sexta-feira, 27 de outubro de 2017

As seis teorias da conspiração sobre o assassinato de JFK

Lee Harvey Oswald

Alienígenas. Maçons. Mafiosos. Duplos. O Homem do Guarda-Chuva. Um trabalho interno.
Muito antes de existirem fake news, houve o assassinato do Presidente John F. Kennedy e a imensidão de teorias da conspiração que se lhe seguiram. Um autor estimou que os teóricos da conspiração acusaram “42 organizações, 82 assassinos e 214 outras pessoas de estarem envolvidas no assassinato”. Segundo um inquérito de 2013, 62% dos americanos acreditam que aconteceu algo mais do que apenas a acção de Lee Harvey Oswald, sozinho num sexto andar sobre a Dealey Plaza em Dallas.

Com o anúncio de Donald Trump de que pretende abrir ao público o lote final dos arquivos secretos sobre o assassinato, os historiadores e os teóricos da conspiração prepararam-se ansiosamente para analisar os registos.

Será que os documentos adicionarão combustível às teorias da conspiração que ardem há mais de meio século, ou irão pelo contrário privá-las de oxigénio de uma vez por todas

Salvo alguma decisão em contrário de última hora por parte da Casa Branca, vamos descobrir rapidamente. Enquanto isso não acontece, eis algumas das mais prevalentes teorias da conspiração sobre o assassinato de JFK:

Múltiplos atiradores

Aquela que é talvez a teoria da conspiração mais duradoura de todas tem as suas origens não num qualquer lunático, mas na Câmara dos Representantes.

Uma semana após o assassinato, ocorrido a 22 de Novembro de 1963, o recentemente empossado Presidente Lyndon B. Johnson criou por ordem executiva a Comissão Presidencial Sobre o Assassinato do Presidente Kennedy – que ficou para a História como a Comissão Warren, nome derivado do seu presidente, o juiz do Supremo Tribunal Earl Warren.

Dez meses depois, a Comissão apresentou as suas descobertas: Oswald agiu sozinho, e o mesmo aconteceu com Jack Ruby, o empresário nocturno de Dallas que alvejou e matou Oswald dois dias após o assassinato de JFK.

Em 1976 – depois do caso Watergate ter abalado a fé dos americanos no governo e a exibição do filme de Zapruder ter permitido ao público ver o assassinato com os seus próprios olhos – a Câmara votou esmagadoramente a favor da criação de um comité que voltasse a investigar a morte de Kennedy, bem como a de Martin Luther King, assassinado em 1968.

Tal como a Comissão Warren, a investigação da Câmara dos Representantes não encontrou provas que implicassem a União Soviética, Cuba ou a CIA no assassinato de Kennedy. Contudo, o comité concluiu que “provavelmente” teria ocorrido uma conspiração, envolvendo um segundo atirador que estaria no infame “monte relvado”.

Essa hipótese foi desde então desacreditada, inclusivamente por reconstituições high-tech. Mas o mal estava feito.

A “grande contradição”, como lhe chamou um investigador de JFK, abriu a porta ao desenvolvimento de outras teorias da conspiração.

O Homem do Guarda-chuva


A mais famosa teoria que envolve múltiplos atiradores centra-se no “Homem do Guarda-Chuva”: uma figura vista a segurar misteriosamente um guarda-chuva preto no soalheiro dia do assassinato de Kennedy. Houve quem tenha especulado que o Homem do Guarda-Chuva disparou um dardo venenoso em direcção ao pescoço do presidente, imobilizando-o para permitir que Oswald, ou outros, disparassem o tiro mortal.

O filme JFK, de 1991, realizado por Oliver Stone e que alimenta as teorias da conspiração, mostra o Homem do Guarda-Chuva a fazer sinais aos seus cúmplices.

A realidade, no entanto, revelou-se bastante mais banal. Em 1978, 15 anos após o assassinato, Louie Steven Witt declarou perante o comité da Câmara dos Representantes que levara o guarda-chuva para provocar o presidente, não para o matar.

“Em algum momento a prova 405 conteve uma pistola ou arma de qualquer tipo?”, perguntou-lhe Robert Genzman, membro do comité, enquanto a audiência comparava o guarda-chuva de Witt com os diagramas de mecanismos secretos que disparavam dardos, ou balas, que os teóricos da conspiração haviam apresentado.

“Este guarda-chuva?”, perguntou um atónito Witt.

“Sim.”

“Não.”

Witt afirmou nem sequer ter tido conhecimento das teorias da conspiração relacionadas com o seu guarda-chuva até vários anos depois do assassinato, e que o guarda-chuva não passava de uma “piada sem graça” dirigida ao pai de Kennedy que tinha corrido monumentalmente mal (o guarda-chuva preto era a imagem de marca de Neville Chamberlain , primeiro-ministro britânico que tivera uma postura branda relativamente ao regime nazi, e que fora apoiado por Joseph Kennedy)

Umbrella Man, documentário de 2011 de Errol Morris, explora a maneira como, sob atenção microscópica, as coisas mais inócuas podem parecer sinistras.

“Se o Livro de Recordes do Guiness tivesse uma categoria para pessoas que fazem a coisa errada no momento errado no sítio errado, eu estaria em primeiro lugar”, disse Witt ao comité, “e a longa distância do segundo classificado.”

Um trabalho interno


Outra crença persistente é que as autoridades americanas estiveram de alguma forma envolvidas. Uma das teorias afirma que o tiro fatal foi disparado pelo motorista do carro de Kennedy, ao tentar disparar contra Oswald.

“Se olharmos para uma cópia de má qualidade do filme de Zapruder, parece que William Greer, o condutor, se vira e por cima do ombro dá um tiro na cabeça de Kennedy”, disse ao The Daily Beast John McAdams, autor de JFK Assassination Logic: How to Think about Claims of Conspiracy.

“Mas a verdade é que as suas mãos estão o tempo todo no volante; só nas cópias muito más do filme de Zapruder é que parece que não é assim.”

Uma teoria da conspiração mais generalizada é que a CIA – e até Lyndon B. Johnson – estiveram abominavelmente envolvidos.

Embora especialistas a tenham descartado como “ridícula” e “forçada”, essa teoria assumiu um papel central no filme de Oliver Stone. E foi também defendida por outro Stone: Roger Stone, o consultor político e confidente de Trump que persuadiu o presidente a abrir o acesso aos documentos sobre o caso.

“Percebo que mergulhar no mundo da pesquisa sobre o assassinato e da hipótese de uma conspiração possa levar a que olhem para mim como um extremista ou um lunático, mas os factos que eu descobri são tão convincentes que não me resta alternativa senão afirmar que Lyndon Baines Johnson foi o responsável pela morte de John Fitzgerald Kennedy, de modo se tornar presidente e a evitar o precipício político e legal em que estava prestes a cair”, escreveu Stone em The Man Who Killed Kennedy: The Case Against LBJ, publicado em 2013 e da co-autoria de Mike Colapietro.

(O livro, que acusa Johnson de cumplicidade em pelo menos seis outros assassinatos, cita também Richard Nixon, antigo chefe de Stone, que terá afirmado: “Eu e Lyndon queríamos chegar a Presidente, a diferença é que eu não seria capaz de matar por isso.”)

Sean Cunningham, professor de História da Universidade Texas Tech, diz que não há provas que sustentem essa teoria.

“Johnson dá uma boa história e serve de explicação fácil”, afirmou ao The Daily Beast.

Cubanos e soviéticos

De todas as teorias de conspiração em torno do assassinato de Kennedy, esta é a mais provável de ser impulsionada ou desmentida pelos documentos que serão brevemente divulgados.

Como relatado por Ian Shapira, do The Washington Post, os especialistas acreditam que muitos dos 3 100 documentos anteriormente inéditos se relacionam com a viagem de seis dias que Oswald fez à Cidade do México, dois meses antes do assassinato. Alguns crêem que Oswald recebeu ordens de agentes soviéticos ou cubanos enquanto lá esteve.

Oswald tinha emigrado para a União Soviética em 1959, onde ficou dois anos e meio antes de retornar aos Estados Unidos, quando a sua dissidência já não era notícia. Em Setembro de 1963 viajou para a capital mexicana, tendo visitado as embaixadas cubana e soviética, aparentemente numa tentativa de se mudar para um dos países comunistas.

“Um oficial soviético que Oswald alegadamente contactou, Valeriy Kostikov, não era um simples oficial do KGB, pertencia também ao Departamento 13 do KGB, que o relatório da CIA descreve como ‘o departamento encarregado da sabotagem e dos assassinatos’, escreveu o Post em 1993, altura em que foi revelado um outro lote de documentos secretos.

Os historiadores estão assim muito interessados em saber o que o último lote de ficheiros irá revelar sobre os movimentos e encontros de Oswald na Cidade do México.

“Sempre considerei a viagem ao México o capítulo oculto da história do assassinato. Muitas versões saltam esse período”, disse a Shapira Philip Shenon, ex-repórter do New York Times e autor de um livro sobre a Comissão Warren. “Oswald andava a encontrar-se com espiões soviéticos e cubanos, e a CIA e o FBI tinham-no sob vigilância apertada. Não dispunham o FBI e a CIA de provas cabais de que ele era uma ameaça antes do assassinato? Se tivessem agido com base nessas provas, talvez não tivesse acontecido o que aconteceu. Essas agências podem estar com medo de que, se os documentos forem revelados, a sua incompetência e os seus erros sejam expostos. Eles sabiam o perigo que Oswald era, mas não alertaram Washington.”

Segundo algumas teorias, as agências secretas americanas sabiam do plano de Oswald, e deixaram que este se concretizasse porque queriam Kennedy fora de cena.

A CIA e o FBI investigaram o suposto envolvimento cubano e soviético, mas não encontraram nada. E tanto a Comissão Warren como o comité da Câmara dos Representantes descartaram esse possível envolvimento. Os próprios especialistas torcem o nariz a esta hipótese, apontando para o facto de que ambos os países consideravam ser mais fácil trabalhar com Kennedy do que com o seu vice-presidente.

Uma outra teoria da conspiração defende que, quando Oswald se mudou para a União Soviética, o KGB treinou um duplo que assumiu a sua identidade e matou Kennedy. O homem por trás dessa hipótese chegou a conseguir convencer a viúva de Oswald a dar-lhe autorização para exumar os restos mortais, o que veio a acontecer a 4 de Outubro de 1981. A equipa que analisou o corpo concluiu, “para além de qualquer dúvida”, que era efectivamente Lee Harvey Oswald quem estava enterrado no cemitério Rose Hill, em Fort Worth.

A máfia

Nos dias que se seguiram ao assassinato do seu irmão, Robert Kennedy teve a sensação horrível de que o acontecido era culpa sua.

De acordo com o biógrafo Evan Thomas, “Robert Kennedy estava convencido de que, de alguma forma, era responsável pela morte do irmão. Que as suas tentativas de levar a máfia a tribunal e de matar Fidel Castro eram a causa, que tudo lhe tinha explodido nas mãos, como costuma dizer o pessoal das secretas.”

Não há, no entanto, quaisquer provas do envolvimento do crime organizado no assassinato do Presidente e, mais uma vez, os especialistas rejeitam essa possibilidade.

Ralph Salerno, ex-detective da polícia de Nova Iorque que investigou o envolvimento da máfia no âmbito da averiguação do comité da Câmara dos Representantes, disse ter analisado “milhares de páginas de vigilância electrónica sobre líderes do crime organizado, por todo o território dos Estados Unidos" relativas à altura do assassinato, sem ter ouvido nada que considerasse suspeito.

O pai de Ted Cruz


Se há alguém que gosta de uma boa teoria da conspiração, esse alguém é Donald Trump. E o então candidato não se coibiu de, no ano passado, dar à Fox News a sua visão sobre o que se passou.

Trump, que estava nesse momento a discutir com o senador do Texas Ted Cruz a nomeação presidencial do Partido Republicano, alegou que o pai do seu oponente, Rafael Cruz, tinha sido visto com Oswald pouco antes do assassinato.

“O pai dele esteve com Lee Harvey Oswald pouco antes de ele ter sido morto”, disse Trump numa entrevista por telefone. “Toda a situação é ridícula! O que é isto? Não tenho razão? Antes de ele ter sido morto. E ninguém fala nisso. Toda a gente sabe, e ninguém fala disso!”

Aparentemente, Trump estaria a referir-se a um artigo de Abril de 2016 da National Enquirer, que tinha como título Pai de Ted Cruz Ligado ao Assassinato de JFK! O artigo estava acompanhado por uma fotografia que, segundo o tablóide, mostrava Oswald e Rafael Cruz a distribuírem panfletos pró-Castro em Nova Orleães em 1963.

Mesmo depois de garantir a nomeação, Trump manteve a amplamente desacreditada história.

“Tudo o que fiz foi ressalvar o facto de que, na capa da National Enquirer, há uma fotografia dele [Rafael Cruz] e do maluco do Lee Harvey Oswald a tomarem o pequeno-almoço”, afirmou Trump. “Não tive nada a ver com isso. Estamos a falar de uma revista que, francamente, devia ser muito mais respeitada. Apanharam o O.J. Apanharam o [John] Edwards. Apanharam isto. Quer dizer, se fosse o New York Times, teria ganho o prémio Pulitzer.”

Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post

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