâmico ganhe entre 1 e 3 milhões de dólares por dia provenientes de várias fontes. Fez um longo caminho desde 2008, quando apenas conseguia ganhar um milhão de dólares num mês.
Os rendimentos anuais do EI, neste momento, rondam os 2700 milhões de euros, diz o Le Monde, que faz algumas comparações que ilustram bem as capacidades financeiras desta organização: estima-se que o orçamento dos talibans, no Afeganistão, oscile entre 49,7 milhões e 300 milhões de euros, e o que Hezbollah libanês entre 150 e 341 milhões de euros.
Quem são os jovens radicalizados? Conheça os "neo-jihadistas"
O acesso aos poços de petróleo da Síria e do Iraque é, certamente, uma das principais fontes de rendimento do EI. Mas não é a única e, neste momento, nem sequer será a principal. A diversificação é uma das chaves do seu sucesso.
Petróleo
A dúvida é: até que ponto os bombardeamentos da coligação internacional estão a impedir a exploração petrolífera pelo Estado Islâmico na Síria e no Iraque? Em Outubro, uma investigação do Financial Times concluía que os jihadistas estavam a ganhar cerca de 1,5 milhões de dólares diários com o petróleo, mas estes números foram contestados.
No entanto, o EI terá a capacidade de produzir 44 mil barris de crude por dia na Síria e 4000 no Iraque, que depois é vendido na Turquia, a intermediários, a preços muito reduzidos – por vezes a 20 dólares. É apenas uma fracção da capacidade de produção total do Iraque (três milhões de baris por dia), mas quase 10% da da Síria, que antes da guerra civil começar a todo fôlego, diz aNewsweek, rondava 385 mil barris diários.
Em alguns casos, o petróleo é refinado ainda na Siría, com sistemas transportáveis, baratos e simples de operar. Este combustível é usado localmente e é ainda mais fácil canalizá-lo para o mercado negro na Turquia, misturando-o com outro combustível.
Em teoria, quando abastece o seu carro, parte do gasóleo ou gasolina pode ter vindo daquela que o EI extrai na Síria ou no Iraque. Na verdade, as próprias tropas do Presidente Bashar al-Assa, com quem combate o EI, devem usá-lo, tal como os curdos, que lhes têm sido os mais eficazes a dar-lhes luta.
Reportagem: O que é o Estado Islâmico?
O tráfico é feito através de camiões cisterna para a Turquia – muito provavelmente conduzidos por civis, que não são propriamente cúmplices dos jihadistas, apenas usam rotas que têm décadas, utilizadas durante os anos das sanções impostas ao regime de Saddam Hussein, no Iraque. Os guardas de fronteira recebiam baksheesh (pagamento às escondidas, suborno) para deixar passar os camiões com contrabandos variados, entre os quais petróleo, que era vendido a intermediários na Turquia, que se encarregavam de o colocar no mercado normal.
O Estado Islâmico aproveita-se dessas mesmas redes e fará pelo menos 500 milhões de dólares de lucro anuais – o petróleo representará cerca de um terço dos seus actuais rendimentos anuais.
Outros importantes recursos naturais que estão no território do EI são as minas de fosfatos de Khnaifess, localizadas à beira da estrada entre Damasco e Palmira, a cidade património da Humanidade da qual os jihadistas se apropriaram. A Síria tem uma das maiores reservas de fosfatos do mundo – em tempos de paz, as minas rendiam cerca de 60 milhões de dólares anuais. Não é claro, no entanto, se o grupo terá capacidade para explorar as minas.
Sob seu controlo estão também cinco fábricas de cimento – que poderiam render 583 milhões de dólares anuais, diz a Reuters – e várias instalações de extracção de enxofre.
Um dia antes dos atentados de Paris, os EUA tinham anunciado uma intensificação dos ataques contra os locais de produção petrolífera nas mãos do EI, com o objectivo de os desactivar durante pelo menos seis meses – até agora, os bombardeamentos não tinham consequências de maior, dentro de uma semana, no máximo, voltavam a estar funcionais. Havia a preocupação de manter as estruturas operacionais para poderem ser aproveitadas pela Síria, num futuro em que houvesse paz.
Conheça um dos principais recrutadores do EI
Durante um ano, o EI lutou pelo controlo da refinaria de Baiji, a maior do Iraque, mas em Outubro foi obrigada a recuar.
“Os argumentos para não atacar a infra-estrutura petrolífera nas mãos do EI são bem conhecidos – os custos da reconstrução pós-conflito e a destruição dos meios de ganhar a vida daqueles que dependem desta indústria”, escreveu no New York Times Tom Keating, director do Centro de Estudos de Crime Financeiro e Estudos de Segurança no Royal United Services Institute (Reino Unido). “Mas o preço de atrasar os bombardeamentos vê-se em Beirute, no Egipto e Paris”, onde houve atentados do EI.
Quanto ao bombardeamento das longas filas de camiões cisternas que muitas vezes se vêm rumo à Turquia, os militares contorcem-se de dúvidas: podem ser apenas civis a conduzi-los, que tentam ganhar a vida num ambiente de guerra. “Os apelos para que se bombardeiem alvos petrolíferos exageram a dependência do Estado Islâmico dos rendimentos do petróleo”, afirma, no mesmo jornal, Hassan Hassan, analista da Chatham House e co-autor do livroISIS: por dentro do Estado do terror (Leya).
“Os bombardeamentos, em especial no Leste da Síria, estão a pôr em causa as formas de vida de muitas pessoas que dependiam do comércio, transporte e outras actividades relacionadas com o petróleo, antes do EI controlar as áreas em que vivem”, sublinha. O mercado negro foi a forma de continuarem a ter meios de sobrevivência, depois do colapso do Governo de Bashar al Assad. “Algumas famílias estão a enviar os seus filhos para as fileiras do EI, como a única forma de obter um rendimento mensal”, frisa.
Taxas e extorsão
Ter o controlo efectivo de um território é a originalidade do Estado Islâmico. É o seu ponto forte, pois pode impor as mais variadas taxas às pessoas que lá vivem, e apropriar-se dos recursos produzidos. A extorsão e a imposição de taxas com inspiração corânica podem render 600 milhões de dólares anuais (565 milhões de euros) ao EI e deve ser a sua principal fonte de rendimento, dizem vários analistas. Só na cidade iraquiana de Mossul, deverá obter oito milhões de dólares em impostos por mês, diz um relatório da Thomson Reuters.
No entanto, pode também ser o seu ponto fraco, pois tem de administrar o território, assegurar os serviços mínimos a quem lá vive. Isto ao mesmo tempo que mantêm uma guerra sangrenta contra Assad e seus aliados, contra outros grupos rebeldes e são bombardeados pela coligação internacional liderada pelos EUA e agora também pela Rússia.
Como é a vida no Estado Islâmico?
Os jihadistas “impõem um contrato social em que os muçulmanos consentem em pagar taxas e contribuições de caridade obrigatórias em troca de protecção e benefícios, enquanto súbditos do califado”, explica num artigo dothink tank Brookings Institution Mara Revkin, que está a fazer um doutoramento sobre os processos de governação de grupos rebeldes como o EI.
O sistema de taxas do EI baseia-se numa leitura selectiva de interpretações medievais do Corão, diz Mara Revkin, para impor três grandes tipos de taxas: o Zakat é a contribuição obrigatória de uma percentagem dos ganhos totais dos muçulmanos – tradicionalmente é de 2,5%, mas o EI aumentou-a para 5%. Para além dos salários, pode ser aplicada a produtos agrícolas, por exemplo – e o EI deitou mão a grande parte dos territórios agrícolas da Síria e do Iraque, onde é produzida grande parte do trigo e da cevada daqueles países. Mesmo vendendo estes cereais no mercado negro a 50% do preço normal, a Reuters estima que o EI obtenha cerca de 200 milhões de dólares anuais
Fay é o tributo pago em dinheiro ou terras pelos não-crentes – e há relatos de valores diferentes impostos a cristãos e outras minorias. A Ghanima refere-se aos bens móveis retirados pela força aos não muçulmanos numa campanha militar, como escravos e armas. Um quinto (khums) deve ser destinado para o erário público, e os restantes 80% podem ser distribuídos entre os combatentes, explica a investigadora.
Mas todas estas taxas podem multiplicar-se, tornando-se verdadeiras extorsões: é preciso pagar uma taxa para usar os serviços de telecomunicações, para tirar dinheiro do banco, para comprar seja o que for. Os camiões e outros veículos que passem pelas estradas do Norte do Iraque têm de pagar 800 dólares de portagem, diz ainda a Reuters.
Dentro dos esquemas de extorsão cabem ainda os raptos para obter resgates. Os EUA e o Reino Unido recusam-se a pagar por cidadãos seus que tenham sido raptados, mas outros países terão pago alguns milhões de dólares ou euros – em 2014, o EI poderá ter recebido cerca de 45 milhões de dólares, estima um relatório do Congresso norte-americano. E mesmo cidadãos locais serão raptados frequentemente – embora nestes casos os resgates pedidos sejam muito menores, com valores que podem rondar os 500 dólares.
Opinião: Guerra ao ISIS? Talvez começar pelo namoro com a Arábia Saudita
A insatisfação com o sistema de taxas e extorsão do EI estará a crescer, pelo que se conclui dos relatos que chegam ao Ocidente. Talvez pela falta de perspectivas para a população sob o seu jugo, ou por causa da evolução do sistema de controlo do território posto em prática pelos jihadistas, explicado por Mara Revkin.
Quando o EI se apropria de um novo território, as suas prioridades são restaurar os serviços básicos, como a água e a electricidade. Em alguns locais, pôs a funcionar as panificações, para fornecer pão grátis ou a preços subsidiados. Os produtos que entram no território são adquiridos pelo EI e depois vendidos à população – com taxas, que se foram agravando. Começam depois uma campanha de repressão do crime vulgar – ladrões, traficantes, violadores, assassinos comuns.
Só então é que o EI começa a regular a moral pública e as práticas religiosas. Primeiro, as pessoas começam por ser encorajas a deixar de beber e fumar de forma educada. Se não o fazem a bem, começam a ser sujeitas a violência, e são introduzidos castigos corporais para quem for apanhado a vender ou a consumir cigarros ou álcool. O medievalismo do EI e a sociedade em dois andares – guerrilheiros e o resto da população – afirma-se com o avançar do tempo.
Tráfico de antiguidades
Esta será a segunda maior fonte de rendimentos do Estado Islâmico. Vários museus ficaram sob o seu controlo, e vários locais arqueológicos também. Algumas relíquias são destruídas para efeitos de propaganda, como está a acontecer na cidade de Palmira. Mas as peças facilmente transportáveis são traficadas para o estrangeiro, sobretudo para a Europa, onde há compradores para peças que, a não ser ilegalmente, nunca seriam transaccionadas.
Quem quiser escavar – ou roubar o que encontrar – nos sítios arqueológicos sírios paga uma taxa: 20% sobre o valor do que encontrar em Alepo, depois de efectuada a transacção com receptadores autorizados pelo EI, 50% em Raqqa. Um relatório do Congresso dos EUA estima em 100 milhões por ano os rendimentos do EI com a venda ilícita de objectos arqueológicos.
A questão é descobrir o percurso que estas peças fazem, depois de saírem da Síria ou do Iraque, através da Turquia ou de Beirute, e de terem sido branqueadas com documentação falsa sobre a sua origem. Começam a surgir algumas denúncias de que estarão a ser vendidos em leilões na Europa, ou em lojas sem escrúpulos em relação a peças vindas de regiões de conflito. Por exemplo, o especialista em Médio Oriente também do University College de Londres Mark Altaweel encontrou numa loja da capital britânica objectos que “muito provavelmente vêm do Iraque e da Síria”, contou ao Guardian.
Um fragmento de vidro rudimentar, uma estatueta minúscula, um baixo-relevo em osso – peças com características tão distintivas que só podem ter vindo de uma zona específica, na área controlada agora pelo Estado Islâmico, afirmou. “O facto de estarem à venda tão abertamente em Londres diz-nos a escala deste tráfico – estamos a ver apenas a ponta final”, comentou Altaweel.
CLARA BARATA 29/11/2015
Ter um território sob seu domínio é fundamental para a organização terrorista financiar uma guerra. Mercado negro, fronteiras porosas, acesso a recursos naturais e várias formas de roubo são as suas estratégias.
Uma ressalva: não há muitos dados concretos, nem uma pista electrónica das contas e transacções do EI que permita conhecer com pormenor as finanças do califado autodeclarado pelo líder Abu Bakr al Baghdadi em Junho de 2014, depois de o grupo ter conquistado Mossul, a segunda maior cidade iraquiana. Mas estimativas apresentadas ao Congresso dos Estados Unidos no final desse ano pela Rand Corporation, apontam para que o Estado Islâmico ganhe entre 1 e 3 milhões de dólares por dia provenientes de várias fontes. Fez um longo caminho desde 2008, quando apenas conseguia ganhar um milhão de dólares num mês.
Os rendimentos anuais do EI, neste momento, rondam os 2700 milhões de euros, diz o Le Monde, que faz algumas comparações que ilustram bem as capacidades financeiras desta organização: estima-se que o orçamento dos talibans, no Afeganistão, oscile entre 49,7 milhões e 300 milhões de euros, e o que Hezbollah libanês entre 150 e 341 milhões de euros.
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O acesso aos poços de petróleo da Síria e do Iraque é, certamente, uma das principais fontes de rendimento do EI. Mas não é a única e, neste momento, nem sequer será a principal. A diversificação é uma das chaves do seu sucesso.
Petróleo
A dúvida é: até que ponto os bombardeamentos da coligação internacional estão a impedir a exploração petrolífera pelo Estado Islâmico na Síria e no Iraque? Em Outubro, uma investigação do Financial Times concluía que os jihadistas estavam a ganhar cerca de 1,5 milhões de dólares diários com o petróleo, mas estes números foram contestados.
No entanto, o EI terá a capacidade de produzir 44 mil barris de crude por dia na Síria e 4000 no Iraque, que depois é vendido na Turquia, a intermediários, a preços muito reduzidos – por vezes a 20 dólares. É apenas uma fracção da capacidade de produção total do Iraque (três milhões de baris por dia), mas quase 10% da da Síria, que antes da guerra civil começar a todo fôlego, diz aNewsweek, rondava 385 mil barris diários.
Em alguns casos, o petróleo é refinado ainda na Siría, com sistemas transportáveis, baratos e simples de operar. Este combustível é usado localmente e é ainda mais fácil canalizá-lo para o mercado negro na Turquia, misturando-o com outro combustível.
Em teoria, quando abastece o seu carro, parte do gasóleo ou gasolina pode ter vindo daquela que o EI extrai na Síria ou no Iraque. Na verdade, as próprias tropas do Presidente Bashar al-Assa, com quem combate o EI, devem usá-lo, tal como os curdos, que lhes têm sido os mais eficazes a dar-lhes luta.
Reportagem: O que é o Estado Islâmico?
O tráfico é feito através de camiões cisterna para a Turquia – muito provavelmente conduzidos por civis, que não são propriamente cúmplices dos jihadistas, apenas usam rotas que têm décadas, utilizadas durante os anos das sanções impostas ao regime de Saddam Hussein, no Iraque. Os guardas de fronteira recebiam baksheesh (pagamento às escondidas, suborno) para deixar passar os camiões com contrabandos variados, entre os quais petróleo, que era vendido a intermediários na Turquia, que se encarregavam de o colocar no mercado normal.
O Estado Islâmico aproveita-se dessas mesmas redes e fará pelo menos 500 milhões de dólares de lucro anuais – o petróleo representará cerca de um terço dos seus actuais rendimentos anuais.
Outros importantes recursos naturais que estão no território do EI são as minas de fosfatos de Khnaifess, localizadas à beira da estrada entre Damasco e Palmira, a cidade património da Humanidade da qual os jihadistas se apropriaram. A Síria tem uma das maiores reservas de fosfatos do mundo – em tempos de paz, as minas rendiam cerca de 60 milhões de dólares anuais. Não é claro, no entanto, se o grupo terá capacidade para explorar as minas.
Sob seu controlo estão também cinco fábricas de cimento – que poderiam render 583 milhões de dólares anuais, diz a Reuters – e várias instalações de extracção de enxofre.
Um dia antes dos atentados de Paris, os EUA tinham anunciado uma intensificação dos ataques contra os locais de produção petrolífera nas mãos do EI, com o objectivo de os desactivar durante pelo menos seis meses – até agora, os bombardeamentos não tinham consequências de maior, dentro de uma semana, no máximo, voltavam a estar funcionais. Havia a preocupação de manter as estruturas operacionais para poderem ser aproveitadas pela Síria, num futuro em que houvesse paz.
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Durante um ano, o EI lutou pelo controlo da refinaria de Baiji, a maior do Iraque, mas em Outubro foi obrigada a recuar.
“Os argumentos para não atacar a infra-estrutura petrolífera nas mãos do EI são bem conhecidos – os custos da reconstrução pós-conflito e a destruição dos meios de ganhar a vida daqueles que dependem desta indústria”, escreveu no New York Times Tom Keating, director do Centro de Estudos de Crime Financeiro e Estudos de Segurança no Royal United Services Institute (Reino Unido). “Mas o preço de atrasar os bombardeamentos vê-se em Beirute, no Egipto e Paris”, onde houve atentados do EI.
Quanto ao bombardeamento das longas filas de camiões cisternas que muitas vezes se vêm rumo à Turquia, os militares contorcem-se de dúvidas: podem ser apenas civis a conduzi-los, que tentam ganhar a vida num ambiente de guerra. “Os apelos para que se bombardeiem alvos petrolíferos exageram a dependência do Estado Islâmico dos rendimentos do petróleo”, afirma, no mesmo jornal, Hassan Hassan, analista da Chatham House e co-autor do livroISIS: por dentro do Estado do terror (Leya).
“Os bombardeamentos, em especial no Leste da Síria, estão a pôr em causa as formas de vida de muitas pessoas que dependiam do comércio, transporte e outras actividades relacionadas com o petróleo, antes do EI controlar as áreas em que vivem”, sublinha. O mercado negro foi a forma de continuarem a ter meios de sobrevivência, depois do colapso do Governo de Bashar al Assad. “Algumas famílias estão a enviar os seus filhos para as fileiras do EI, como a única forma de obter um rendimento mensal”, frisa.
Taxas e extorsão
Ter o controlo efectivo de um território é a originalidade do Estado Islâmico. É o seu ponto forte, pois pode impor as mais variadas taxas às pessoas que lá vivem, e apropriar-se dos recursos produzidos. A extorsão e a imposição de taxas com inspiração corânica podem render 600 milhões de dólares anuais (565 milhões de euros) ao EI e deve ser a sua principal fonte de rendimento, dizem vários analistas. Só na cidade iraquiana de Mossul, deverá obter oito milhões de dólares em impostos por mês, diz um relatório da Thomson Reuters.
No entanto, pode também ser o seu ponto fraco, pois tem de administrar o território, assegurar os serviços mínimos a quem lá vive. Isto ao mesmo tempo que mantêm uma guerra sangrenta contra Assad e seus aliados, contra outros grupos rebeldes e são bombardeados pela coligação internacional liderada pelos EUA e agora também pela Rússia.
Como é a vida no Estado Islâmico?
Os jihadistas “impõem um contrato social em que os muçulmanos consentem em pagar taxas e contribuições de caridade obrigatórias em troca de protecção e benefícios, enquanto súbditos do califado”, explica num artigo dothink tank Brookings Institution Mara Revkin, que está a fazer um doutoramento sobre os processos de governação de grupos rebeldes como o EI.
O sistema de taxas do EI baseia-se numa leitura selectiva de interpretações medievais do Corão, diz Mara Revkin, para impor três grandes tipos de taxas: o Zakat é a contribuição obrigatória de uma percentagem dos ganhos totais dos muçulmanos – tradicionalmente é de 2,5%, mas o EI aumentou-a para 5%. Para além dos salários, pode ser aplicada a produtos agrícolas, por exemplo – e o EI deitou mão a grande parte dos territórios agrícolas da Síria e do Iraque, onde é produzida grande parte do trigo e da cevada daqueles países. Mesmo vendendo estes cereais no mercado negro a 50% do preço normal, a Reuters estima que o EI obtenha cerca de 200 milhões de dólares anuais
Fay é o tributo pago em dinheiro ou terras pelos não-crentes – e há relatos de valores diferentes impostos a cristãos e outras minorias. A Ghanima refere-se aos bens móveis retirados pela força aos não muçulmanos numa campanha militar, como escravos e armas. Um quinto (khums) deve ser destinado para o erário público, e os restantes 80% podem ser distribuídos entre os combatentes, explica a investigadora.
Mas todas estas taxas podem multiplicar-se, tornando-se verdadeiras extorsões: é preciso pagar uma taxa para usar os serviços de telecomunicações, para tirar dinheiro do banco, para comprar seja o que for. Os camiões e outros veículos que passem pelas estradas do Norte do Iraque têm de pagar 800 dólares de portagem, diz ainda a Reuters.
Dentro dos esquemas de extorsão cabem ainda os raptos para obter resgates. Os EUA e o Reino Unido recusam-se a pagar por cidadãos seus que tenham sido raptados, mas outros países terão pago alguns milhões de dólares ou euros – em 2014, o EI poderá ter recebido cerca de 45 milhões de dólares, estima um relatório do Congresso norte-americano. E mesmo cidadãos locais serão raptados frequentemente – embora nestes casos os resgates pedidos sejam muito menores, com valores que podem rondar os 500 dólares.
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A insatisfação com o sistema de taxas e extorsão do EI estará a crescer, pelo que se conclui dos relatos que chegam ao Ocidente. Talvez pela falta de perspectivas para a população sob o seu jugo, ou por causa da evolução do sistema de controlo do território posto em prática pelos jihadistas, explicado por Mara Revkin.
Quando o EI se apropria de um novo território, as suas prioridades são restaurar os serviços básicos, como a água e a electricidade. Em alguns locais, pôs a funcionar as panificações, para fornecer pão grátis ou a preços subsidiados. Os produtos que entram no território são adquiridos pelo EI e depois vendidos à população – com taxas, que se foram agravando. Começam depois uma campanha de repressão do crime vulgar – ladrões, traficantes, violadores, assassinos comuns.
Só então é que o EI começa a regular a moral pública e as práticas religiosas. Primeiro, as pessoas começam por ser encorajas a deixar de beber e fumar de forma educada. Se não o fazem a bem, começam a ser sujeitas a violência, e são introduzidos castigos corporais para quem for apanhado a vender ou a consumir cigarros ou álcool. O medievalismo do EI e a sociedade em dois andares – guerrilheiros e o resto da população – afirma-se com o avançar do tempo.
Tráfico de antiguidades
Esta será a segunda maior fonte de rendimentos do Estado Islâmico. Vários museus ficaram sob o seu controlo, e vários locais arqueológicos também. Algumas relíquias são destruídas para efeitos de propaganda, como está a acontecer na cidade de Palmira. Mas as peças facilmente transportáveis são traficadas para o estrangeiro, sobretudo para a Europa, onde há compradores para peças que, a não ser ilegalmente, nunca seriam transaccionadas.
Quem quiser escavar – ou roubar o que encontrar – nos sítios arqueológicos sírios paga uma taxa: 20% sobre o valor do que encontrar em Alepo, depois de efectuada a transacção com receptadores autorizados pelo EI, 50% em Raqqa. Um relatório do Congresso dos EUA estima em 100 milhões por ano os rendimentos do EI com a venda ilícita de objectos arqueológicos.
A questão é descobrir o percurso que estas peças fazem, depois de saírem da Síria ou do Iraque, através da Turquia ou de Beirute, e de terem sido branqueadas com documentação falsa sobre a sua origem. Começam a surgir algumas denúncias de que estarão a ser vendidos em leilões na Europa, ou em lojas sem escrúpulos em relação a peças vindas de regiões de conflito. Por exemplo, o especialista em Médio Oriente também do University College de Londres Mark Altaweel encontrou numa loja da capital britânica objectos que “muito provavelmente vêm do Iraque e da Síria”, contou ao Guardian.
Um fragmento de vidro rudimentar, uma estatueta minúscula, um baixo-relevo em osso – peças com características tão distintivas que só podem ter vindo de uma zona específica, na área controlada agora pelo Estado Islâmico, afirmou. “O facto de estarem à venda tão abertamente em Londres diz-nos a escala deste tráfico – estamos a ver apenas a ponta final”, comentou Altaweel.
sábado, 28 de novembro de 2015
Até que enfim!...
FERNANDO KA 28/11/2015
António Costa veio fazer justiça à minoria negra portuguesa.
Ora, nem sempre o aparecimento de uma andorinha configura o prenúncio da Primavera. Contudo, pode suscitar a expectativa de que os dias risonhos estarão para breve. Mas, a ver vamos. A nomeação de uma negra pela primeira vez para exercer um alto cargo no país que se orgulha de ser de brandos costumes e de primeiro a levar a civilização e a cruz de Cristo às terras africanas e, por outro lado, o último a abandoná-las por força das circunstâncias de luta pelas respectivas independências.
António Costa, ao contrário dos outros líderes políticos, eivados de preconceitos raciais, veio fazer justiça à minoria negra portuguesa, libertando-a do ostracismo a que tem sido votada. As figuras políticas deste país ainda não compreenderam que a posição de destaque dos negros luso-africanos constituem uma charneira no aprofundamento do relacionamento entre ambos os povos de aquém e além mar.
Portugal deveria ter seguido há muito mais tempo o exemplo dos ingleses e franceses na integração dos negros nacionais oriundos das suas ex-colónias em lugares de visibilidade pública. Por isso, há que louvar a coragem de António Costa, ao romper com a tradição segregadora, permitindo que um membro da comunidade negra fizesse parte do elenco governativo.
Portugal não pode continuar a fazer de conta que a integração está feita e nada mais há para fazer, ludibriando os incautos de que é o melhor país da integração no contexto europeu. A integração não pode ser confundida com a tolerância de encolher os ombros, sinal de deixa estar. É mais do que isso. Significa a participação na partilha comum e nas decisões sobre todos os assuntos de interesse colectivo. Neste caso, quem é parte integrante da sociedade não deveria ser excluído pela mera diferença da côr da sua pele.
Os cidadãos têm todos os mesmos direitos e deveres perante o seu país e deveriam ser avaliados pelas suas competências e dedicação à causa comum. Mas uma sociedade em que se manifestam preconceitos raciais faz, exactamente, o contrário, revelando a sua incapacidade de conhecer a verdadeira essência da natureza humana na sua múltipla diversidade. Um racista é um ignorante pobre de espírito.
Dirigente da Associação Guineense de Solidariedade Social
Acabou!!!! Acabou. Acabou?
JOSÉ PACHECO PEREIRA 28/11/2015
Experimentem dizer “acabou” junto de uma das inumeráveis vítimas destes anos de “ajustamento” e vão ver como é a resposta.
Experimentem dizer “acabou” junto de uma das inumeráveis vítimas destes anos de “ajustamento” e vão ver como é a resposta. Eu já experimentei várias formas e têm todas um ponto de exclamação no fim ou outro qualquer expletivo. Ou é um suspiro fundo de quem atravessou um trajecto complicado e, chegado a outro lado, respira longamente de alívio; ou é um alto e sonoro “acabou” como antes do 25 de Abril se chegava ao “às armas” da Portuguesa e de repente toda a gente gritava a plenos pulmões; ou é uma espécie de vingança saborosa em ver na mó de baixo aqueles que sempre entenderam que têm o direito natural de estar na mó de cima.
Ou há mesmo uma variante irónica, como se o “acabou” fosse semelhante ao do episódio dos Monty Python em que uma personagem num pub dizia para um eleitor circunspecto do PAF ao lado “you know what I mean?” e tocava-lhe nos braços numa cumplicidade admitida. Wink, wink. No episódio, depois queria vender-lhe fotografias pornográficas: “you know what I mean?” Aqui, era uma fotografia de Cavaco Silva a “indicar” António Costa, wink, wink. Até eu fico da escola do engraçadismo, imaginando alguns personagens que andaram a insultar a nossa inteligência, a mentir-nos descaradamente, e a atacar o bolso dos que não se podiam defender, culpando-os de “viverem acima das suas posses” e de serem “piegas”.
“You know what I mean?”. Piu-pius governamentais que vivem no Twitter; irrevogáveis de geometria variável; o “impulsionador jovem” que aos saltos no palco dizia à assistência “ó meu, isso da história não serve para nada”; os “justiceiros geracionais” que queriam tirar as reformas aos pais e avós para em nome de uns abstractos filhos e netos as darem a “outros” pais e avós, bem vivos e presentes, em nome da “estabilidade do sistema financeiro”; os neo-malthusianos que nos encheram de simplismos gráficos em que se escolhiam os parâmetros e se excluíam outros para concluir que “não há alternativa”; os arrojados ultra-liberais, que queimam o valor dessa bela palavra de liberdade, e que proclamam que nunca, jamais e em tempo algum quereriam “casar” com as “esganiçadas” do Bloco, sem sequer perceber o que lhes diz o espelho; as mil e um personagens ridículos cuja desenvoltura vinha de terem poder, estarem encostados ao poder e entenderem que tinham impunidade para pisar os outros porque eram mais fracos e tinham menos defesas. Vamos todos dançar a tarantela para expulsar o veneno.
Acabou!!! Sabem ao que me refiro? Sabem, sabem. Bem demais.
Acabou.
Acabou. Percebe-se no ar que chegou ao fim uma época, um momento da nossa vida colectiva e que existe um desejado ponto sem retorno. E, na verdade, para “aquilo” já não é possível voltar, pode ser para outra coisa pior ou para outra coisa diferente, mas para o mesmo já não há caminho.
O modo como “acabou” conta muito, porque é diferente dos modos tradicionais da vida política portuguesa. Se o governo PSD-PP tivesse acabado nas urnas por uma vitória do PS mesmo tangencial, o efeito de ruptura estaria muito longe de existir, mesmo que o governo PS não fizesse muito de diferente do que o actual governo minoritário vai fazer. Foi a ecologia da vida política portuguesa que mudou, com o fim da tese do “arco de governação” e, mais do que qualquer solução, que pode ser precária, não durar ou acabar mal, acabou a hegemonia de uma das várias construções que suportavam a ideologia autoritária que minava a democracia nestes dias, a do “não há alternativa”.
Acabaram os votos de primeira e os de segunda, com o escândalo de também os votos de um torneiro numa oficina de reparações, que faz todas as opções erradas e tribunícias, é sindicalizado nos metalúrgicos, vive na margem sul, e vota na CDU, também valer para que haja um governo de pacíficos funcionários públicos e professores que votam no PS, ex-membro do “arco da governação”. Não é por amor ao governo de Costa, nem ao PS, é outra coisa, é porque não queriam os “mesmos” e foi essa força que os fez acabar. Vem aí o PREC? Se a asneira pagasse multa podíamos enviar os asneirentos num pacote para pagar a dívida e ainda ficávamos com um superavit.
Pode até não mudar muito, porque já mudou muito.
Acabou?
Não. Há muita coisa que não acabou. Há um rastro de estragos, uns materiais e outros espirituais, que não vão ser fáceis ou sequer possíveis de superar numa geração. Sempre que um jornalista fizer a pergunta pavloviana de “quem paga?” ou “quanto custa?” só sobre salários, pensões e reformas, ou seja aquilo que interessa aos que tem menos e nunca faça a mesma pergunta em primeiro lugar, e muitas vezes único lugar, para tudo o resto, benefícios fiscais, impostos sobre os lucros, “resolução” de bancos, PPPs, swaps, etc. ainda não acabou. Sempre que alguém “explicar”, com um encolher irónico dos ombros e completa e absoluta indiferença, a ineficácia da fiscalidade sobre a riqueza, porque os capitais “deslocam-se” como água para outros sítios, para offshores, e podem sempre fugir, e por isso “não vale a pena” sequer admitir tentar taxá-los, ainda não acabou. Sempre que se considera como normal que quem manda em nós, eleitores, portugueses, Portugal, são uns burocratas de Bruxelas e uma elite de governos europeus, que nos governam por “instruções”, “directivas”, “regras”, interpretadas rigidamente para países como Portugal e com ampla folga para países como a França, ainda não acabou. Sempre que o dolo, a violação da confiança e dos contratos com os de “baixo” e a inviolabilidade com os de “cima”, continuar a ser a prática de um estado de má-fé, ainda não acabou. Sempre que se cultive, dissemine, impregne, envenene a vida pública com a indiferença com a pobreza, o desemprego, a quebra de qualidade de vida, a perda de dignidade quando se vê a casa penhorada , ou se perde o carro na frágil classe média que criamos depois do 25 de Abril, retirando da pobreza muitas famílias para lhes dar outros horizontes pelo trabalho e, aos seus filhos, pela educação, e se vê tudo isto como efeitos colaterais não se sabe de quê, embora se saiba para quem, ainda não acabou. Sempre que se despreza os que vivem com dificuldades do seu trabalho e se valorize a esperteza e o subir na vida, ainda não acabou. Sempre que se violam direitos sociais, protecções aos que menos força têm, reivindicações de gerações inteiras, ainda não acabou.
Sempre que se acha que isto é radicalismo e não decência, ainda não acabou.
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